GOVERNO

TSU volta ao Conselho de Ministros

 FOTO ALBERTO FRIAS

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Passos vai inscrever no Plano Nacional de Reformas a hipótese de redução da TSU para as empresas. O CDS concorda, com reticências. Os partidos da coligação temem o impacto da sigla maldita

TEXTO FILIPE SANTOS COSTA, LUÍSA MEIRELES e ÂNGELA SILVA

Pedro Passos Coelho insiste na redução da taxa social única (TSU) suportada pelas empresas, como forma de baixar os custos do trabalho e incentivar a criação de emprego. O primeiro-ministro quer inscrever esse objectivo no Programa Nacional de Reformas que o Governo terá de apresentar este mês em Bruxelas, e já discutiu a questão com Paulo Portas. O líder do CDS não se opõe à ideia, embora haja no seu partido quem tema que o regresso da sigla maldita possa ter um impacto político negativo em ano eleitoral.

Segundo o Expresso apurou, o propósito de Passos é claro e as negociações com o CDS estão bem encaminhadas. Como desta vez, ao contrário do que aconteceu em 2012, o alívio da TSU para os patrões não é compensado por um agravamento da taxa para os trabalhadores, os centristas deixaram de ter argumentos para contestar a ideia. Mas têm muitas reservas politicas. O regresso das três letras que fizeram a coligação tremer em 2012 está a provocar um nervoso miudinho. Recuperar a TSU em ano eleitoral é ”um erro crasso”, desabafa um dirigente centrista.

No PSD a ideia também é olhada com desconfiança, tendo em conta a proximidade de eleições.Os receios apontados são dois: por um lado, o facto de a sigla TSU estar conotada com tempos de má memória; por outro, a incoerência de discurso que poderá advir de se retirar contribuições para a Segurança Social quando é o próprio Governo que diz que a sustentabilidade da mesma está longe de garantida.

Passos Coelho parece disposto a não se deixar tolher por nenhuma destas objecções. A proposta agora feita é diferente da de 2012, e sobre a sustentabilidade da Segurança Social, São Bento argumenta que todas as medidas que ajudem a dinamizar a economia e a criar emprego só podem, a prazo, ajudar a sustentar o sistema.

Apesar da vontade, a redução da TSU para as empresas deverá ser incluída no PNR que deverá ser aprovado esta quinta-feira no Conselho de Ministros, mas apenas de forma indicativa, como uma possibilidade a explorar a partir de 2016.

Redução de impostos no Plano de Estabilidade

Em simultâneo, esta semana deverá ser aprovado também o Plano de Estabilidade, que tem de seguir igualmente para Bruxelas este mês. Nesse documento, deverá ficar o reverso da medalha: se as boas notícias para os patrões sobre a TSU vão no Programa de Reformas, as eventuais boas notícias para os trabalhadores deverão ficar no Plano de Estabilidade, onde deverá ficar inscrito o propósito de desagravar impostos. O documento não será explícito sobre onde e como se concretizará esse alívio, mas tanto no PSD como no CDS há a intenção de aliviar o IRS e continuar a redução das taxas de IRC.

Acabar com a sobretaxa e continuar a cortar no IRC foram as duas prioridades fiscais assumidas pelo CDS na semana passada, na apresentação dos objectivos para a próxima legislatura. O que permite aos centristas alguma demarcação face à ideia avançada por Passos Coelho para a TSU. Por outro lado, o caderno de encargos do CDS também puxa para cima a urgência do combate ao desemprego – e o alívio da parte da TSU que cabe aos patrões será apresentado com esse objectivo.

Baixar a carga fiscal é um objetivo também assumido por Passos Coelho no programa eleitoral que começou a preparar no partido. Rogério Gomes, o homem que Passos encarregou, à frente do Gabinete de Estudos do PSD, de coordenar a preparação do programa, assume que os sociais-democratas vão ''propor um contrato fiscal com a população'', no sentido de começar a desagravar o colossal aumento de impostos da era Gaspar. Sem querer entrar em pormenores sobre quais os impostos a desagravar, Rogério Gomes assume que ''se o maior problema é o desemprego, o desagravamento fiscal tem de começar obviamentre pelo lado dos impostos que podem ajudar a criar emprego''. Ou seja, pelo IRC e, pelo que o próprio primeiro-ministro assumiu na semana passada, pelos impostos sobre o trabalho.

