SISTEMA FINANCEIRO

Bancos tremem se Bruxelas condenar ajudas de Estado

Problemas? Governo aprovou a utilização contabilística de impostos diferidos na banca no ano passado. Agora, a Comissão Europeia duvida da legalidade da decisão FOTO ALBERTO FRIAS

Problemas? Governo aprovou a utilização contabilística de impostos diferidos na banca no ano passado. Agora, a Comissão Europeia duvida da legalidade da decisão FOTO ALBERTO FRIAS

Impostos diferidos, já ouviu falar? Aqui explicamos o que é. Mas a notícia é outra: se Bruxelas considerar ilegal o uso que lhes foi dado, os bancos portugueses terão de fazer aumentos de capital de centenas de milhões de euros. Apenas um susto ou uma bomba ao retardador?

TEXTO ISABEL VICENTE e PEDRO SANTOS GUERREIRO

Se a utilização que foi dada em Portugal aos impostos diferidos for considerada ilegal pela Comissão Europeia, os bancos terão de realizar aumentos de capital que ascendem a centenas de milhões de euros. A hipótese é considerada por várias fontes do sistema como muito remota. Mas Bruxelas está a investigar.

A notícia fez a manchete da edição de hoje do “Financial Times”: a União Europeia pode vir a abrir um processo de investigação à banca em Portugal, na Grécia, em Espanha e em Itália para averiguar se está a haver ajudas ilegais de Estado. Em causa está a autorização de uso de impostos diferidos como créditos fiscais sobre o Estado, com impacto no capital dos bancos. A investigação está relacionada com a possibilidade de as Finanças de os vários países terem autorizado os bancos a contabilizar os impostos diferidos para efeitos de capital neste quatro países do sul da Europa, ativos que não são considerados de qualidade elevada pelo Banco Central Europeu (BCE).

Impostos foram um alívio para a banca

Em Portugal, a conversão de impostos diferidos na banca em créditos fiscais foi aprovada em Conselho de Ministros em junho de 2014. Esta medida foi então muito bem recebida pelos bancos portugueses, que assim puderam reduzir as suas necessidades de capital relativamente aos rácios de capital “core tier I”.

Na prática, os impostos diferidos permitiram aumentar os rácios de capital, diminuindo, pois, a necessidade de serem os acionistas a injetar capital. Recorde-se que desde há vários anos que os bancos encontram dificuldades em levantar capital no mercado, sendo que alguns estão ainda a pagar os empréstimos concedidos pelo Estado, no âmbito da recapitalização da banca, como é o caso do BCP e do Banif. O BPI já teve capital emprestado pelo Estado mas já pagou tudo.

A 30 de junho de 2014, o BCP era o banco mais “ajudado” por impostos diferidos, que acumulavam então 2,4 mil milhões de euros, dos quais cerca de 500 milhões já foram abatidos ao capital, pelo que o valor em causa é de 1,9 mil milhões de euros. Na mesma data, o BPI somava 445,6 milhões de euros em impostos diferidos. E o Banif contabilizava 266,2 milhões de euros.

Já no final de 2014, o banco com maior valor de impostos diferidos era o Novo Banco: 2,8 mil milhões de euros. Já a Caixa Geral de Depósitos somava 1,425 mil milhões. Dos bancos grandes, apenas o Santander não aderiu ao regime especial que permitiu melhorar rácios de capital à custa dos impostos diferidos.

O que são os impostos diferidos?

Os ativos por impostos diferidos representam uma poupança em matéria de tributação no futuro. Ou seja, os ativos por impostos diferidos funcionam como créditos que os bancos têm sobre o Estado por conta de prejuízos reportados em anos anteriores. Para que estes sejam reconhecidos como tal, a Autoridade Tributária ou as Finanças têm de os reconhecer formalmente.

Face ao documento aprovado por Portugal e Espanha são considerados impostos diferidos, os gastos e variações patrimoniais negativas com perdas por imparidade em créditos de cobrança e perdas e imparidades constituídas por ordem do Banco de Portugal entre outras.

É neste sentido que a autoridade de concorrência europeia questiona, agora, se o regime especial - aprovado por Portugal e Espanha, assim como pela Grécia e Itália - que prevê a contabilização de créditos fiscais, é ou não uma ajuda de Estado.

Esta discussão tem por base as novas regras de apuramento dos rácios core tier I, de Basileia III, desde 1 de janeiro de 2014 obrigavam os bancos a reduzir aos seus fundos próprios os créditos que dependessem de lucros futuros, ou seja ativos por impostos diferidos. Daqui decorria que o imposto diferido era contabilizado nas contas de capital dos bancos. Com o regime aprovado, e a aprovação das Finanças, passou a poder ser classificado como core capital, para efeitos de capital, reduzindo desta forma as necessidades de capitalização dos bancos.