ENTREVISTA

ANTONOALDO NEVES Presidente-executivo da TAP dá a sua primeira entrevista. Assume erros na pontualidade e anuncia crescimento

“Vamos duplicar o tamanho da TAP”

Textos Pedro Lima e Pedro Santos Guerreiro Fotos Ana Brígida

É presidente executivo da TAP desde fevereiro, mas está na companhia desde a privatização. Antonoaldo Neves, 42 anos, anuncia como pretende duplicar a dimensão da companhia. Um crescimento sob o signo do quinze: 15 novas rotas (se se incluir a passagem do voo de Newark para diário), 15% de crescimento de faturação este ano, 15 aviões no próximo ano. E milhares de contratações de trabalhadores.

Que missão lhe deram para a TAP?

Para nós, que passámos pelo processo de privatização desde 2014, a TAP era uma oportunidade única de aproveitar uma plataforma de conectividade muito bem localizada na Europa para fortalecer as ligações para o Atlântico. A TAP tinha cerca de 70 aviões e acreditávamos que, com 80, e com a reorganização da rede e melhores práticas de gestão, iríamos transformar a operação, fazer o turnaround [passar de prejuízos a lucros] e criar valor para o acionista, para os trabalhadores e para Portugal. Mas fomos sempre sendo surpreendidos positivamente por diversos aspetos. O potencial da TAP é muito maior do que imaginávamos.

Quão maior?

Estamos a falar de poder chegar a 130 aviões até 2025. Isso é dobrar o tamanho da empresa em dez anos. Em aviação isso é crescimento de mercado emergente, com o potencial de se estar na Europa e num país como Portugal, numa economia madura. Nos dois últimos anos a missão mudou completamente, antes era ter 80 aviões, hoje é preparar a empresa para crescer e muito. O maior desafio é preparar a TAP para entregar de forma excelente um volume de crescimento brutal.

Qual é o lugar estratégico que quer para a TAP?

A TAP tem de continuar a ser uma empresa dominante no Atlântico Sul e passar a ser uma empresa relevante no Atlântico Norte, e que continue a potenciar o desenvolvimento da economia portuguesa através desta plataforma para conectar clientes das Américas para a Europa. Precisamos de uma empresa que tenha padrões globais de eficiência e excelência no serviço.

O que foi já feito nessa estratégia?

Cumprimos todos os objetivos do plano estratégico, temos mais 1700 colaboradores em Portugal do que antes da privatização, mantivemos o hub e aumentámos a representação da TAP em Lisboa, que estava a cair para menos de 35% e passou para 54% no que diz respeito à Europa. Isso só foi possível porque aumentámos a capacidade, colocámos mais assentos nos aviões, trouxemos mais aeronaves, redesenhámos toda a rede. Demos um passo atrás no que diz respeito ao Porto para darmos dois passos em frente. Isso foi muito importante para termos os 54% em Lisboa e termos força agora para competir no Porto, a competição no Porto é muito dura, é diferente [ver página seguinte]. E passámos os dois últimos anos a equacionar alguns problemas enormes, nomeadamente a TAP Manutenção Brasil.

Diz que a TAP contratou 1700 trabalhadores desde a privatização. Quais as previsões para contratações atendendo ao crescimento previsto?

Grosso modo, temos neste momento 1000 pilotos e 3000 comissários. Até 2025 devemos passar para 1800 pilotos e 5500 comissários. Hoje a TAP tem aproximadamente 90 aviões, no final do próximo ano vai ter 105. Será a primeira vez na história da TAP que se adicionam 15 aviões num ano só. Vou precisar de muitas contratações, os 300 pilotos que estou a contratar este ano são para atender aos aviões que vão chegar no ano que vem. Anunciámos a contratação de 700 comandantes mas acabarão por ser à volta de 950 nos próximos meses. Há um pico de contratação este ano e no próximo, depois em 2020 diminui um pouco e em 2021 e 2022 volta a ser grande.

Duplicar o tamanho de uma empresa não é só comprar aviões e contratar pessoas, é organizar a empresa para não ter falhas operacionais, mudar procedimentos, gestão, formação...

Nos últimos 60 dias fizemos um planeamento de longo prazo para a necessidade de tripulação. Todo o nosso processo de planeamento das escalas dos pilotos está agora a ser feito automaticamente, até ao mês passado a TAP planeava à mão os 400 voos por dia, ou 12 mil voos por mês, combinados com 1000 pilotos. É uma coisa sobre-humana, admiro muito os trabalhadores da TAP. Milhões de combinações eram feitas manualmente na TAP.

