Espanha

E agora? Guia para as eleições de novembro, as quartas em quatro anos

Pedro Sánchez distribuiu críticas à direita e à esquerda, pedindo aos espanhóis que a 10 de novembro lhe concedam uma “maioria mais contundente” <span class="creditofoto">Foto Getty Images</span>

Pedro Sánchez distribuiu críticas à direita e à esquerda, pedindo aos espanhóis que a 10 de novembro lhe concedam uma “maioria mais contundente” Foto Getty Images

O calendário do novo ciclo eleitoral arranca na próxima segunda-feira, quando se esgota o prazo constitucional de dois meses após a primeira votação de investidura, que fracassou. Com as eleições a 10 de novembro, a formação de um Governo acontecerá, na melhor das hipóteses, nas vésperas ou em pleno período natalício

Texto Hélder Gomes

A incapacidade dos partidos espanhóis para alcançarem um acordo que permitisse a investidura e a formação de um Governo coloca os eleitores perante novas eleições, as quartas em quatro anos, agendadas para 10 de novembro. O calendário arranca na próxima segunda-feira, 23 de setembro, quando se esgota o prazo constitucional de dois meses após a primeira votação de investidura, em julho, que fracassou.

No início da próxima semana, o rei Filipe VI assinará o decreto de dissolução do Parlamento e convocará novo ato eleitoral com a validação da presidente do Congresso dos Deputados, Meritxell Batet. O decreto será publicado no dia seguinte, terça-feira. Só então arranca a corrida oficial, ainda que os partidos estejam em campanha contínua há meses, antecipando o iminente regresso às urnas.

Mesmo com as consultas do rei aos líderes partidários em curso, o PSOE estudava todos os cenários possíveis para que o primeiro-ministro espanhol em funções e secretário-geral dos socialistas, Pedro Sánchez, pudesse finalmente tomar posse após as muito prováveis eleições. Um dos cenários que os dirigentes socialistas antecipavam passava por uma maioria suficiente para a tomada de posse e para garantir uma legislatura estável, fundamentalmente com o Unidas Podemos e o Partido Nacionalista Basco (PNV) e já sem terem de depender da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC).

Os republicanos catalães continuavam dispostos a facilitar a investidura de Sánchez, abstendo-se. Contudo, os socialistas não esquecem que foi a ERC, juntamente com o PP, o Ciudadanos e o Juntos pela Catalunha, que acabou por fazer cair o projeto de Orçamento e precipitar as eleições de 28 de abril. O PSOE foi então o partido mais votado mas, tendo conseguido menos de 30% dos votos, precisa do apoio de outras formações políticas, sendo essencial o apoio do Podemos. As sondagens indicam que, em caso de repetição de eleições (como acontecerá), os socialistas aumentariam a percentagem de votos mas continuariam a precisar do apoio de outros partidos para formar Governo.

Se antes do verão o Palácio da Moncloa, sede do Governo espanhol, confiava que os socialistas passariam dos atuais 123 deputados para 140 ou mais, atualmente as perspetivas não são tão favoráveis. Isto é, o PSOE alargará a sua vantagem mas não tanto quanto haviam suposto. Por outro lado, a soma dos deputados do PP, Ciudadanos e Vox não constituirá uma maioria alternativa de direita, acredita a Moncloa.

PODEMOS INSISTE EM GOVERNO DE COLIGAÇÃO, PSOE DIZ QUE É “INVIÁVEL”

O PSOE defende um compromisso “à portuguesa”, ou seja, um acordo parlamentar com o Podemos num Governo exclusivamente socialista. Já o partido de Pablo Iglesias insiste que só assina um acordo de coligação em que dirigentes do Podemos ocupem cargos ministeriais. Na semana passada, Iglesias advertiu o líder socialista que, após as eleições de novembro, o partido continuaria a exigir um Governo de coligação. Sánchez respondeu: “Em novembro, veremos o que há para fazer.” Mas tanto o Executivo como o PSOE garantem que uma coligação entre os dois partidos continuará a ser “inviável” mesmo após a repetição das eleições.

