Investigação

Seis perguntas para entender melhor o que está em causa no negócio das golas

As 70 mil golas (e respetivo kit de autoproteção) da polémica foram adquiridas por cerca de 125 mil euros à Foxtrot Aventura, empresa “com fins de turismo de natureza”, propriedade do marido da socialista presidente da junta de freguesia de Longos <span class="creditofoto">Foto Ana Baião</span>

As 70 mil golas (e respetivo kit de autoproteção) da polémica foram adquiridas por cerca de 125 mil euros à Foxtrot Aventura, empresa “com fins de turismo de natureza”, propriedade do marido da socialista presidente da junta de freguesia de Longos Foto Ana Baião

Da polémica em torno do material usado para o fabrico das golas antifumo distribuídas ao abrigo do programa “Aldeia Segura”, o caso passou a investigação criminal. Processo tem (para já) dois arguidos constituídos e várias perguntas ainda sem resposta

Texto Mafalda Ganhão

De que golas se fala?

Estão em causa as 70 mil golas antifumo distribuídas pela Proteção Civil, no âmbito dos programas Aldeia Segura Pessoas Seguras, criado após os grandes incêndios rurais de 2018 como medida para a salvaguarda da proteção das populações.

Quando começou a polémica?

Em julho, depois de ser questionado o material usado no fabrico das golas, por ser inflamável e sem tratamento anticarbonização, algo que o próprio secretário de Estado da Proteção Civil confirmou.

A primeira reação do Governo foi desvalorizar a notícia, que considerou “alarmista” e “irresponsável”, mas a dúvida – nomeadamente envolvendo a compra das golas e dos chamados “kits de autoproteção” – levou posteriormente o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, a pedir esclarecimentos à Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), anunciando a abertura de um inquérito urgente sobre o caso.

O ministro ordenou também que as golas fossem testadas, o que o Laboratório de Estudos sobre Incêndios Florestais cumpriu (analisou 28), concluindo que estas não entraram em combustão com chamas, mas “a 20 cm ficaram perfuradas”.

O Ministério Público acabaria por abrir um inquérito ao negócio, por suspeita de fraude na obtenção de subsídios da UE, de participação económica em negócio e corrupção.

Afinal, quem ordenou a compra das golas?

O dedo acabou apontado à ANEPC, responsável pela encomenda

Como foram adquiridas?

A Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil disse ter recorrido a dois procedimentos de consulta prévia (apesar de, por lei, a compra dos kits dever ter sido decidida através de concurso público). O organismo afirmou ainda ter consultado as empresas Foxtrot Aventura, Brain One, Codelpor, MOSC – Confeções e EDSTATES – Confecções e Bordados”.

Que empresa as forneceu e quanto custaram?

Adquiridas por cerca de 125 mil euros (um valor acima do mercado), foram fornecidas pela Foxtrot Aventura, empresa “com fins de turismo de natureza” e “exploração de parque de campismo e caravanismo”. Pelos kits de autoproteção foram pagos 165 mil euros.

Fundada a 18 de dezembro de 2017 – menos de dois meses após a criação do programa “Aldeia Segura” – a empresa é propriedade de Ricardo Peixoto Fernandes, marido da socialista presidente da junta de freguesia de Longos (Guimarães), Isilda da Silva.

Na sequência desta revelação demitiu-se o adjunto do secretário de Estado da Proteção Civil. Francisco Ferreira, que trabalhava como padeiro numa pastelaria de Vila Nova de Gaia até ter sido, em 2017, nomeado como técnico especialista para o Governo, foi quem recomendou as empresas para a compra dos elementos do kit de proteção.

Que suspeitas levanta o negócio?

Em causa estão suspeitas de fraude na obtenção de subsídios da União Europeia, de participação económica em negócio e corrupção, confirmou em comunicado a Procuradoria-Geral da República.

Após a realização de conjunto de buscas, esta quarta-feira foram constituídos arguidos o general Mourato Nunes, presidente da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, que mantém a sua inocência, e Artur Neves, secretário de Estado da Proteção Civil, que entretanto se demitiu.

Ao Expresso, a Inspeção-Geral da Administração Interna revelou que está prestes a concluir a investigação.