Temos 1000 pilotos e 3000 comissários. Até 2025 devemos passar para 1800 pilotos e 5500 comissários e de 90 para 130 aviões

Era feito à mão?!

Sim. Uma pessoa pegava numa folha enorme de papel e ia escrevendo, era uma coisa da década de 50. Este trabalho levava 18 dias... Em vez de 18 dias demora agora uma hora.

Reconhece erros na formação de pilotos que levaram a cancelamentos [ver página seguinte]. Com este crescimento, não vai dar um passo maior do que a perna?

Não vou dar um passo maior do que a perna, mas em alguns momentos vou estar um pouco desajustado. Isso é natural, o processo não é perfeito. Já passei por muitos processos de crescimento acelerado e para mim é claro quais são os processos-chave. É preciso uma máquina de formação de pilotos — acabámos de comprar um novo simulador — e melhorar processos relacionados com a pontualidade. Vou todos os dias às 8h30 ao centro de controlo de operações e...

O seu perfil é financeiro, o que sabe de operações?

Tenho experiência, levei a Azul a ser a empresa mais pontual [no Brasil]. É um processo educacional, colocar a estrutura a funcionar num nível que a TAP não tinha, pois tinha 200 voos por dia num aeroporto que não tinha limitações de infraestrutura. Precisamos de melhorar a nossa máquina de pontualidade e assegurar que as decisões são tomadas por quem está na operação. A cultura da empresa sempre foi a de pedir “digam o que tenho de fazer que eu faço”. Isso leva a que as pessoas não tenham responsabilidade nas decisões. Estamos a inverter esse processo. Há uma agenda de transformação cultural enorme no sentido de dar responsabilização às pessoas.

A TAP quer concorrer com quem?

A TAP é uma empresa de longo curso. Fazemos médio curso porque precisamos de alimentar o longo curso. Competimos com empresas de primeira linha, como a Lufthansa, KLM, grupo IAG... Não competimos com a Ryanair ou com a easyJet.

Não?

Não, porque eles têm menos de 20% de quota de mercado em Lisboa, somados. Só fazem ponto a ponto.

Mas a TAP criou uma espécie de segmento low cost em cada voo...

Sim, é obvio que nesses 20% eu compito e por isso precisava de um produto para competir. A minha competição com a Ryanair e a easyJet é em 20% das minhas vendas, não é em 80%.

A TAP vai ter mais aviões e mais trabalhadores. E novas rotas?

Vamos ter no próximo ano três novas rotas a partir do Porto e onze a partir de Lisboa, além de passarmos o voo Porto/Newark [Nova Iorque] para diário. Diria que é o equivalente a 15 novas rotas.

As ligações a África são para manter?

Sim. A visão macro é a seguinte: hoje Portugal representa 20% da TAP, Brasil 25%, Estados Unidos 12%. Os Estados Unidos vão passar a ser 20%. Entre Brasil, EUA e Portugal tenho de ter 65% a 70% das receitas. África atinge os 4% a 5%, menos do que a França. Não tem que ser diferente.

E a Ásia?

A Ásia não está nas prioridades da TAP para os próximos cinco anos.

Quem é o novo homem-forte da TAP

Este engenheiro brasileiro — formado na Universidade de São Paulo — começou a sua carreira na área das obras eletromecânicas, na construtora Odebrecht. Mais tarde tirou um MBA na americana Darden School of Business e um mestrado em Finanças Empresariais na Universidade Católica do Rio de Janeiro. Acabou por entrar para a consultora McKinsey no Brasil, onde esteve durante 10 anos. A sua primeira aproximação à aviação dá-se em 2011, ao ser nomeado pela Secretaria de Estado da Aviação Civil para membro do conselho de administração da empresa pública que opera os principais aeroportos do país, a Infraero. Tem 42 anos, é casado e pai de três filhos e está aos comandos da TAP há sete meses. Quem trabalha com ele garante que, sempre que viaja nos aviões da TAP, faz questão de conversar com os passageiros, de ouvir os seus comentários, sugestões e críticas, que depois transmite às equipas de trabalho

“Pontualidade da TAP é vergonhosa”

“Acabaram os cancelamentos de voos por falta de tripulação, não há mais”, diz taxativamente Antonoaldo Neves, referindo-se à onda de problemas operacionais que levaram a TAP a deixar muitos passageiros em terra — houve centenas de voos cancelados no primeiro semestre. Já no que toca à pontualidade, ainda há trabalho a fazer, mas é uma situação para a qual já foram tomadas medidas, diz o presidente da TAP.