Reduzir TSU sem sobrecarregar trabalhadores nem penalizar o défice

Foi o próprio primeiro-ministro quem apontou essa como a reforma que ficou por fazer nesta legislatura, afirmando que a quer concretizar nos próximos anos, com o apoio da União Europeia. "Hoje que o custo do trabalho para as empresas ainda é muito elevado", disse Passos, na quinta-feira passada, numa conferência promovida pela AICEP. "Essa foi talvez a única importante reforma que não conseguimos completar neste domínio fiscal durante estes quatro anos. Mas será um objetivo seguramente importante para cumprir nos próximos anos", assegurou.

"Nós temos de conseguir ser mais atrativos para o investimento, não apenas no que respeita à fiscalidade sobre o rendimento das empresas, mas também no que respeita ao custo do trabalho para as empresas. E estou convencido de que conseguiremos com a União Europeia concretizar esta reforma nos próximos anos, de modo a atrair mais empregabilidade, por atrairmos mais investimento também", disse o primeiro-ministro, sem avançar detalhes sobre como pretende fazer essa redução.

O plano de Passos é fazer uma redução gradual da parte da TSU que é suportada pelas empresas, para ir acomodando em vários anos o impacto dessa perda de receita. Mas ela existe e precisa de ser autorizada por Bruxelas. Essa é a parte essencial do plano: as regras europeias permitem aos países que não estejam em défice excessivo desvios em relação às metas do défice quando estejam em causa reformas estruturais. Nesse caso, a perda de receita não é contabilizada para o cálculo do cumprimento das metas europeias. É essa hipótese que Passos quer aproveitar a partir de 2016, quando o país previsivelmente já não estará em défice excessivo.

O facto das mexidas na TSU implicarem uma autorização de Bruxelas para que o seu impacto orçamental não seja tido em conta no cumprimento do défice permite também à coligação responder a outras das críticas que esta medida irá levantar. António Costa já a colocou: será justo reduzir a TSU antes de se reporem os escalões do IRS ou de repor os apoios sociais que foram cortados? “Não se coloca essa escolha”, explica fonte governamental. O alívio de impostos tem de ter almofada orçamental, para não aumentar o défice; a TSU seria uma questão à parte que não conta para o cumprimento do défice.

 FOTO PAULO ALEXANDRINO

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Bagão contra a "obsessão da TSU"

"Uma tentativa obsessiva de lançar o debate sobre a TSU", assim comenta Bagão Félix a proposta feita pelo Primeiro-ministro de reduzir os custos laborais pela via da diminuição da TSU patronal.

Segundo o economista, "Passos Coelho fala e bem da necessidade de reduzir os custos laborais, mas há várias maneiras de o fazer e não apenas a fiscal".

Bagão Félix adianta que em três anos (2010, 2011 e 2012) os custos unitários de trabalho já desceram efetivamente 6,1%, devido à estagnação ou diminuição dos salários, nomeadamente pela via da entrada no mercado de trabalho. Curiosamente, representa na prática a mesma redução salarial que o Governo se propunha obter com o aumento em 7% da TSU dos trabalhadores em 2012 (de 11 para 18%).

A questão da redução da TSU centra-se fundamentalmente no tipo de contrapartidas, segundo o conselheiro de Estado. Contas redondas, a baixa em 1% da TSU é de cerca de €300 milhões, pelo que uma baixa de 3% da TSU equivale aproximadamente a aumentar o IVA em 2%. "Isto, para manter a receita ao mesmo nível", sublinha.

Para o antigo ministro das Finanças, há fundamentalmente quatro contrapartidas que podem substituir a receita perdida numa baixa da TSU: o aumento da TSU dos trabalhadores (tal foi proposto em 2012); o aumento do IVA, que Bagão Félix considera incomportável, porque significaria aumentá-lo de 23 para 25%; o aumento de outros impostos ("quais?", indaga); e, finalmente, uma não compensação e um aumento do défice nessa proporção, "eventualmente a opção mais defensável", diz.

Mas o conselheiro de Estado considera "estranho" que Passos Coelho tenha abordado um tema tão polémico no contexto das medidas para o próximo ano, quando eventualmente poderá já nem ser ele o chefe de Governo.

"Porque não o faz como presidente do PSD, com a liberdade de propor o que entender?", questiona Bagão Félix, para quem tal atitude neste momento tem o efeito de "espicaçar o parceiro de coligação, num momento em que se está a discutir e sabendo para mais como este é um ponto de clivagem com o CDS".