CRESCIMENTO

Portugal, a economia mais rápida da moeda única

ACELERAÇÃO As exportações, com uma ajuda do consumo, foram um dos segredos para o andamento do PIB entre julho e setembro. Ministro das Finanças tem razões para sorrir

ACELERAÇÃO As exportações, com uma ajuda do consumo, foram um dos segredos para o andamento do PIB entre julho e setembro. Ministro das Finanças tem razões para sorrir

Economia acelera no terceiro trimestre e consegue o crescimento em cadeia maior da zona euro. O PIB cresceu 0,8% em cadeia e 1,6% em termos homólogos. Meta do Governo de 1,2% para final do ano mais perto de ser ultrapassada

TEXTO JOÃO SILVESTRE

No futebol há jogadores e treinadores que passam de “bestiais a bestas” em instantes. Nos indicadores económicos o ritmo não é tão frenético mas nem por isso as opiniões não deixam de ser (bastante) voláteis. Há poucos dias, no debate do Orçamento, ainda se discutia porque é que a economia não crescia – acusava a Oposição – e as razões do alegado falhanço do modelo do Governo. O ministro das Finanças tentava contrapor mas os números não ajudavam muito: a economia desacelerou em termos homólogos deste o terceiro trimestre do ano passado e, no ritmo trimestral, tem oscilado entre 0,2% e 0,3% na primeira metade do ano. Pior, tem havido sucessivas revisões em baixa das projeções para conjunto do ano, incluindo o governo que, no Orçamento do Estado para 2017, cortou a estimativa de 1,8% para 1,2%.

Mas eis que surgem os dados do INE para o terceiro trimestre, hoje divulgados, que vem baralhar novamente as contas. A economia acelerou – em cadeia e em variação homóloga – e até se destacou entre os seus pares da zona euro. E mais: volta ser possível e até provável que o PIB possa bater a fasquia dos 1,2% inscritos pelo governo no Orçamento e, para isso, basta ficar ‘quieto’.

Maior crescimento trimestral desde 2013

Nada como olhar para os números em pormenor. O PIB teve um crescimento trimestral de 0,8%, o maior desde 2013 e que bateu toda a concorrência na União Europeia (apenas a Bulgária, fora da zona euro, conseguiu igual valor). Na comparação com o terceiro trimestre de 2015, o crescimento foi de 1,6% que representa uma aceleração face aos trimestres anteriores e que faz deste trimestre o melhor em mais de um ano. Aqui, no entanto, a comparação europeia não é tão favorável e há vários exemplos de crescimento a ritmos mais fortes.

Estes três meses não só representam uma recuperação face ao ritmo da primeira metade do ano – quando o PIB cresceu duas vezes 0,9% em termos homólogos e, respetivamente, 0,2% e 0,3% em cadeia – como abre boas perspetivas para a meta final de 2016. Basta que o PIB no quarto trimestre seja idêntico ao do terceiro – qualquer coisa como 43,5 mil milhões de euros a preços de 2011 – para que o crescimento de 1,2% estimado pelo governo para o final do ano seja atingido. Neste cenário, o PIB teria um crescimento homólogo de 1,3% e em cadeia nulo.

Crescimento de 0,2% permitia ultrapassar meta do Governo

Mas, olhando para os últimos anos, os últimos três meses do ano tendem a ter uma ligeira aceleração. Pelas contas do Expresso, pode bastar um crescimento em cadeia na ordem dos 0,2% - qualquer coisa a rondar 90 milhões de euros, para que seja atingida a fasquia dos 1,3%. O que já ultrapassaria a meta do governo.

Em reação a estes números, o ministério das Finanças não fez qualquer referência a uma eventual revisão da sua projeção de crescimento do PIB este ano. Mas sublinhou que a “ incorporação destes dados nas previsões para a economia portuguesa implicará uma revisão em alta dos últimos números divulgados por várias instituições”. Recorde-se que a generalidade das instituições está mais pessimista que o governo português. Na semana passada, por exemplo, a Comissão Europeia apontou para 0,9%. Um valor que, para ser atingido, implicaria uma queda em cadeia de 1% nos últimos três meses do ano, algo que, nas últimas duas décadas (desde 1995), apenas aconteceu no auge da Grande Recessão (2009) e durante os anos de recessão da intervenção da troika (2011 e 2012).

A estimativa rápida do INE não revela o desempenho das várias componentes do PIB. Isso só acontecerá quando forem publicadas as contas nacionais trimestrais no dia 30 de novembro. Nessa altura, ficaremos também a saber se se confirmam estes números – o INE pode corrigir ligeiramente as estimativas (não mais do que uma décima normalmente – e também ficar a conhecer mais detalhes sobre o andamento da economia nestes três meses.

Por agora, o INE apenas refere, em termos genéricos, que o “crescimento mais intenso do PIB refletiu principalmente o aumento do contributo da procura externa líquida, verificando-se uma aceleração mais expressiva das Exportações de Bens e Serviços em comparação com a das Importações de Bens e Serviços”. No caso das exportações, acrescenta a nota do INE, “a aceleração das exportações foi comum às componentes de bens e de serviços”. Já “o contributo da procura interna para a variação homóloga do PIB também aumentou no 3º trimestre, em resultado da aceleração do consumo privado devido ao comportamento da componente de bens não duradouros e serviços, enquanto a componente de bens duradouros desacelerou”. Já na comparação com o trimestre anterior, “o contributo da procura externa líquida foi positivo, refletindo o forte aumento das Exportações de Bens e Serviços, enquanto a procura interna registou um contributo negativo”.