A TAP projeta um futuro de forte crescimento, mas o presente é bem diferente: há grandes problemas operacionais, houve centenas de cancelamentos no primeiro semestre… Porque há tantos cancelamentos?

Antes de mais, os cancelamentos acabaram em agosto, houve alguns mas dentro do que é normal. Eu disse “não quero cancelamentos em agosto”. Obviamente que se há um evento de manutenção esporádico há um cancelamento. Uma companhia aérea, para operar de forma adequada, só pode ter no máximo 1% de cancelamentos. O ideal é 0,75%. Uma companhia aérea como a TAP, que tem 400 voos por dia, deveria ter quatro cancelamentos por dia: é normal haver por condições meteorológicas, os comandantes adoecem… acontece. Mas infelizmente a TAP chegou a ter 3% por dia. É muito. Agosto foi muito bom, voltámos ao nosso padrão normal.

É verdade que o Governo chamou a TAP em julho e pressionou a empresa para trabalhar em conjunto com a ANA e com a NAV para melhorar os índices de cancelamentos?

A questão aí era mais de pontualidade. Chamou a TAP, sim. É o papel do regulador e do Governo, quando há uma crise de pontualidade. Tivemos problemas sérios de cancelamentos de voos. Se não conseguimos reconhecer que tivemos um problema não conseguimos avançar. Foram centenas, no pico foram mais de 200, e voltámos a números normais, que é ter 30, 40, 60 por mês. Houve incapacidade da TAP de colocar a sua máquina de formação de pilotos a funcionar. Treinar um piloto é um processo muito complexo, é preciso tirá-lo da sua atividade durante meses. Precisámos de treinar 44 pilotos por mês e não conseguimos chegar a esse número.

Há outra explicação: a TAP ocupou todos os slots, vendeu acima da capacidade e não teve tripulação. Não houve ganância?

Não. Refuto totalmente que a TAP tenha vendido o que não podia entregar. A TAP começa a vender nove meses antes de começar a voar o destino. O custo de cancelamento de um voo é brutal. Seria uma estupidez plena. Acusar a TAP de ganância não faz nenhum sentido. A TAP só vende o que pode voar. O que não conseguimos foi produzir 20 pilotos que precisávamos. Só tivemos problemas no médio curso por falta de pilotos. Em 400, são 200 comandantes e 200 copilotos. 20 comandantes no médio curso são 10%, é uma falta enorme. A TAP tem uma prática de décadas de trabalhar com um número um pouquinho a menos de pilotos do que precisa, porque os pilotos da TAP contribuem muito para a empresa, aceitam voar em dias de férias e de folgas. Descobri isso em abril, dois meses depois de passar a presidente, quando houve uma disputa laboral. A TAP conseguia cobrir 20 pilotos aproveitando férias e folgas dos pilotos, fez isso a vida inteira. Mas isso não aconteceu em abril. E gerou um volume de cancelamentos da ordem dos 200 voos. Isso terminou com um acordo muito bom para os pilotos e para a TAP, onde se estabeleceu uma regra de compensar de facto os pilotos por voarem em férias e folgas, agora são bem remunerados para o fazer.

Os cancelamentos acabaram em agosto, houve alguns mas dentro do que é normal

Pode afirmar aos clientes que o problema dos cancelamentos excessivos acabou?

