Um fundo abutre pousa no ninho da EDP
Paul Elliot Singer, o mago dos fundos de alto risco, famoso por ter dobrado países como o Peru e a Argentina nas disputas de reestruturações de dívida, entrou na EDP, tornando ainda mais imprevisível o desfecho da OPA lançada pelos chineses
Texto Jorge Nascimento Rodrigues e Miguel Prado
A EDP informou na terça-feira a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários que Paul Elliot Singer comunicou que detém uma participação qualificada de quase 2,3% na elétrica portuguesa, cujas ações se valorizaram perto de 4% esta semana. Aos valores de mercado, a participação dos fundos de Singer na EDP está avaliada em €260 milhões e a sua entrada pode criar alguma turbulência, tornando ainda mais imprevisível o desfecho da oferta pública de aquisição (OPA) que a China Three Gorges (CTG) lançou em maio sobre a EDP.
Paul Elliot Singer é um dos multimilionários norte-americanos mais conhecido nos mercados financeiros pelas suas operações através do seu fundo de alto risco Elliot Management, fundado em Nova Iorque em 1977 e que se tornou famoso por comprar dívida de países em bancarrota, recusando as reestruturações de dívida e exigindo nos tribunais a amortização por inteiro dos títulos. A sua reputação nestas operações granjeou ao fundo que lidera o epíteto “fundo abutre”. Ficou nos anais por operações sobre o Peru, o Congo e a Argentina.
Em 1996 comprou dívida peruana por 11,4 milhões de dólares e o tribunal obrigou o governo de Lima a pagar-lhe 58 milhões. Na mesma década aplicou a mesma estratégia em relação à dívida congolesa e acabou por chegar a um acordo em relação a títulos que teria adquirido por 20 milhões de dólares e de que se desfez por um montante mantido secreto através de um acordo com o país.
Mas a operação que granjearia mais fama foi a que envolveu a Argentina já no século XXI. Singer detinha títulos da dívida daquele país, que entrou em bancarrota em 2002, e recusou as reestruturações levadas a cabo, acabando por ganhar nos tribunais norte-americanos, depois de um processo que se arrastou 14 anos. Em fevereiro de 2016, Singer chegou a acordo com o novo governo do presidente Maurico Macri, conseguindo, segundo então disse, um acordo ainda mais vantajoso do que os 72,5% aceites pelos outros investidores que haviam rejeitado as reestruturações.
Entrada do fundo Elliot, segundo fontes ouvidas pelo Expresso, aumenta a pressão sobre a administração da EDP para criar valor nas operações do grupo
A intervenção de Singer em Portugal surge no quadro de uma OPA que foi vista, no momento do seu anúncio, como uma forma de a CTG, que é já o maior acionista da EDP (com 23,27%), assumir maior poder na elétrica portuguesa, clarificando o seu futuro acionista, há vários anos pautado por uma dispersão do capital entre diversos investidores de referência (oriundos de Espanha, dos Estados Unidos da América, de Abu Dhabi, da Argélia, do Qatar, entre outros mercados). A OPA foi lançada depois de vários meses de especulação sobre a hipótese de a EDP vir a ser engolida por grupos europeus como a francesa Engie ou a italiana Enel, no âmbito da vaga de consolidação do sector.
Depois de a administração presidida por António Mexia ter considerado a oferta da CTG baixa, apontando uma série de incertezas na proposta chinesa, a CTG tem vindo a trabalhar nos vários mercados onde a EDP opera para obter as necessárias autorizações dos reguladores. Sem elas não avançará com o registo formal da OPA.
A entrada do fundo Elliot, segundo fontes ouvidas pelo Expresso, aumenta a pressão sobre a administração da EDP para criar valor nas operações do grupo, que se tem confrontado com uma redução das suas receitas reguladas em Portugal, estando a apostar sobretudo na captação de novos negócios internacionais em mercados como os Estados Unidos da América e o Brasil, entre outros.