Bernardo Ferrão

Andamos nisto

Bernardo Ferrão

Isto é entre Costa e Centeno! E Rui Rio?

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Há gritos e aplausos. Uns apoiam outros apupam. Feche o plano! Dois homens medem forças. Há um braço de ferro. Suado. Centeno traz tatuado “défice zero”. No de Costa sobressai: “maioria absoluta 2019”. Quem ganha? O ministro parece levar vantagem. Mas o adversário é um hábil jogador de última hora. Fique para ver!

Vivemos numa espécie de carrossel. Ano após ano a mesma hipocrisia. A indignação do BE, o regateio de medidas que lhes sirvam de bandeira eleitoral, as ousadias orçamentais de Mário Centeno. É tudo relativo, daqui a meses já ninguém se lembra, como bem disse Marcelo. Afinal os que alimentam a encenação fazem parte dela. Carimbam as contas que contestam. Acabarão por enfiar a viola no saco? A crise antecipada só traria vantagens a António Costa. Não há melhor narrativa de vitimização. Mais: o Bloco não deve esquecer que perdeu metade dos deputados em 2011 depois daquela coligação negativa que derrubou José Sócrates e fez eleger Passos Coelho.

Surpreendem-me também os zunzuns que chegam do PS e do conselho de ministros. Há um claro desconforto com o “centenismo”. Ele foi longe demais. Não era preciso tanto. Dispensamos brilharetes. Curiosos comentários de quem há poucos meses aplaudia entusiasmado a eleição do presidente do Eurogrupo e que, tempos antes, celebrava à tripa-forra a saída de Portugal do procedimento por défices excessivos. Estavam à espera de quê? Era óbvio que Centeno teria de ser mais papista que o Papa – até porque também tem uma agenda pessoal. O presidente do Eurogrupo iria sempre dar o exemplo, mesmo sendo ministro de um Governo com normais tentações eleitorais e apoiado por esquerdas que só reclamam aumentos.

Chegamos a António Costa. Centeno cumpre para o primeiro-ministro uma espécie de dupla função: é um saco de boxe e um seguro de vida. No primeiro caso porque é nele que recaem os protestos e o odioso com a austeridade que ultrapassa todas as metas, mas é também ele que garante o trunfo que permite a António Costa apresentar-se como líder de um PS diferente – terceira via? O PS de Costa tirou à direita a bandeira das contas certas e apaga o PS da bancarrota de José Sócrates – em 2019 pode finalmente ser marcado o julgamento. Imagine-se! Por este caminho Centeno arrisca mesmo bater a marca de Salazar.

Mas era preciso tanto aperto? O caminho orçamental não podia ter sido mais brando como defende Paulo Trigo Pereira? A verdade é que o garrote de Centeno não traz só linhas vermelhas para as esquerdas, também obriga o PS e António Costa a redefinirem-se. O The Economist escreve que este é um Governo de esquerda que não governa à esquerda. O diabo está lá dentro? Esse é um dos riscos: Centeno tapa o discurso de Rui Rio mas dá o flanco às esquerdas. Ir além das metas tem custos que serão sempre imputados ao Governo e todos os dias ouvimos falar deles. Na Saúde, na Escola Pública, na Proteção Civil…

Com as finanças a tomaram conta da política, a ação de António Costa ganha um novo rumo até às eleições. Centeno virou o jogo e fez questão de o exibir nos palcos internacionais. Costa terá de chegar à maioria absoluta pela via apertada das finanças, sem aumentos para a função pública ou outras benesses eleitoralistas. Se não chegar lá, e dando por certo que não haverá uma reedição da “Geringonça”, Costa pode virar-se para o outro lado. A política e os resultados de Centeno podem facilitar a aproximação do PSD, como quem diz, se Rio não os pode vencer, junta-se a eles.