Sim, por falta de tripulação acabou, não há mais. Houve três motivos para os cancelamentos: a TAP não tinha uma máquina de formação — estamos a criá-la agora —, houve um movimento de negociação sindical em torno de um acordo tácito entre as partes que eu desconhecia —, e o resultado foi muito bom, legitimou um novo acordo de paz social. E há um terceiro aspeto importantíssimo, o decreto-lei 139 [que impede que os tripulantes façam quatro voos no que é considerado o período noturno no espaço de sete dias]. Portugal está a adotar uma legislação inadequada, que regula a atividade da aviação e que não estava a ser considerada até ao início deste ano, pois as companhias de aviação entendiam que apenas tinham de atender à regulamentação europeia e aos acordos de empresa estabelecidos com cada sindicato. Houve uma interpretação de que além disso tudo tem de se obedecer ao decreto-lei 139 e a partir deste ano as empresas aéreas que operam em Portugal passaram a ter restrições de voos no seu grupo de pilotos, ficando com menos pilotos do que deviam ter. Tivemos uma série de cancelamentos de voos no final de julho e no princípio de agosto porque a White, a nossa operadora da ponte aérea Lisboa-Porto, para cumprir essa regulamentação, não conseguiu colocar mais pilotos no seu quadro. O entendimento do sector é que isso é ilegal. Estamos a discutir com os reguladores e com o Governo o que fazer relativamente a esta questão. Não devia existir este decreto-lei porque existe uma lei comunitária.

E como estão a nível de pontualidade?

A nossa ambição é ter uma empresa que está acima dos 80% de pontualidade. E a nível de cancelamentos, a minha ambição é ter 99% no mínimo de regularidade, já estou lá. Mas na pontualidade estamos muito longe, abaixo dos 50%, estou muito mal. É uma pontualidade vergonhosa. E queremos ter uma empresa mais feliz, com pessoas ultraengajadas.

Como vai mudar isso?

A pontualidade é o principal atributo que os clientes valorizam. Cerca de 50% dos voos atrasaram mais de 15 minutos em agosto, houve situações em que foi 70%. Tomámos medidas muito importantes. Em agosto tivemos dois aviões reserva no médio curso e um no longo curso, no ano passado não tínhamos isso. Investimos muito na contratação de 300 comissários e isso leva tempo na formação. Fizemos uma gestão muito forte no aeroporto. Tínhamos 100 pessoas no aeroporto de Lisboa no ano passado, este ano tivemos 210. Assinámos um novo contrato com a Groundforce e o volume de minutos de atraso por conta da Groundforce em agosto foi muito menor do que o de 2017. Tudo isto fez com que, com a operação ainda maior, conseguíssemos ser melhores. Ainda há muito a fazer. Precisamos de melhorar a coordenação interna no centro de controlo de operações.

Manutenção no Brasil foi reduzida “drasticamente”

A TAP decidiu encerrar a unidade de Porto Alegre, despedindo cerca de 1000 pessoas. A operação era considerada um sorvedouro financeiro: desde 2005 foram gastos no Brasil mais de €500 milhões

A operação de manutenção de aeronaves no Brasil — a VEM (Varig Engenharia e Manutenção), comprada em 2005 e que se revelou um pesadelo financeiro para a TAP — foi reduzida drasticamente, com o encerramento do emblemático centro de Porto Alegre. Era considerada um negócio ruinoso, na qual a TAP gastou entre €500 milhões a €600 milhões ao longo do tempo, quase o atual valor da dívida bancária do grupo. Agora está reduzida ao centro do Rio de Janeiro. E, graças a uma nova política comercial e várias iniciativas de cortes de custos, a TAP Manutenção e Engenharia Brasil registou um lucro operacional, excluindo custos de reestruturação, de aproximadamente €1 milhão.

“Desde a privatização da TAP passámos por um trabalho de eficiência no Brasil para tentar otimizar a operação, estancar a sangria, parar de perder dinheiro”, explica Antonoaldo Neves. “Este ano percebemos que mesmo com esses esforços, a operação, da forma como estava desenhada, não tinha condições de contribuir positivamente para o grupo. Chegámos à conclusão de que era preciso reduzir drasticamente a operação, tínhamos mais de 15 linhas de manutenção e não há procura para isso, por isso reduzimos para três linhas de operação, que estão no Rio de Janeiro. Fechámos a operação de Porto Alegre, que era uma operação emblemática no Brasil, pois foi onde a Varig começou a sua manutenção. Fechou em julho. Há apenas duas pequenas operações, uma de motores, estamos à procura de um parceiro para ficar com essa operação, e há também um negócio de trens de aterragem. É residual.”

O presidente da TAP explica que neste processo foram despedidas 1000 pessoas. “É triste, ninguém gosta de despedir, trouxemos cerca de 40 mecânicos para Portugal. Este ano, até julho, a operação deu pela primeira vez break-even [equilíbrio], ficámos com cerca de 550 pessoas no Rio de Janeiro.”

