Em busca do vinho eterno
Não está assim tão longe…
Uma das perguntas que mais frequentemente assaltam o enófilo é: quanto tempo vai durar este vinho? Sabemos quais são as características necessárias à longevidade — sendo provavelmente a acidez a mais importante — mas o que não sabemos é até onde vai a capacidade do vinho para viver bem e dar prazer a beber. No sábado passado estive numa prova de Vinho da Madeira, no Palácio de Seteais (Sintra). Acho que nenhum apreciador tem dúvidas em afirmar que aquele tipo de vinhos são dos mais longevos que temos em Portugal e, não mentiremos se o dissermos, do mundo. Há várias regiões no globo capazes de produzir vinhos de enorme longevidade, como o Jura, em França, onde vinhos brancos com 200 anos (feitos a partir da casta Savagnin) já foram objeto de prova e revelaram muita saúde. Na Madeira passa-se um pouco a mesma coisa, mas há mistérios por resolver: circulam muitas garrafas, nomeadamente em leilão, que não têm selo do Instituto do Vinho da Madeira, o que não dá quaisquer garantias a quem compra; acresce outro problema sério: com a filoxera na segunda metade do século XIX e a consequente introdução da vinha de produtor direto (morangueiro), não sabemos hoje com toda a certeza se alguns dos famosos Madeira do século XIX não têm também alguma uva americana misturada. Atualmente tal não é autorizado, mas os híbridos ainda continuam a ser muito frequentes e muito plantados na ilha (tal como nos Açores) para consumo próprio e festas religiosas; é também muito provável que fosse então usada aguardente de cana para aguardentar os vinhos, enquanto hoje se utiliza álcool vínico a 96%. Há depois castas que eram então famosas e que hoje estão praticamente desaparecidas, como Bastardo e Moscatel. As variedades brancas que deram fama ao Madeira — Sercial, Verdelho, Bual, Malvasia e Terrantez — são as que menos área de vinha ocupam, as mais difíceis de adquirir e, no caso do Terrantez, no limite da extinção. O que mais sobra na ilha é a casta Tinta Negra e são os próprios produtores tradicionais (Madeira Wine, Barbeito, Borges, Justino’s) que estão a tentar puxar por ela para lhe conferir idêntico estatuto de nobreza que as brancas granjearam. Não é fácil, porque os resultados não são consensuais e as brancas levam a palma de ouro quando chega a hora da prova. Em Sintra provaram-se vinhos fabulosos mas também outros que nos deixam muitas dúvidas. As fake não existem só nas news, podem aparecer em todo o lado. Mas uma coisa é certa: provar um Sercial 1860 da empresa Leacock (anterior à filoxera) é perceber que, sem ponta de nacionalismo, estamos perante um vinho que irá durar mais 200 anos, tal a vitalidade que ainda mostra. O meu Madeira mais antigo foi, há poucos anos, um Barbeito 1795. A mesma sensação: temos vinho para mais um ou dois séculos. Estes são vinhos que nos fazem pensar e acreditar no futuro. A seleção da semana não os inclui por já não existirem. Mas em breve voltaremos com boas notícias.
Casal Sta. Maria Colheita Tardia branco 2015
Região: Reg. Lisboa
Produtor: Adraga Explorações Vitivinícolas
Casta: Petit Manseng
Enologia: Jorge Rosa Santos/ António Figueiredo
Preço: €18
Fermenta em barrica usada. Um ano e meio em barrica. A casta é típica do sudoeste francês, sobretudo Jurançon
Dica: Muito bem conseguido, austero, doce mas muito capaz para excelente prova à mesa, com foie-gras por exemplo
Cottas Garrafeira branco 2015
Região: Douro
Produtor: Quinta de Cottas
Castas: Três variedades locais
Enologia: Manuel Vieira
Preço: €15
Teve estágio em barrica e 2,5 anos em garrafa antes de ser agora comercializado
Dica: Rico, com um toque mineral, um branco de classe a um preço cordato
Pontual Reserva tinto 2016
Região: Reg. Alentejano
Produtor: PLC
Casta: Domina o Alicante Bouschet mas tem mais castas
Enologia: Paolo Nigra
Preço: €9,50
Teve 12 meses de estágio em barrica. Muito boa a proporção entre fruta, acidez e estrutura
Dica: De inegável sentido gastronómico, temos tinto bem conseguido e consensual
Os preços foram fornecidos pelos produtores