Na próxima terça-feira, os partidos começam a elaborar as suas listas eleitorais, que não deverão divergir muito das apresentadas para as eleições de abril. A 15 de outubro as listas definitivas serão publicadas no Diário Oficial do Estado. Só a 1 de novembro é que terá início a campanha oficial para as eleições que, como se trata de uma repetição, só durará oito dias em vez das tradicionais duas semanas. 4 de novembro é o último dia em que os meios de comunicação social podem publicar sondagens, 9 de novembro cumpre-se o habitual dia de reflexão e, no dia seguinte, os espanhóis votam.

Na melhor das hipóteses, a formação de um Governo acontecerá nas vésperas ou em pleno período natalício e, nesse caso, a aprovação do novo Orçamento do Estado não seria possível antes da primavera.

O “dogmatismo” de Iglesias, a “falta de sentido de Estado” de Casado e a “irresponsabilidade” de Rivera

Esta quarta-feira, Sánchez distribuiu críticas à direita e à esquerda, pedindo aos espanhóis que a 10 de novembro lhe concedam uma “maioria mais contundente” para que o PP, o Ciudadanos e o Podemos “não tenham a capacidade de bloquear a formação do Governo”. O primeiro-ministro aponta o dedo ao “dogmatismo” de Pablo Iglesias, à “falta de sentido de Estado” de Pablo Casado (presidente do PP) e à “irresponsabilidade” de Albert Rivera (presidente do Ciudadanos). Para Sánchez, nenhum deles assumiu o resultado das eleições de abril nem das eleições europeias, autonómicas e municipais do mês seguinte. Espanha precisa de “estabilidade” e “moderação” e não de bloqueio, rematou, citado pelo jornal “El Mundo”.

Na segunda-feira, no primeiro dos dois dias das consultas do monarca com os líderes partidários, vislumbrou-se a possibilidade de uma investidura bem-sucedida com uma putativa abstenção do PP e do Ciudadanos. No entanto, o encontro entre Casado e Rivera terminou sem um compromisso explícito dos populares. “A bola continua no campo de Sánchez. O PP mantém a sua posição, marcada pela coerência, firmeza e sentido de Estado”, disseram então fontes do partido.

As três condições do Ciudadanos que não deram em nada

Foi Rivera quem propôs oferecer a Sánchez um pacto em troca da abstenção dos dois partidos de centro-direita, o que viabilizaria a tomada de posse do socialista. O presidente do Ciudadanos impôs três condições. Em primeiro lugar, o PSOE teria de romper o seu pacto com a EH Bildu (coligação política da esquerda independentista) em Navarra e fazer um acordo de coligação com a Navarra Suma (centro-direita), deixando de fora os nacionalistas.

Em segundo lugar, Sánchez teria de iniciar negociações entre o PSOE, o PP e o Ciudadanos para voltar a debater a aplicação do artigo 155 da Constituição na Catalunha se o Governo de Quim Torra desconsiderar a sentença no processo dos independentistas catalães. Ainda no âmbito da segunda condição apresentada, Rivera também propunha exigir que Sánchez se comprometesse a não indultar os dirigentes independentistas se estes forem condenados. E, por fim, o primeiro-ministro em funções teria de se comprometer a não aumentar os impostos.

Ainda antes da reunião entre os líderes do PP e do Ciudadanos, uma fonte do Governo socialista considerou não haver “razões objetivas” para que os partidos não se abstenham, uma vez que as três condições já estariam cumpridas. “Não há qualquer obstáculo. Para que o Governo não dependa de forças independentistas, o PP e o Ciudadanos têm de se abster – uma abstenção técnica. A única coisa que peço não é que nos apoiem mas que facilitem a formação de um Governo”, diria posteriormente Sánchez. Mas sem sucesso.