Para o governo, estes números são naturalmente motivo de satisfação. “Ainda que constituindo excelentes notícias para todos os agentes económicos, estes dados não surpreendem”, uma vez que os “indicadores de confiança, coincidentes e avançados de várias instituições já faziam prever uma aceleração da atividade económica”, referiu o ministério das Finanças em comunicado reagindo aos dados publicados pelo INE.

PARTIDOS

Elogios, pressão e dúvidas: as reações políticas

PSD Luís Montenegro FOTO ALBERTO FRIAS

PSD Luís Montenegro FOTO ALBERTO FRIAS

Os dados divulgados pelo INE esta terça-feira despertam elogios do PS, PCP e BE. PSD diz que é “boa notícia”, mas que mesmo assim Portugal vai chegar ao final do ano com um “pior desempenho" do que em 2015. “Isso é indiscutível”, frisam os sociais-democratas

TEXTO RAQUEL ALBUQUERQUE

Há um consenso em relação aos números do crescimento da economia divulgados pelo INE: são “uma boa notícia”. Contudo, se para uns o crescimento do PIB é a prova “clara” de que a economia está a recuperar, para outros é preciso esperar para ver o que ainda irá acontecer até ao final do ano.

“Há uma boa notícia para o país, que de alguma forma surpreende todos aqueles que perspetivavam nas últimas semanas um crescimento inferior”, admitiu Luís Montenegro, líder da bancada do PSD. Contudo, o deputado sublinha a necessidade de confirmar se “há uma base que possa sustentar um caminho duradouro de crescimento económico superior à previsão do próprio governo em sede de Orçamento do Estado, quer para 2016 quer para 2017”.

“É melhor termos uma boa notícia que uma má notícia, e isso gostaríamos de assinalar. Em todo o caso, não é razão para embandeirar em arco e pensar que a nossa economia está a dar uma resposta que nos possa colocar acima da margem que pode sustentar no futuro mais crescimento.” Luís Montenegro frisa ainda que Portugal vai chegar “ao final do ano de 2016 com um pior desempenho” do que em 2015. “E isso é indiscutível.”

Também Marcelo Rebelo de Sousa sublinha a necessidade de se esperar para ver se o crescimento se mantém. “Eu tinha dito há uns tempos que havia razões para esperar uma boa execução orçamental e porventura sinais em matéria de economia. Vamos ver é se se mantém até ao fim do ano", afirmou esta manhã.

Os elogios e a “cautela”

Do lado do PS, os números são vistos como “extremamente positivos”. O porta-voz dos socialistas, João Galamba, sublinha que este terceiro trimestre é “o melhor dos últimos 11” e que o crescimento em cadeia “é o mais elevado de toda a zona euro”. “Desmentem todos aqueles que insistiam em falar de uma estratégia de falhanço do Governo e das políticas implementadas. É uma trajetória que tem de ser continuada e reforçada”, disse João Galamba à Lusa.

O cenário traçado hoje, salienta Galamba, “vem confirmar que a economia, depois de uma forte desaceleração em 2015, começou a recuperar em 2016. Há uma subida do emprego e tudo indica que atingiremos o défice mais baixo da democracia portuguesa.” O porta-voz do PS lembrou ainda que a aposta dos socialistas sempre foi na devolução de rendimentos.

Os parceiros de esquerda aproveitam para pôr pressão no Governo. O PCP vê no crescimento do PIB uma “clara e efetiva” melhoria da atividade económica. “O que sobressai [destes dados] é o aumento do consumo privado que não pode ser dissociado da reposição de rendimentos e trabalho e por isso se demonstra que a valorização dos salários e rendimentos é um bem para a economia e não um mal”, considerou Jerónimo de Sousa.

“É já o reflexo das medidas de recuperação de rendimentos implementadas no último ano, após a derrota do Governo PSD/CDS e da sua política”, afirmou também o deputado comunista Paulo Sá, defendendo que por trás está o aumento do consumo privado, um reflexo da melhoria das condições de vida dos trabalhadores.

Mas poderia ser um crescimento ainda maior, acrescenta. “Se esta política de recuperação de direitos e rendimentos fosse mais longe, também estes números do PIB poderiam ser mais expressivos e significativos, tal como o crescimento do emprego. Reafirmamos a necessidade de prosseguir e aprofundar esta política, mas para isso é necessário romper com os constrangimentos externos, nomeadamente as imposições da União Europeia e da dívida”, defendeu.

Já o Bloco de Esquerda diz que vai analisar com “cautela” e “cuidado” os números do INE. “O BE entende que, quer na política de distribuição de rendimentos, quer na política de investimento público, se estas políticas forem mais longe no futuro, será possível obter dados de crescimento económico muito mais consistentes”, afirmou Mariana Mortágua, vincando ser necessário olhar para a “estratégia a longo prazo da economia”.

Para uma efetiva melhoria dos dados económicos, defendeu Mortágua, é necessário “lidar de frente e com coragem com o problema da dívida pública”.

Para o ministro da Economia, nestes números está a retoma da economia. “Isto demonstra a solidez da retoma da economia portuguesa e a capacidade de resposta das empresas portuguesas à crise dos mercados internacionais, encontrando outros mercados e crescendo no mercado europeu e reforçando a sua capacidade de exportação”, disse Caldeira Cabral.

Questionado sobre se o valor do terceiro trimestre pode fazer o executivo rever em alta a previsão de 1,2% para o conjunto do ano, Caldeira Cabral respondeu: “É preciso ver como vai ser o crescimento no último trimestre, mas é óbvio que este crescimento reforça a convicção de que o número indicado de 1,2% vai ser atingido ou poderá ser até superado”.