Chegou a estar em cima da mesa a hipótese de o grupo chinês HNA, acionista indireto da TAP, ficar com o negócio. “Trabalhei muito por isso, desde 2015, o negócio foi avaliado mas não seguiu em diante, eles desistiram”, conta Antonoaldo. “Tentámos vender a empresa como um todo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, não houve interessados e a partir desse momento decidimos encerrar a operação de Porto Alegre.”

“A TAP não vai financiar o Montijo’’

Antonoaldo Neves diz que o Aeroporto Humberto Delgado está completamente esgotado e isso limita fortemente a operação da TAP. Por isso, o novo aeroporto do Montijo é urgente, mas a TAP recusa financiar a sua construção. Se houver essa tentativa, assegura, irá para os tribunais.

A TAP chegou a dizer que a culpa dos cancelamentos e dos atrasos era da ANA, que recusou essa responsabilidade. Mantém essa ideia?

Hoje estive no centro de operações, vi que um voo que chegava a Lisboa às 5h45 estava atrasado 20 minutos. Perguntei porquê e disseram-me que estava atrasado na chegada porque não deixaram descolar no destino. E quem é que não deixou descolar? Foi lá, na partida, ou aqui, na chegada, em Lisboa? Responderam-me que foi em Lisboa, porque não havia espaço. Ou seja, o avião descolou por volta das 3 da manhã e às 5h45 já não havia espaço em Lisboa. Nos últimos dois meses, em que tenho ido todos os dias ao centro de operações, verifiquei que havia muitos voos da TAP fora de Lisboa que não saíam por atrasos com a tripulação e assumi a culpa, faltava tripulação por isso a culpa era minha. Agora não há mais isso. O que explica que um avião que está marcado para chegar a Lisboa por volta das 6 da manhã não possa sair do aeroporto de origem? Que culpa é que a TAP tem nisso? A justificação é haver restrições no aeroporto.

Isso afeta os vossos voos?

Temos severas limitações na infraestrutura do aeroporto de Lisboa, nomeadamente na articulação do conjunto pista-estacionamento-taxway, e é óbvio que elas causam atrasos. E é preciso assegurar que as capacidades que foram dadas são as capacidades que estão a ser realizadas. Isso é um papel do aeroporto. Se recebemos um slot para pousar às 7h20 e mudam, três meses depois, para as 7h15, baralha tudo. Tem de haver uma gestão de slots, a infraestrutura está a ser usada no limite. É preciso investir no Aeroporto Humberto Delgado.

Não dá para esperar?

Não, não dá. Precisamos de investimento hoje. Os salões de embarque estão cheios, os estacionamentos estão cheios, hoje eu tenho um grupo de amigos chegando do Brasil porque há o feriado de 7 de setembro no Brasil, vão ficar aqui no fim de semana comigo, estiveram duas horas na fila de empresa de aluguer de carros. Não dá!

O aeroporto está esgotado?

Totalmente esgotado. O meu receio é 2020. No ano passado fizemos 14 milhões de clientes, este ano vamos fazer 16 milhões, estamos a colocar pressão no sistema. O nível de serviços cai porque o aeroporto não consegue processar. No próximo ano vamos adicionar mais um milhão e meio de passageiros.

Liderou um estudo no Brasil na sequência de um ‘apagão’ nos aeroportos...

Um caos, um apagão...

Pode haver um colapso total do aeroporto no próximo ano?

Acho que sim. Este ano aconteceu o que eu esperava, sempre disse que achava que não ia acontecer um caos e sim que ia ser uma operação difícil. Foi melhor do que eu esperava, todos os investimentos que foram feitos pela TAP, pela Groundforce, pela NAV surtiram efeito, agora eu tenho preocupações para o ano que vem. Porque colocar mais um milhão e meio de passageiros no aeroporto só a TAP — e como a TAP representa metade dos voos é preciso multiplicar por dois — serão três milhões a mais. Como é que isso se vai fazer? O meu medo é 2020 sobretudo.

É ILEGAL FINANCIAR A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO AEROPORTO COM o AUMENTO DAS TAXAS

A TAP propôs um estudo sobre o aeroporto ao Governo, quando é que o entrega?

Está em andamento, são três fases, a primeira acaba no dia 11 e é sobre o que podemos fazer para gerir melhor o espaço aéreo.

Esse estudo é a prova de que são todos amigos, a NAV, a ANA, o Governo... percebeu se há esse ambiente de colaboração?

