Ricardo Costa

Opinião

Ricardo Costa

Há problemas de Lisboa que são de todo o país?

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Sim, há mesmo problemas que são de Lisboa e são de todo o país. Ou para ser mais correto, há problemas específicos de Lisboa e do Porto que podem justificar apoios do Orçamento do Estado, feito com as contribuições de todos os portugueses. Só escrevo isto porque faz muito pouco sentido discutir um tema como os dos transportes das duas áreas metropolitanas de Portugal a partir de uma perspetiva geográfica.

Um Orçamento do Estado tem que estabelecer prioridades, traçar objetivos e alocar recursos. Deve ter em conta os imensos problemas que existem no país, as suas urgências e optar pelas medidas com maior capacidade estrutural de transformar o território. E isso deve ser feito para problemas do interior, de cidades médias ou pequenas, da faixa litoral ou, pasme-se, das duas áreas metropolitanas.

Eu percebo a fúria de alguns autarcas de cidades grandes ou médias, a braços com imensos problemas, e com pouca ou nenhuma vontade de "subsidiarem" passes sociais no grande Porto ou na Grande Lisboa. Mas, por mais estranho que lhes pareça, o principio orçamental é exatamente o mesmo que leva o Orçamento a gastar dinheiro em vias de comunicação do zonas pouco habitadas ou melhorar infraestruturas degradadas em locais longe das duas maiores cidades do país.

O problema dos transportes nas duas maiores cidades, sobretudo em Lisboa onde são péssimos, não é novo. O número de carros tem aumentado e o de passageiros tem diminuído. Até aqui nada de novo, mas as questões ambientais, o ordenamento do estacionamento e, finalmente, o preço da habitação, aceleraram uma necessidade muito antiga: as áreas metropolitanas têm que ter redes de transportes integradas, com passes e bilhetes compatíveis e preços razoáveis. Têm que ter um serviço decente, coisa que até acontece nalguns casos no Porto, mas que em Lisboa não se vislumbra.

Este problema é nacional. mas não por uma questão de centralismo. É nacional porque afeta centenas de milhar de habitantes. Só em Lisboa entram 370 mil carros por dia. No Porto, os problemas são parecidos, embora com várias nuances.

Um problema que afeta tanta gente é um problema nacional. Da mesma forma que o serviço ridículo da CP na linha do Oeste é um problema nacional ou a falta de médicos no litoral é um problema nacional. As absurdas composições com que a CP circula no Algarve são uma vergonha nacional, como uma escola a cair na Guarda é um problema nacional.

Mais grave, o problema dos transportes nas grandes cidades afeta muitas das pessoas mais necessitadas do país, com níveis de rendimento muito baixo, distâncias enormes entre o local de residência e o trabalho, horários impróprios e tempos de ligação absurdos. Existem casos semelhantes em todos país? Claro que sim. Mas com esta escala e este impacto social não.

É por isso que este é um problema nacional, não fazendo qualquer sentido usar o argumento de que as pessoas de, por exemplo, Mirandela vão subsidiar o passe dos meninos de Cascais. Não, as pessoas de Mirandela vão subsidiar o passe de milhares e milhares de pessoas, como estas subsidiam umas quantas coisas em Mirandela, e ainda bem que assim é.