RICARDO COSTA

Professores, a estranha cola da oposição

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Não é a primeira vez que a oposição se junta, naquilo a que os governos costumam chamar coligação negativa, para aprovar ou chumbar algo que seja reclamado pelos professores. Aconteceu, por exemplo, no célebre sistema de avaliação de Maria de Lurdes Rodrigues. Voltou a acontecer agora, com a reposição de uma norma orçamental que obriga o Executivo a reabrir as negociações com os sindicatos, com vista à contagem integral do tempo de carreira. A decisão tem mais valor simbólico do que real, porque apenas “obriga” à reabertura das negociações. Não impõe nenhuma contagem, muito menos a integral, e o Governo não está obrigado a chegar a uma conclusão diferente da atual.

No fundo, é um “votei, mas não inalei”, em que todos os partidos da oposição – do CDS ao PCP – acham que ganham a simpatia dos professores, sem que, na verdade, lhes tenham dado o que quer que seja, salvo umas rondas negociais em que não se vislumbram grandes saídas, dado o peso orçamental permanente de qualquer alteração. É altamente provável que o Governo mantenha o que tem decidido e parta para as negociações sem grande vontade de alterar a sua posição, claramente balizada pela capacidade financeira. É igualmente provável que os sindicatos não recuem na vontade de recuperar todo o tempo perdido, porque a colocam como questão de princípio. Entre uns e outros fica um mar de argumentos e muito dinheiro.

Ver o PCP e o Bloco ao lado dos sindicatos é absolutamente normal. Ver o CDS e o PSD no mesmo barco é mais estranho, sobretudo quando o que está em causa é o desejo de recuperação integral do que se perdeu nos anos da troika. Ora, se alguém acompanhou esses anos da perspetiva do poder foram estes dois partidos. Sabem exatamente porque é que a troika congelou carreiras e progressões e impôs uma série de travões. Sabem quanto é que isso representou nos sucessivos orçamentos e quanto é que vale o seu descongelamento.

Não há praticamente nenhuma profissão que não tenha sido seriamente afetada pela passagem da troika, muitas delas com milhares e milhares de desempregados, empresas fechadas e salários incrivelmente mais baixos como norma. Querer apagar isso é um desejo legítimo, mas é incompreensível para a esmagadora maioria da população, que não tem qualquer hipótese de o fazer

Mais relevante, tanto o PSD como o CDS sabem que a recuperação integral do tempo de profissão não levanta apenas questões financeiras. Levanta uma questão moral e de igualdade quase inultrapassável. Não há praticamente nenhuma profissão que não tenha sido seriamente afetada pela passagem da troika, muitas delas com milhares e milhares de desempregados, empresas fechadas e salários incrivelmente mais baixos como norma. Querer apagar isso é um desejo legítimo, mas é incompreensível para a esmagadora maioria da população, que não tem qualquer hipótese de o fazer.

Não sei onde é que o PSD e o CDS têm a cabeça quando decidem este tema. Ou por outra, até sei. Mas esse raciocínio é errado. Os professores são uma massa imensa, mas feitos de pessoas com vontade própria. Não votam em massa neste ou naquele partido. Por essa ordem de ideias, nenhum professor tinha votado na coligação PSD-CDS em 2015. E daqui por um ano nenhum votaria PS… Achar isto é não perceber nada de dinâmicas eleitorais.