Sim, isso há, um ambiente de colaboração grande, apesar das disputas grandes que há com os outros stakeholders. O aeroporto precisava de ser ampliado mas tanto quanto sei a ANA não tem isso no seu projeto atual...

Porque é que a ANA não investe?

Isso é uma pergunta que tem que fazer para o CEO da ANA. Como companhia aérea, quero um aeroporto que tenha mais capacidade para eu poder crescer.

E quanto ao aeroporto no Montijo?

Nós desejamos, mas há concorrentes meus que dizem que a TAP é contra, acho muito curioso isso porque nunca me perguntaram. A TAP quer o Montijo porque é uma válvula de escape para este aeroporto.

É bom para a TAP ou para os concorrentes?

A TAP não pode operar no Montijo e o Montijo não vai ter operação de longo curso, eu tenho que continuar aqui na Portela. Então, naturalmente, pela forma que foi desenhada, é uma solução que não é para a TAP, mas até gostaria que o Montijo já estivesse pronto e que todas as companhias aéreas fossem para lá. É preciso que fique muito claro: a TAP não vai financiar o Montijo. A nossa visão é muito clara: é ilegal subir as tarifas na Portela para pagar o Montijo, se isso acontecer vamos recorrer aos tribunais, a gente vai às últimas consequências contra isso.

Teme que a ANA aumente as taxas para depois financiar o Montijo?

Há conversas sobre esse tema, muito informais, lemos na comunicação social e recebemos informações mas temos uma visão muito clara e jurídica de que é ilegal financiar a construção de um novo aeroporto com aumento das taxas. O meu problema hoje é que é muito caro para mim operar em Lisboa, é muito mais caro do que 99% dos outros aeroportos em que eu opero. Lisboa é o segundo aeroporto mais caro para a TAP.

TAP volta em força ao aeroporto do Porto

Não é arrependimento, garante: a TAP volta a investir no Sá Carneiro, com mais três rotas e reforço de Estados Unidos

Antonoaldo Neves diz que, no Porto, a TAP “deu um passo atrás para dar dois passos em frente”: primeiro reduziu a operação no Sá Carneiro, deslocando aviões para Lisboa, o que gerou intensas críticas da região norte, encabeçadas pelo autarca do Porto, Rui Moreira. Agora, a TAP vai voltar a investir. Arrependeu-se? “Não, não me arrependi, o desinvestimento no Porto foi das coisas mais acertadas que a TAP fez”, responde. E argumenta: precisou dos aviões para ganhar quota em Lisboa e para “estancar a sangria”. Ou seja, dinheiro.

“É bom que se perceba que quando chegámos não havia dinheiro para pagar à ANA” nem “para pagar combustível”. Antonoaldo Neves recorda que nem dinheiro para pagar salários havia até à injeção de capital depois da privatização: “Foi na sala do Fernando [Pinto, que liderava a companhia]. Estávamos nervosos, não tínhamos como pagar a folha salarial no outro dia, não havia, o dinheiro entrou e sumiu no mesmo dia”. A ANA, prossegue, “foi uma parceira imensa da TAP, ajudou no financiamento, reconheço isso”: funcionou como banco da TAP, ao adiar as cobranças de dívidas. Daí a decisão: “Precisava de estancar a sangria, estávamos a perder muito dinheiro nas operações do Porto”. Mudar para Lisboa “foi a decisão correta e acertada.”

Essa decisão implicou perder mercado no Porto para outros concorrentes, sob ameaças de que a Galiza “roubasse” o espaço do aeroporto Sá Carneiro. O que a TAP fez foi criar a ponte aérea entre Lisboa e Porto, que lhe permitiu aumentar o número de passageiros entre as duas cidades. Os números são conhecidos, as queixas também: a linha está descredibilizada por de cancelamentos e atrasos. Antonoaldo recusa o termo mas aceita a crítica. “A questão da pontualidade não é um problema do Porto, é um problema da TAP”, extensível a toda a empresa. “O que eu diria é que a TAP atendeu menos o Porto no que diz respeito à quantidade de voos diretos, isso é um facto”.

