Impostos

A devolução de rendimentos às famílias é real? Sim, mas a conta-gotas

<span class="creditofoto">Foto António Pedro Ferreira</span>

Foto António Pedro Ferreira

Os números da OCDE sustentam a política de devolução de rendimentos preconizada pelo Governo. Em todo o caso, apesar da carga fiscal sobre os salários estar a diminuir, ainda se mantém acima dos 40%, longe dos anos anteriores ao “enorme aumento” dos impostos de Vítor Gaspar

Texto Ana Sofia Santos Infografias Liliana Gonçalves

A carga fiscal sobre o trabalho diminuiu, de novo, em Portugal. Em 2018, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), situou-se nos 40,7%, contra os 41,4% verificados no ano anterior. Já tinha descido em 2017.

As contas dizem respeito a uma pessoa solteira, sem filhos, com um rendimento de 18.343 euros por ano (a média salarial apurada para o nosso país), e, no panorama dos 36 países que integram a OCDE, Portugal figura entre as economias que mais tributam os rendimentos do trabalho - apesar de ter protagonizado uma das maiores descidas entre 2017 e 2018.

Já a média para os países da OCDE situou-se nos 36,1% no ano passado, menos 0,16 pontos percentuais (p.p) do que em 2017, tratando-se do quarto decréscimo anual consecutivo, segundo o relatório “Taxing Wages - 2019”. Trata-se de uma descida que ficou a dever-se, sobretudo, a quatro grandes cortes na carga fiscal nos seguintes países: Estónia (-254% p.p.), EUA (-2,19 p.p.), Hungria (-1,11 p.p.) e Bélgica (-1,09 p.p.). Mesmo assim, perto de dois terços dos países da OCDE (num total de 22 economias) registaram ligeiras subidas na carga fiscal, mas nenhum destes acréscimos superou o meio ponto percentual. Outros dez países, Portugal incluído como já foi dito, registaram ligeiras descidas.

Estamos entre os que mais cobram

A OCDE analisou os impostos e as contribuições para a segurança social que são exigidos aos trabalhadores e Portugal ocupou, em 2018, a 16ª posição na lista dos países com a maior carga fiscal sobre os salários, mas em 2017 estava em 13º lugar. À frente da tabela surge a Bélgica, com 52,7%, seguindo-se a Alemanha, com 49,5% e a Itália, com 47,9%. No fim do ranking, com a menor carga fiscal, está o Chile, com apenas 7% de tributação do trabalho.

Do total da carga fiscal sobre os salários em Portugal, 12,6% diz respeito a IRS, 8,9% refere-se às contribuições para a segurança social a seu cargo e 19,2% às contribuições pagas pela entidade empregadora. As contribuições para a segurança social têm permanecido inalteradas, com o desagravamento fiscal a fazer-se via IRS.

Ainda assim, continuamos longe dos valores pré-troika, antes do “enorme aumento” dos impostos em 2013, anunciado pelo então ministro das Finanças, Vítor Gaspar, em outubro de 2012, durante o Governo de Passos Coelho. Em 2012, a carga fiscal sobre o trabalho era de 37,6% e, provavelmente, nunca mais de voltará a este patamar, mesmo com as medidas entretanto levadas a cabo para reduzir a fatura dos impostos, como o fim da sobretaxa do IRS e o ajuste nos escalões.

A sobretaxa do IRS só acabou em finais de 2017, ainda gerando largos milhões de receitas para o Estado nesse ano. O mesmo não aconteceu com a contribuição adicional de solidariedade, aplicada às pensões mais elevadas, que foi extinta logo no início de 2017.

Entretanto, foram revistos as taxas e os escalões de IRS e foi aumentado o valor do mínimo de existência (está isento de tributação e da obrigação declarativa). Porém, houve cortes significativos nas deduções à coleta, nomeadamente na saúde, bem como nas despesas com a habitação própria permanente.

Os números da OCDE corroboram que no caso das famílias com filhos a descida da carga fiscal está a ser mais expressiva face aos contribuintes solteiros e sem descendentes - o que não é alheio ao facto de ter aumentado de forma significativa o desconto fixo por cada dependente na fatura fiscal.

No caso de um agregado com dois filhos em que apenas um membro do casal trabalha, a carga fiscal do IRS somado à Segurança Social foi de 29% em 2018, segundo o relatório da OCDE. Este valor era de 27,9% em 2012, tendo saltado para os 30,2% em 2013.