
Chamem-me o que quiserem
Henrique Monteirohmonteiro@expresso.impresa.pt
Não há imigrantes ilegais!!!
A afirmação é propositadamente provocatória. Há seres humanos ilegais só por estarem fora do espaço em que nasceram e cresceram? E quanto, neste conceito, há de antiquado? A Europa pode continuar a fechar as portas aos milhares de desgraçados e desesperançados que querem vir para cá? É possível – eu há anos que o nego – um polo tão rico como a Europa viver rodeado de miséria, sem se tornar numa atração irresistível? É possível a integração dos que imigram?
Numa entrevista carregada de bom senso (não podia ser de outro modo, tendo em vista quem é) que Umberto Eco concedeu, na última revista do Expresso, a Luciana Leiderfarb, o professor e escritor italiano afirmava, a meu ver muito bem, que o que se passa no mundo não é um fenómeno de imigração, mas de migração. Ou seja, é um fenómeno normal, que se repetiu inúmeras vezes ao longo da História, como ele recorda. A queda do Império Romano, vista pelos romanos e pela vox populi deu-se depois de invasões bárbaras. Mas não houve invasões nenhumas. Apenas gente que migrou por necessidade, nomeadamente necessidades geradas por alterações climáticas. Temos de falar disto, temos de saber o que fazer antes de transformar definitivamente o Mediterrâneo num cemitério.
O problema é, como colocam Renzi, Hollande e Rajoy, europeu. Não se pode deixar que seja a Itália ou a Espanha ou a França a arcar com ele. Mas, ainda que todos os líderes europeus pretendam, como parece, combater esse nojento tráfico de seres humanos que favorece a imigração ilegal para a Europa, nunca travarão a migração. Os que não entrarem pela porta, entrarão pela janela, pelo telhado, por um alçapão. Que fazer?
Do meu ponto de vista, não há nada a fazer senão algo simultaneamente muito simples e muito difícil: deixar entrar quem quer vir. Perguntarão como e eu respondo que não sei bem. Sei que há movimentos que não se podem travar e sei que um ser humano é um ser humano e é tão importante na nossa civilização sendo branco, negro, amarelo ou de outra cor; ou sendo cristão, muçulmano, judeu ou ateu.
Também sei que um pequeno país, num espaço temporal inferior a um ano, albergou cerca de 10 por cento da sua população. Que o fez sem dramas nem violência e que lucrou com essa integração. Esse pequeno país chama-se Portugal e essa integração seguiu-se à descolonização, entre o verão de 1975 e meados de 1976. Se transportarmos a mesma percentagem de 10% para o conjunto da população da União Europeia, atingimos um número que corresponde a 50 milhões de pessoas. Podemos integrar 50 milhões de pessoas? Se calhar, podemos.
Teria de haver regras claras sobre os direitos que teriam e não teriam. Os que vêm do modo que sabemos, arriscando a vida, não vêm buscar direitos, mas fugir do terror, da fome, da seca, da impossibilidade de viver. Poderemos acomodá-los sem ser em campos de concentração, como Lampedusa, que são uma vergonha? Poderemos deixá-los cultivar campos que se desertificam por todo o Continente? Podemos deixá-los criar pequeno comércio, ou trabalhar em profissões que os europeus, na sua maioria recusam? Podemos esperar que eles contribuam para inverter a desgraça demográfica em que a Europa se transformou…
Sei que há os obstáculos dos radicais islâmicos. Mas sei que eles terão tanto mais sucesso quanto mais discriminarmos quem chega. Quando, em nome de um multiculturalismo bacoco desistimos de fazer ver a quem chega as virtualidades do nosso modo de vida; quando recusamos a mobilidade, quando somos racistas – mesmo entre nós, europeus (há quase 50 anos, em Bruxelas, os miúdos que brincavam comigo tinham a certeza de que a minha mãe era femme de ménage ou concièrge, ou seja, mulher-a-dias ou porteira, porque era portuguesa; ficavam muito surpreendidos quando, quem a conhecia, desmentia essa condição).
Como John Lennon escreveu na canção Imagine, podem dizer que sou um sonhador, mas não sou o único. E não nego que esta política de quase abolição de fronteiras tem riscos, pode gerar bagunça, guerras de gangues, cenas violentas. Mas é, a meu ver, o modo de podermos impregnar quem chega com os nossos princípios humanistas e não com o ressentimento contra nós de quem é encafuado num campo, ou perseguido pela falta de papéis e apenas encontra abrigo entre os que os querem explorar ou usá-los como carne para canhão nos seus desígnios loucos e assassinos de radicais extremistas.
Não há, de facto, imigrantes ilegais. Não há seres humanos ilegais. Querer uma vida melhor, sem medo, com a possibilidade de alimentar os filhos, ainda que muito modestamente, não pode ser ilegal.
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Amanhã
FUTEBOL
FC PORTO VS BAYERN MUNIQUE
Esta terça-feira, o FC Porto desloca-se à Alemanha para defrontar o Bayern de Munique, na segunda mão dos quartos-de-final da Liga dos Campeões. Às 19h45, com transmissão na TVI. Os dragões partem em vantagem, dado que venceram a primeira mão, por 3-1.
TEATRO
100 ANOS DE CIRCO
O Theatro Circo, em Braga, comemora esta terça-feira o centésimo aniversário. Durante a manhã, entre as 10 e as 11 horas, é possível visitar a sala de espectáculos, acompanhado por um grupo de atores da companhia. O bilhete custa €1,50. Às 18 horas é inaugurada a exposição O século do Theatro e às 22h00 o músico Rodrigo Leão sobe ao palco para atuar. A exposição é gratuita, já a entrada no concerto custa entre €10 e €20.
ESPETÁCULO
O MENTALISTA REGRESSA A LISBOA
João Blümel apresenta um novo espetáculo de mentalismo, esta terça-feira, na Sala Montepio do Cinema São Jorge, em Lisboa. Intitulado ”Imprevisível”, começa às 21h30 e tem como convidada especial a cantora Sara Tavares. Em 90 minutos, Blümel vai revelar os segredos da mente. Os bilhetes têm o preço único de €12.
MÚSICA E CINEMA
STOP ROCK'N'ROLL
Esta terça-feira começa a primeira edição de Stop Rock'n´Roll, um ciclo de documentários e concertos no Teatro Rivoli, no Porto. O filme “The Rise and Fall of The Clash”, realizado por Danny Garcia, é o primeiro em exibição, com começo marcado para as 21h30. Zé Pedro, guitarrista e fundador dos Xutos e Pontapés, é o curador do Stop Rock'n´Roll e, simultaneamente, o apresentador de todas as sessões destes documentários roqueiros. A entrada diária custa €2,50. O festival dura até dia 24 de abril, sexta-feira. Pode consultar a programação completa AQUI.
(http://teatromunicipaldoporto.pt/).