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Angola: um caso bicudo para o BPI para o bem e para o mal

 FOTO RUI DUARTE SILVA

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BPI diz que está a estudar soluções para acomodar participação no BFA. Nada está decidido mas venda de parte da posição de 50,1% é um dos cenários possíveis

TEXTO ISABEL VICENTE e SÓNIA M. LOURENÇO

As novas regras de exposição dos bancos europeus a países terceiros, grupo onde se inclui Angola, impostas pelo Banco Central Europeu (BCE), colocaram no radar a posição de 50,1% do BPI no Banco de Fomento Angola (BFA). O BPI é maioritário e a exposição do BFA a ao Estado angolano e ao Banco Nacional de Angola é grande e vai pesar nos rácios.

Entre os diversos cenários possíveis para o BPI, liderado por Fernando Ulrich, ultrapassar a situação, estão a venda ou a redução da posição, ou ainda um entendimento com o BCE relativamente à forma de ultrapassar a contabilização da exposição a Angola. A compra do Novo Banco seria uma forma de o BPI ficar maior e, como resultado, diluir a exposição a Angola. Mas o BPI ficou pelo caminho e essa eventual solução foi ultrapassada. Outra alternativa, mais recente, seria a fusão com o BCP, mas também essa foi abandonada, para já, deixando o banco liderado por Fernando Ulrich com um problema bicudo por resolver. Por isso, os analistas têm vindo a apontar nas últimas semanas como provável que o BPI tenha de reduzir a sua participação no BFA.

Em comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), o BPI reitera que “prestará informação ao mercado logo que ocorram desenvolvimentos que o justifiquem”, afastando para já o cenário de venda.

A tomada de posição do BPI surge depois do Jornal de Negócios desta quarta-feira ter avançado que o banco colocou à venda a sua participação no BFA. E este é, efetivamente, um dos cenários possíveis, já falados anteriormente. O dado novo, segundo o Negócios, parece ser a contratação da Goldman Sachs e outra instituição, que está a sondar potenciais interessados na compra da posição do BPI no BFA.

FOTO NUNO FOX

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A Unitel terá direito de preferência se o BPI optar por vender parte ou a totalidade da participação no BFA, por ter 49,9% do banco em Angola

No referido comunicado enviado à CMVM, o banco liderado por Fernando Ulrich esclareceu que “está a estudar soluções para acomodar o limite de exposição a grandes riscos decorrente da exposição do Banco de Fomento Angola ao Estado angolano e ao Banco Nacional de Angola (BNA)”. E, acrescenta que “são possíveis várias soluções, tendo o BPI contratado duas instituições financeiras internacionais para lhe prestar apoio na análise e exploração dessas soluções”. Mais ainda, garante que “até ao momento, o BPI não tomou qualquer decisão quanto à solução a adotar”. Ou seja, sobre vender (ou não) a sua posição no BFA em Angola. Aliás uma das soluções possíveis além de deixar de deter o controlo maioritário do BFA seria reduzir o investimento em dívida pública angolana.

Segundo apurou o Expresso, a Unitel - que tem a empresária angolana, Isabel dos Santos, como acionista de referência- terá direito de preferência se o BPI optar por vender parte ou a totalidade da participação no BFA, por deter 49,9% do banco em Angola. Mas, nada está decidido. Qualquer que seja a solução final, uma coisa é certa, a estratégia do BPI não passaria pela venda, se pudesse optar por outra solução. Trata-se de uma imposição regulatória e, por isso, a solução que vier a ser adotada terá de ser aprovada pelo BCE.

Um problema que se arrasta

O problema já era conhecido. A alteração, em dezembro de 2014, dos ponderadores da exposição a riscos soberanos de Angola, por não ter sido dada equivalência à regulação angolana em relação à europeia, colocou em causa a posição maioritária que o BPI tem no BFA. Como resultado a ponderação exigida pelo BCE em relação à exposição ao Estado angola e ao BNA por parte dos bancos europeus passou de 0% a 20% para 100% para efeitos de rácio de capital. Por causa do elevado peso do BFA no grupo BPI - a que se soma a exposição do BFA ao Estado angolano e ao BNA - a exposição do BPI a Angola está 3 mil milhões de euros acima do limite, apontam os analistas. Um problema que não se coloca noutros bancos portugueses com presença naquele país, porque o peso do mercado angolano em cada um, a nível consolidado, é muito inferior.

Entre os cenários possíveis para resolver a situação junto do BCE, o BPI terá avançado, na altura em que foram conhecidas as novas regras (dezembro de 2014), com a possibilidade de alterar o método de consolidação e deduzir o valor da participação no BFA integralmente no seu rácio de "common equity tier1". E, em comunicado, referiu que se perdesse o total da posição em Angola sofreria um impacto de €400 milhões. Um valor “inferior aos grandes riscos estabelecidos para o BPI em base consolidada”, referiu na altura.

No entanto, a proposta foi recusada e o BPI prosseguiu o estudo de outras alternativas para resolver o problema. O BPI não comenta se estão a negociar outra solução com o BCE.

Certo é que a questão continua por resolver. E os resultados consolidados do BPI no primeiro semestre deste ano mostram bem a dimensão do problema: o BFA representou 87,8% dos lucros totais do BPI, de 76,2 milhões de euros.

É de Angola que têm vindo a esmagadora maioria dos lucros do banco liderado por Fernando Ulrich. O que, em caso de diminuição da participação perdendo a maioria do capital, pode ser posto em causa. Não só porque o BPI passará a consolidar uma fatia menor dos lucros do banco angolano, como porque perdendo a maioria do capital também pode perder o controlo da gestão, que tem sido o segredo do sucesso, apontam vários analistas. Os analistas apontam que a variável chave será quem vier a ficar, num cenário de venda, com a parte da posição do BPI.