RICARDO COSTA

Tomás Correia perguntou ao tempo

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O que raio ainda está a fazer Tomás Correia no universo do Montepio? Esta pergunta é daquelas que pode ser feita de seis em seis meses, nunca perdendo atualidade. Desde o final da semana passada que a pergunta não me sai outra vez da cabeça. E já me ocorre há uns quantos anos...

Há uma tendência natural para colocar os problemas dos bancos portugueses todos no mesmo saco. Isso existe quando os jornalistas somam prejuízos (nivelando o que não deve ser nivelado), quando os deputados legislam sobre bancos ajudados pelo Estado (como se os que devolveram com juros a sério fossem iguais aos outros) ou quando os comentadores falam do comportamento ou práticas dos banqueiros.

Esse princípio é errado, sobretudo porque confunde mais do que ajuda. O BPP e o BPN são casos radicalmente diferentes, a ajuda ao BANIF (que se evaporou) não pode ser comparada à do BCP ou BPI (que a pagaram de volta, com lucros fabulosos para o Tesouro), Oliveira e Costa não é sinónimo para todos os banqueiros que erraram ou falharam, nem todos os créditos ruinosos são criminosos, fazem parte do risco da atividade.

Tudo isto serve para dizer que o caso Montepio/Associação Mutualista não deve ser posto a par de outros, e que o mesmo se aplica ao homem que liderou o banco e agora está à frente da associação. Mas devo dizer que, à medida que o tempo passa, vou tendo mais dificuldade em defender esta ideia, porque o comportamento de Tomás Correia se vai assemelhando cada vez mais ao de um banqueiro em fuga contra o tempo e contra o passado, entre os pingos de uma legislação que, por sorte ou sabedoria, joga quase sempre a favor dele.

Um homem em fuga ao passado não faz pausas para colocar questões éticas. Sobe mais um degrau na escala do absurdo, coloca mais uma tranca na sua fortaleza e não pergunta ao tempo quanto tempo ainda tem

As multas da semana passada não foram uma surpresa para ninguém, nem para o principal visado, que as espera há anos. Chegaram, como sempre, muito tarde e, como sempre, sem qualquer efeito imediato. O tempo dos recursos é longo, a Mutualista é uma boa fortaleza para enfrentar uma batalha legal, o misterioso voto dos associados serve de legitimação a quase tudo.

Esperemos, porque não nos resta outra coisa. Mas a Tomás Correia assiste uma possibilidade, de natureza ética e prática, que não pode ser delegada nem entregue a juízes terceiros: a de olhar ao espelho e perguntar se está a favorecer ou prejudicar os associados da Mutualista e, por arrasto, o banco. Basta este simples gesto para que tudo seja claro na sua cabeça, como já é na de qualquer português.

A questão é tão simples e de resposta tão óbvia, que Tomás Correia não a deverá fazer. Um homem em fuga ao passado não faz pausas para colocar questões éticas. Sobe mais um degrau na escala do absurdo, coloca mais uma tranca na sua fortaleza e não pergunta ao tempo quanto tempo ainda tem. Qualquer coisa serve.