Agora, “estamos a voltar com muita vontade ao Porto, mas vai ser investimento, as rotas que abrimos no ano passado ainda são deficitárias, porque uma rota leva dois anos para fazer o breakeven”. Como a companhia já tem “fôlego financeiro” e “aviões adequados”, vai abrir novas rotas. Antonoaldo revela: “A TAP acredita no potencial do Porto. E vai abrir diversos destinos no ano que vem, porque vou ter equipamento novo”. Serão três novas rotas e reforço de outra: Munique, Lyon e Bruxelas, além da passagem de dois para seis voos por semana para Nova Iorque. “Quando a empresa foi privatizada o Porto tinha aproximadamente 30 voos por dia. No ano que vem vamos ter mais de 40 voos”.

O crescimento no Porto não ficará por aí. “Quando chegarmos aos 60 voos no Porto, a estratégia começa a mudar. Posso fazer um banco de conexão no Porto”. Ou seja, “aproveitamos a rede de longo curso para alimentar o Porto e também o fluxo entre as duas cidades”. A empresa terá uma estratégia assente no Airbus 321 Long Range, que permitirá fazer mais longo curso. Um minihub? “Não quero especular. Quando plantamos uma semente, só sabemos se a árvore vai dar frutos doces quando provarmos o fruto.”

Quanto à Madeira, Antonoaldo diz-se “surpreendido” e até “frustrado” com as críticas do governo regional por causa dos atrasos. “Continuamos a investir e não percebemos a razoabilidade das críticas”, diz. E realça que há atrasos causados pela meteorologia. Tanto que há propostas para que a Madeira deixe de ter limites de vento para poder ser operado. O que pensa a TAP? Que nem pensar nisso. “Eu não vou baixar os limites dos ventos enquanto for CEO da TAP. A TAP não negoceia com segurança. É uma irresponsabilidade tratar o assunto dessa forma, a TAP não vai entrar nesse jogo.” O que a TAP também tem é interesse “em aumentar a operação nos Açores. Não consigo fazer isso imediatamente porque temos limitações de pilotos e aeronaves, mas vemos potencial nos Açores.”

“Paz social teve cedências de todos”

Em abril a TAP voltou a ter problemas com os pilotos, mas após uma “negociação dura” em que houve cedências de ambas as partes foi alcançado um acordo de paz social por cinco anos, que elimina a hipótese de greves e se estendeu a outras classes profissionais. “Falta só um sindicato”, diz Antonoaldo Neves.

Avançaram com um acordo com os pilotos em que os aumentam 15% em cinco anos em troca de paz social. Isto não levou outras classes de trabalhadores a pedir o mesmo?

Levou, como prevíamos. Fizemos um acordo de cinco anos com os pilotos para ter paz social, com um aumento extremamente alto e cedências de ambas as partes. Os pilotos cederam em pontos importantes no acordo de empresa. Cederam no pagamento de dias de folga e na reorganização do modelo de convívio entre a TAP e a PGA. Foi uma negociação dura. Dos mais de 10 sindicatos que a TAP tem, apenas falta um chegar a acordo, mas estamos em processo final de negociação. Todos os outros tiveram aumentos da mesma magnitude mas cederam em pontos importantes. Estou muito satisfeito com este processo. A magnitude dos aumentos foi muito parecida.

São conhecidas dificuldades na contratação de pilotos. Estão tranquilos quanto a esse processo?

Nunca estamos tranquilos com a falta de pilotos. É uma profissão extremamente técnica. É um dos trabalhos mais desejados em Portugal, há muito recrutamento interno a fazer, há muitos comissários que querem ser pilotos.

O facto de a TAP cobrar €30 mil para a formação de novos pilotos não pode afastar alguns interessados?

Nós já cobrávamos isso na Portugália, é uma prática da indústria, as outras companhias aéreas também o fazem. É óbvio que pode mudar a decisão de alguma pessoa, que decida ir para outra companhia aérea, mas tudo bem, faz parte da vida. O que não posso é ter duas políticas diferentes na mesma companhia.

Como é que se faz da TAP uma empresa mais feliz?

Acabámos de fazer um inquérito de satisfação dos trabalhadores e já diagnosticámos uma série de itens que temos de melhorar. Nomeadamente, os nossos funcionários já podem voar de graça em determinadas situações ou pagando muito pouco mas vamos melhorar esse programa de benefícios, é uma reclamação que fazem. O nosso campus precisa de ser todo reformulado, temos condições que deixam muito a desejar. Os nossos funcionários dizem que as chefias precisam de transferir mais responsabilidades para eles, o que é muito bom. E há um outro passo que é o engajamento da liderança, eu dou o exemplo, dou o meu telemóvel a todos os funcionários.

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