Startups. Os maiores fracassos de 2018 e o que eles nos ensinaram
A PitchBook, empresa de análise de dados financeiros, divulgou a lista dos 25 maiores fracassos do ecossistema empreendedor no último ano. Eram startups promissoras que faliram em 2018 e com elas levaram milhões de euros em capital de risco
Texto Cátia Mateus Fotos Nuno Botelho
Estar no radar dos investidores ou angariar financiamento relevante não é garantia de imunidade ao fracasso. As empresas, grandes ou pequenas, falham. E se ter uma equipa de investidores a dar apoio ao nível da gestão pode ser importante para minimizar o risco, não é garantia de que os empreendedores consigam fintar as adversidades e levar os seus projetos além do vale da morte por onde passam todos os negócios. Tal como em anos anteriores, a tecnológica PitchBook, que presta serviços de análise de dados financeiros para empresas de capital de risco e outras, compilou numa lista as 25 startups mais financiadas por venture capital que faliram em 2018. O Expresso selecionou algumas, acrescentou outra, e extraiu o legado destes fracassos.
Na história da indústria de capital de risco, 2018 fica como o ano em que a Theranos, a empresa multimilionária da área da saúde e serviços técnico-laboratoriais, fechou portas. A empresa liderada por Elizabeth Holmes – uma das milionárias mais jovens dos EUA e por várias vezes comparada a Steve Jobs – chegou a ser referenciada como uma revolução na área da saúde ao propor, com recurso a um aparelho portátil, realizar o diagnóstico de 30 doenças a partir de uma gota de sangue extraída da ponta do dedo, com resultados quase imediatos. Tudo parecia perfeito, inclusive para os investidores, que financiaram o projeto com mais de 910 milhões de dólares (€800 milhões), até Holmes ter protagonizado, em 2016, um dos maiores escândalos tecnológicos dos últimos anos.
A empresa, que estava avaliada em €8,5 mil milhões, entrou em colapso depois de uma investigação do “The Wall Street Journal” ter revelado que a Theranos não cumpria mais de 10% dos testes anunciados (15 testes em 240) e que mesmo nestes, ex-funcionários da empresa manifestavam sérias dúvidas em relação à sua fiabilidade.
A CEO acabaria por assumir a culpa e, em junho de 2016, a “Forbes” reavaliou o valor da empresa, desvalorizando-a €8 mil milhões. Em junho de 2018, Holmes e Ramesh Balwani, ex-presidente da empresa, foram acusados pelo Ministério Público de 11 crimes de fraude, com uma pena que pode ir até aos 20 anos de prisão. A fundadora da empresa está ainda impedida de gerir ou exercer qualquer função executiva em empresas públicas nos próximos dez anos.
O mercado dita as regras
Histórias como a da Theranos demonstram que o mercado, os investidores e a comunidade raramente perdoam uma deslealdade. E este até pode ser o caso mais marcante dos fracassos empresariais de 2018, mas não é o único. Na lista da PitchBook está também a Airware, a companhia que levantou 118 milhões de dólares (€103 milhões) junto de investidores como a Google ou as empresas de capital de risco Andreessen Horowitz e Kleiner Perkins, graças ao software de computação na nuvem que desenvolveu para drones.
A empresa tinha tudo (ou quase tudo) para dar certo. Propunha uma solução que permitiria a empresas de vários sectores (construção, seguradoras e outras) obter dados aéreos sem o recurso a helicópteros, mas não avaliou bem o mercado. “A história ensinou-nos o quão difícil pode ser calcular o momento certo da transição para o mercado”, justificaram os fundadores ao site de tecnologia Techcrunch, acrescentando que foram “pioneiros no mercado nesta área e uma das primeiras empresas a reconhecer o potencial dos drones no sector comercial, mas o mercado demorou mais tempo a amadurecer” do que esperavam.
Em setembro, quando fechou atividade, a Airware empregava 140 profissionais, segundo o Techcrunch. A história da empresa demonstra que chegar ao mercado com um produto inovador e disruptivo é fundamental, mas não é mais importante do que apresentá-lo quando o mercado já está pronto para lhe dar valor.
Pioneiros, mas...
A startup de realidade aumentada Blippar, também listada como um dos grandes fracassos do ano pela PitchBook, enfrentou o mesmo problema. Era pioneira na sua área de atuação, mas o mercado evoluiu de forma tão lenta que em dezembro a empresa – que levantou 131,7 milhões de dólares (€115 milhões) junto de investidores como a Qualcomm e a Candy Ventures - anunciou o encerramento. A empresa gastou muito do financiamento que recebeu à procura de novos clientes, enquanto a concorrência emergia no mercado. Perante as dificuldades, a estrutura acionista entrou também em rota de colisão. A empresa aguarda agora que a justiça britânica decida o destino dos seus ativos.
Na lista da PitchBook está também a Rethink Robotics que passou mais de uma década a tentar criar robôs que interagissem com os humanos, chegando a criar os robôs humanoides Baxter e Sawyer (usados em fábricas e fáceis de programar) e a levantar 149 milhões de dólares em investimentos (€131 milhões).
Apesar de reconhecida e respeitada entre a comunidade de investidores e tecnológica, a Rethink Robotics não conseguiu que os seus produtos tivessem o sucesso esperado. Um mercado ainda imaturo, a concorrência apertada e o fracasso de uma grande encomenda para um cliente chinês ditaram o fracasso da empresa.
O caso nacional
Fora da lista da PitchBook mas no centro da polémica nacional esteve, no último ano, a plataforma portuguesa Chic by Choice, que também entrou no ranking dos fracassos. A revista “Forbes” tinha distinguido há menos de um mês Lara Vidreiro e Filipa Neto, as fundadoras daquela plataforma de aluguer de vestidos de luxo, no seu ranking anual “30 under 30”, que destaca jovens empreendedores de elevado potencial com menos de 30 anos, quando as dificuldades da empresa se tornaram conhecidas.
A empresa, participada pela Portugal Ventures, estrutura de capital de risco pública que detinha 18,6% do capital da plataforma, estava desde 2016 em falência técnica, como avançou o Observador na altura, com prejuízos de mais de um milhão de euros.
Nessa altura, a Portugal Ventures tinha já reforçado o investimento na empresa com a perspetiva de que a margem operacional da marca convergisse para a necessária sustentabilidade do negócio, o que acabou por não se verificar. As promotoras tentaram ainda, sem sucesso, negociar a entrada de outros investidores para viabilizar a continuidade do projeto. A empresa, que conseguiu captar €2 milhões em investimento, acabaria por se ver a braços com a Justiça, com credores a €72 mil em dívidas.
Os 25 maiores fracassos de 2018
1. Theranos
2. Lytro
3. Videology
4. Rethink Robotics
5. Shyp
6. ItsOn
7. Airware
8. Medical Simulation
9. ReVision Optics
10.Fallbrook Technologies
11. Primary Data
12. Condescent Health
13. Paieon
14. Alphabe Energy
15. Winx
16. EZhome
17. Navdy
18.Rennovia
19. Data Torrent
20. Innovari
21. Apprenda
22. Claritas Genomics
23. Industrial Origami
24. Senzari
25. SDCmaterials