Com Tomás Correia é limpinho, limpinho
Todos os administradores do Montepio que foram acusados em 2017 foram condenados pelo Banco de Portugal. A lista de ilícitos, entre 2009 e 2014, é generosa: violações do sistema de controlo interno do banco no âmbito da gestão do risco de crédito, ausência de constituição de provisões para risco específico de crédito, concessão de créditos a sociedades de que os administradores eram gestores, incumprimento nos deveres de implementação de controlo interno na verificação da origem do dinheiro dos subscritores das unidades de participação e financiamentos a entidades relacionadas que ultrapassaram o limite legal. Todos os administradores foram condenados por alguma destas acusações, Tomás Correia foi por todas. E por isso foi condenado a pagar 1,25 milhões de euros. A Caixa Económica Montepio Geral foi também condenada a uma coima de 2,5 milhões de euros por parte do supervisor. Entre administradores e banco, a multa foi quase de cinco milhões.
De uma certa forma, o Montepio é um segundo Espírito Santo. Não na gravidade ou nas consequências, pelo menos do que se sabe, mas no que revela do país. Toda a gente medianamente informada sabe há muito tempo quem é Tomás Correia. Toda a gente sabe o que ele anda a fazer há anos na maior mutualista nacional e o que antes andava a fazer no seu banco. Isso é dito e escrito sem sequer haver uma reação indignada do visado. Mesmo assim, o homem vai a votos e ganha. Mesmo assim, antes de ir a votos, consegue o apoio de uma lista impressionante de políticos, intelectuais e artistas que criaram uma relação de dependência com o Montepio e acham que isso os coloca em dívida com o seu presidente.
Não foi um apoio qualquer: sabendo tudo o que sabemos hoje, porque Tomás Correia já estava acusadíssimo, integraram a sua lista Maria de Belém, Jorge Coelho, Luís Patrão, Idália Serrão e Vítor Melícias. E apoiaram a sua candidatura Carlos Zorrinho, Lacerda Machado, João Soares, João Matos Correia e Edmundo Martinho. Como escrevi depois das eleições internas, o BPN era um negócio do PSD com um cheirinho de PS, o Montepio é um negócio do PS com um cheirinho de PSD. E até Maria das Dores Meira, presidente da Câmara de Setúbal, do PCP, se juntou à festa – no que, diga-se com justiça, se distanciou dos restantes membros do seu partido que se envolveram nas eleições do Montepio e estiveram com a oposição.
A razão por que tanta gente esteve disposta a manchar o seu nome em listas de apoio a Tomás Correia só tem uma explicação: a estratégia de concentrar as baixas da derrocada do BES em Ricardo Salgado, José Sócrates, Armando Vara e pouco mais, e do BPN em Oliveira Costa e mais ninguém, correu muitíssimo bem. Todos perceberam que basta escolher dois ou três maus da fita para que eles funcionam como tira-nódoas. Tudo assim pode continuar como sempre foi. Limpinho, limpinho. Como se vê no Montepio, continua
Nenhuma destas pessoas foi enganada ou deu o beneficio da dúvida. Sabiam tudo o que soubemos na semana passada, porque tudo já estava nas acusações e tinha sido publicado. Nada foi conhecido depois das eleições. E mesmo assim Tomás Correia contou com uma cumplicidade só não explicitada do Governo, deixada clara pelo apoio de Edmundo Martinho, presidente da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, e da ex-secretária de Estado de Vieira da Silva, Idália Serrão.
A razão por que tanta gente esteve disposta a manchar o seu nome em listas de apoio a uma figura que tem tudo para acabar bem pior do que esta multa, e que pôs em perigo uma das principais instituições bancárias do país – com um impacto social muito mais significativo do que o BES –, só tem uma explicação: a estratégia de concentrar as baixas da derrocada do BES em Ricardo Salgado, José Sócrates, Armando Vara e pouco mais, e do BPN em Oliveira Costa e mais ninguém, correu muitíssimo bem. Todos perceberam que basta escolher dois ou três maus da fita para que eles funcionem como um autêntico tira-nódoas. Tudo assim pode continuar como sempre foi. Limpinho, limpinho. Como se vê no Montepio, continua.