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Antes pelo contrário

Daniel Oliveira

Um apelo aos pilotos

Não me recordo de ver um sindicato tão isolado como está o dos pilotos. É praticamente impossível encontrar um único cidadão que não seja associado desta estrutura sindical e apoie a greve que está marcada para os primeiros dez dias de maio. O movimento Não TAP os Olhos, que se tem oposto à privatização da TAP, liderado por António-Pedro Vasconcelos e de que sou um simples subscritor, fez um apelo público para a desmarcação desta greve. Ou seja, aqueles que mais se têm batido por uma companhia aérea pública de bandeira e que mais solidariedade têm manifestado para com os trabalhadores da TAP são os que de forma mais clara mostram o seu repúdio por esta paralisação.

Não tenho a relevância de um movimento social, mas também não me lembro de uma greve me ter causado o incómodo e a revolta que esta me causa. Como saberão os meus leitores, é preciso muito para me opor publicamente a uma greve. Porque sei que não falta quem se oponha a elas, em todas as oportunidades e circunstâncias. Nunca furei uma greve. O meu princípio sempre foi este: da justeza de uma greve discuto com o sindicato. Tomada democraticamente a decisão de a fazer, não enfraqueço a estrutura que me representa e por isso faço greve. Compreendo que seja difícil, para quem não foi educado no espírito da lealdade coletiva e da solidariedade entre pares, compreender este raciocínio. Aquele que sabe que a unidade de um grupo social mais frágil (o dos que vivem apenas do seu trabalho) não se pode dar ao luxo do individualismo.

Claro que este raciocínio tem limites. A experiência fez-nos compreender muitíssimo bem até que inferno nos pode levar este espírito coletivo se não for temperado pela consciência e liberdade individual. Seja como for, furar uma greve é para mim um ato grave. Que só a gravidade dos objetivos ou forma dessa greve pode motivar. Nunca faria uma greve contra a contratação de estrangeiros, como chegou a haver em Inglaterra, por exemplo. E nunca faria uma greve que pusesse os meus interesses à frente dos interesses dos restantes trabalhadores, mostrando falta de solidariedade para com eles.

O total isolamento em que o Sindicato dos Pilotos pôs a classe que representa não parece demovê-lo. Por isso, dirijo-me aos pilotos - e não a um sindicato que, do meu ponto de vista, demonstra um total desprezo pelos valores de solidariedade que fundaram o sindicalismo livre.

Sabendo que pouco ou nada posso, junto a minha voz aos que apelam aos pilotos da TAP que não façam uma greve contra os seus colegas e camaradas de empresa. Que, em seu próprio favor, os trata como trabalhadores de segunda, guardando para si próprios uma parte da empresa e deixando todos os restantes de fora, para passarem a ser seus patrões. Apelo aos pilotos da TAP que não façam uma greve que na prática é em defesa da privatização do que é de todos nós.

Esta greve nega a própria razão de ser da greve: a capacidade dos trabalhadores se defenderem de forma solidária. Quem escreve isto não é Pires de Lima, que nunca terá achado legítima qualquer greve que se tenha feito. Este apelo vem de quem nunca furou uma greve na vida. E, de tudo o que vejo, leio e oiço, é partilhado por quase todos os que, neste país, se batem pelos direitos dos trabalhadores, pelo direito à greve e contra o desmantelamento das empresas do Estado.