REFORMAS
Descongelamento de pensões vale ‘aumento’ de 5%, mas não chega para voltar a 2010
FOTO GONÇALO ROSA DA SILVA
O regresso das atualizações das pensões estanca a perda de poder de compra. Mas não chega para recuperar o valor perdido nos últimos anos. Ficam a faltar ainda cerca de 8% e, mesmo assim, pode custar várias centenas de milhões de euros
TEXTO JOÃO SILVESTRE
Um acordo à esquerda, a confirmar-se, poderá representar um ‘aumento’ a rondar 5% nas pensões de reforma. Não há detalhes nem documentos assinados mas, segundo a entrevista de ontem da coordenadora do Bloco de Esquerda ao Diário de Notícias, haverá já acordo para descongelar as pensões. “Ao longo da legislatura isso irá acontecer com todas e em 2016 com as mais baixas”, garantiu Catarina Martins assegurando ainda que as mais baixas terão mesmo aumentos reais (acima de inflação).
Se todas as pensões forem aumentadas à taxa de inflação, entre 2017 e 2019, isso representará um ganho de 4,6% face ao cenário de partida – o que está no programa do PS e que apenas aumenta pensões mínimas – em que não quaisquer atualizações.
Recorde-se que, para as pensões acima de 1500 euros, não há aumentos desde 2010, quando começou a austeridade com a sucessão de Programas de Estabilidade e Crescimento (PEC). Nesse ano, houve aumentos de 1,25% para reformas até 629 euros e de 1% para valores entre 629 euros e 1500 euros que não foram, em qualquer caso, suficientes para compensar a inflação de 1,4%.
Com exceção das pensões mínimas, os pensionistas têm perdido consecutivamente poder de compra nos últimos anos. Têm, aliás, estado na linha da frente de muitas das medidas de austeridade. Além do congelamento das atualizações – que na Segurança Social têm uma regra prevista na lei com base no PIB e na inflação mas que foi suspensa – que dura há vários anos, foram também alvo de medidas como suspensão de subsídios de férias e Natal e a contribuição extraordinária de solidariedade (CES) que atualmente apenas vigora para as pensões mais elevadas.
Poder de compra longe de regressar a 2009
O descongelamento das pensões a partir de 2017, mesmo que apenas ao nível da inflação, impede que a perda de poder de compra continue mas não chega para recuperar o que já foi perdido. Isso apenas seria possível com aumentos reais que não estão em cima da mesa para a generalidade das pensões, como sublinhou Catarina Martins.
Este ano, as pensões acima de 1500 euros estão 8,5% abaixo do nível do nível de 2009. Sem o descongelamento, a queda continua e pode atingir 13,1% até 2019, se as previsões do PS (para o deflator do consumo privado, que é uma medida de inflação) se concretizarem. É uma descida que, a concretizar-se, corresponde a 262 euros brutos num salário nominal de 2000 euros mensais. O fim do descongelamento vale 100 euros por mês, dentro de quatro anos, face ao cenário de congelamento.
Já as reformas entre 629 e 1500 euros estão a perder 7,7% este ano e a queda pode atingir 12,3%. No caso de uma pensão de 1000 euros, como teve aumento em 2010, pode perder até 12,3% que são, em qualquer caso, 123 euros brutos mensais. O descongelamento representa um ganho de 50 euros.
O PS quer acelerar a eliminação de algumas medidas de austeridade, como a sobretaxa de IRS ou os cortes salariais, mas no seu programa conta com o congelamento de pensões até 2019. É uma poupança prevista de 250 milhões de euros em 2016 e o valor vai subindo até 525 milhões anuais em 2018 e 2019 (ver gráfico).
A margem para o PS acomodar medidas exigidas pela CDU e pelo Bloco de Esquerda em 2016 é bastante reduzida já que o défice previsto no cenário macroeconómico socialista é já de 3%. Algumas das medidas que têm sido noticiadas como podendo fazer parte do acordo à esquerda, como a mais rápida devolução dos salários, poderão ser compensadas pela não descida da taxa social única como está previsto no programa do PS.