Opinião
Ricardo Costarcosta@expresso.impresa.pt
Mortalidade infantil: a única coisa que me interessa no Congresso do MPLA
Paulo Portas foi a Luanda como convidado especial do MPLA? Claro, o seu inusitado discurso quando se despediu da liderança do CDS mostrou bem que nada o faria vacilar na rota Portugal-Luanda. Os partidos com assento parlamentar foram todos, com exceção do Bloco de Esquerda, ao congresso do MPLA? Claro, todos têm relações formais com o partido que domina a política angolana: no caso do PCP desde os velhos tempos dos movimentos independentistas; no do CDS já pela reencarnação capitalista; no PSD porque Bicesse lhe permitiu retirar ao PS o papel charneira; aos socialistas porque sabem que não podem estar mal com Luanda, sobretudo depois de terem publicamente enfraquecido a posição de Isabel dos Santos no BPI.
Há muita coisa para seguir no Congresso do MPLA, em parte um conclave mais relevante para a nossa política do que alguns congressos lusitanos, mais dados ao bocejo e à repetição de banalidades. Afinal este é o congresso da eventual saída de José Eduardo dos Santos, depois das eleições de 2017. A sua saída seria a maior mudança política desde a morte de Agostinho Neto.
Quem lhe pode suceder? Manuel Vicente foi afastado da linha de sucessão, abrindo espaço a uma natural especulação que vai desde ministros bem preparados até algum dos filhos do eterno Presidente. É altamente improvável que o atual Congresso responda a esta questão, mas vamos aguardar até ao fim da reunião. O mais natural é que só a aproximação das eleições venha a mostrar o que quer e pode fazer o Presidente.
Para já vai arrumando a casa, alargando o Comité Central para mais de 350 membros, preferindo manter todos os que estavam. Porque este também é o Congresso da nova normalidade do petróleo. Angola sabe que nunca mais vai ganhar como ganhou nos últimos anos e nem a economia, nem os empresários nem a elite angolana estavam preparados para isso. A maré do ouro negro baixou e baixou para todos.
Naturalmente, quem mais sofreu com a travagem da economia e a escalada da inflação foi a população mais desprotegida, que em Angola assume uma proporção incrivelmente elevada. Em pouco tempo, o país voltou a estar no primeiro lugar da taxa de mortalidade infantil. Primeiro lugar! Excetuando países que, por razões óbvias, não podem ser medidos - Afeganistão, Iraque, Síria e poucos mais - Angola ostenta de novo este triste recorde e com resultados devastadores.
EM POUCO TEMPO, ANGOLA VOLTOU A ESTAR NO PRIMEIRO LUGAR DA TAXA DE MORTALIDADE INFANTIL. PRIMEIRO LUGAR! EXCETUANDO PAÍSES QUE, POR RAZÕES ÓBVIAS, NÃO PODEM SER MEDIDOS - AFEGANISTÃO, IRAQUE, SÍRIA E POUCOS MAIS - ANGOLA OSTENTA DE NOVO ESTE TRISTE RECORDE E COM RESULTADOS DEVASTADORES
A taxa de mortalidade infantil é talvez o indicador mais correto de sucesso de uma país na luta contra a miséria. Muitos países africanos que saíram de guerras, como o Ruanda, ou de crises devastadoras, como a Etiópia, têm bons resultados nesta frente. Outros, menos fustigados por guerras ou desastres naturais, apresentam hoje valores muito razoáveis na mortalidade infantil.
Angola é uma vergonha mundial neste campo. Nos anos de crescimento a dois dígitos - e foram muitos - bastava ter aplicado programas contínuos (absolutamente padronizados e testados) para diminuir brutalmente este flagelo e proteger as gerações futuras.
Qualquer membro do governo angolano sabe como é que isso se faz. Se há assunto que hoje não sofre contestação internacional é a forma de se baixar drasticamente a mortalidade infantil. Com uma percentagem microscópica dos ganhos do petróleo, Angola podia saltar em muito poucos anos para níveis aceitáveis neste campo. Basta bons programas de saúde materna, neonatal, vacinação, esgotos, alimentação básica e pouco mais. E fazer isso sem desviar dinheiro e de forma permanente.
Essa seria a grande prenda que José Eduardo dos Santos podia dar aos seus concidadãos: atacar o desenvolvimento pela base, por aquilo que pode melhorar a vida a uma das nações do mundo com demografia mais jovem. Se o fizesse podia, aí sim, sair em paz e com um país mudado.
Não sei se as delegações portuguesas que voaram para Luanda conhecem os números da mortalidade infantil angolana. Mas deviam ir aos iPhones e perder uns minutos a ver esses gráficos. Não comparem com a Suécia ou a Noruega (ou mesmo Portugal), cruzem com a Namíbia, o Botswana, o Ruanda, etc. Vão corar de vergonha. É que a corrupção embaraça, mas isto dá mesmo a volta ao estômago.
ALTOS
Sigmar Gabriel
Vice-chanceler alemão
Vindo de um estadista, o gesto é, digamos, muito pouco elegante, para dizer o mínimo (e muitos políticos já se tramaram por menos), mas no caso em apreço tem uma carga positiva: alvo dos impropérios, numa iniciativa eleitoral, de um grupo de neonazis, que o consideram um “traidor da raça” (ao contrário do pai, louvado por ter sido um simpatizante nazi), o vice de Angela Merkel reagiu sorrindo e fazendo aquele gesto que consiste em esticar um dedo e encolher os dedos adjacentes. Sigmar ainda convidou os contestatários para um debate político consigo, desde que tirassem as máscaras que lhes tapavam a cara, mas eles não quiseram.
Boris Johnson
Ministro britânico dos Negócios Estrangeiros
Será efémero, mas o chefe da diplomacia britânica vai ter um poder que nunca teve: como a primeira-ministra, Theresa May, vai de férias, e o seu substituto hierárquico, o ministro da Economia, Philip Hammond, também resolveu tirá-las, o polémico político, conhecido pela sua irreverência e alguma falta de tacto diplomático, fica a mandar durante uma semana no Reino Unido.
BAIXOS
Hélder Amaral
Deputado do CDS
O parlamentar centrista está em Luanda a assistir ao congresso do MPLA, para o qual o seu partido foi convidado pela primeira vez ao mais alto nível (Paulo Portas também lá está). Mas, convenhamos, não precisava de ser tão efusivo: “A nossa presidente é angolana, nasceu em Luanda, eu também”; “foi-nos feito um convite e nós viemos a correr”; “Angola está num momento de viragem e o desenvolvimento é grande”: “no CDS, nós temos todos relações com o MPLA”
António Domingues
Presidente da Caixa Geral de Depósitos
O novo responsável do banco do Estado ainda não se sentou no lugar e já sofreu os primeiros reveses. Se a recusa do Banco Central Europeu (BCE) em aceitar tantos administradores (19) já era pública e esperada, outros aspetos nem tanto. Domingues só pode acumular a presidência do conselho de administração com o da comissão executiva durante seis meses e dos seus sete administradores executivos aceites pelo BCE, três têm de ir frequentar o curso de Gestão Bancária Estratégica do prestigiado INSEAD, em Paris.
José Cardoso