Empresas estrangeiras em Portugal pagam salários 40,6% acima da média e têm produtividade muito superior
Apesar de serem poucas, as filiais estrangeiras em Portugal distinguem-se pela produtividade e políticas salariais
Texto Sónia M. Lourenço
Portugal fica abaixo da média da União Europeia em muitos indicadores. E a atração de empresas estrangeiras não é exceção. O peso das filiais estrangeiras no tecido empresarial português fica abaixo da média da União Europeia em indicadores como o número de empresas, o emprego ou o valor acrescentado. Mas, em sentido contrário, Portugal é dos países europeus onde as filiais estrangeiras mais se distinguem em termos de salários e produtividade.
Os dados do Eurostat são esclarecedores. Em 2016 (últimos dados disponíveis a nível europeu) havia 6.109 filiais estrangeiras no país, o que representava 0,73% do universo empresarial (excluindo o sector financeiro e segurador). Esta percentagem era a sexta mais baixa entre todos os 28 países da União Europeia (UE) e ficava bem abaixo da média da UE, que atingia 1,2%. E Portugal também ficava aquém da média da UE em termos do peso das filiais estrangeiras no emprego - 13,1% versus 15,3% - e no valor acrescentado bruto a custo de fatores - 24% contra 25%.
“É preciso fazer uma leitura em termos históricos“, considera João Cerejeira, professor da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho, lembrando o alargamento a leste da UE. Até essa altura “Portugal acolheu muito investimento estrangeiro de natureza industrial, nomeadamente alemão“, mas, depois, “houve uma reorientação para esses países, que tinham maior proximidade geográfica e cultural, e maior qualificação, em termos médios, dos trabalhadores”, aponta. “Isto afetou Portugal, que deixou de ser um país importante na atração de investimento alemão”, vinca. Uma tendência que ajuda a perceber porque é que o país fica abaixo da União Europeia nestes indicadores.
Certo é que, apesar de serem poucas, as filiais estrangeiras em Portugal distinguem-se pela produtividade e políticas salariais. Mais uma vez os dados do Eurostat (que não incluem o sector financeiro e segurador) não deixam margem para dúvidas. Em 2016, a produtividade por trabalhador (valor acrescentado bruto por pessoa empregada) atingia 45,4 mil euros, em média, nas filiais estrangeiras em Portugal, o que comparava com 24,9 mil euros no conjunto do tecido empresarial. Tradução: um diferencial de 82,3%, o nono maior entre os 28 países da UE.
Quanto aos salários, medidos pelos custos médios com pessoal (rácio entre custos com pessoal e número de trabalhadores) atingiam, em 2016 (valor anual), 24,6 mil euros nas filiais estrangeiras em Portugal, o que comparava com 17,5 mil euros no conjunto de todas as empresas no país. Ou seja, em média, nas filiais estrangeiras os salários eram 40,6% superiores, colocando Portugal na sétima posição entre os 13 países da UE para os quais há dados disponíveis no que toca a este diferencial.
A nível europeu, os dados para 2016 são os últimos disponíveis, mas, para Portugal, o Instituto Nacional de Estatística já disponibilizou valores provisórios para 2017 sobre esta realidade. O que dizem? Analisando apenas as sociedades não financeiras (e não todas as empresas não financeiras), as conclusões vão no mesmo sentido. Nesse ano, a produtividade aparente do trabalho nas filiais estrangeiras atingia 45.205 euros, ficando 73,4% acima dos 26.064 euros registados nas sociedades nacionais. Ao nível salarial, o diferencial era de 43,3% (1351 euros de remuneração média mensal nas filiais estrangeiras, versus 943 euros mensais nas sociedades nacionais).
Prémio salarial
Não é por acaso que as filiais estrangeiras pagam melhores salários. Vários estudos apontam nesse sentido. Até porque, em regra, são empresas de maior dimensão e mais intensivas em capital e tecnologia.
Sinal disso, o estudo “Paying more to hire the best? Foreign firms, wages and worker mobility” (2008) da autoria de Pedro S. Martins, antigo secretário de Estado do Emprego e professor universitário, analisando dados para Portugal entre 1991 e 2000, conclui que “as empresas estrangeiras oferecem políticas salariais significativamente mais generosas”. E avança números: analisando a mobilidade de trabalhadores, os resultados indicam que “os movimentos de firmas domésticas para firmas estrangeiras traduzem-se em aumentos salariais médios consideráveis e robustos, de mais de 10% em muitos casos”. Um aumento “consistente com um 'efeito de política salarial' - maior 'generosidade' nas práticas remuneratórias nas firmas estrangeiras vis-à-vis as suas contrapartes domésticas”.
Também o estudo “Foreign acquisition and internal organization” (publicado em 2016) do Núcleo de Investigação em Políticas Económicas da Universidade do Minho, e da autoria de Paulo Bastos, Natália Monteiro e Odd Rune Straume, aponta no mesmo sentido, concluindo que “os salários médios sobem após uma aquisição” de uma empresa nacional por uma estrangeira. Mais ainda, analisando dados para Portugal entre 1991 e 2009, o documento conclui que os salários nos níveis hierárquicos próximos do topo. Quanto? Cerca de 25%, em média, no caso de diretores e presidentes executivos (CEO); 10%, em média, para os gestores de topo; e apenas entre 3% e 4%, em média, para supervisores e operadores.
Um terceiro estudo, “The labor market effects of foreign owned firms”, de Rita Almeida e do Banco Mundial, conclui que “as empresas estrangeiras têm uma força de trabalho mais educada e pagam salários mais elevados do que empresas domésticas, mesmo quando se controla a variável da qualidade dos trabalhadores”.