INOVAÇÃO

Ronaldo e clínica de transplantes capilares criam grupo internacional

Paulo Ramos, presidente executivo da Saúde Viável, e Carlos Portinha, o coordenador clínico, criaram com Ronaldo uma empresa global de transplante capilar <span class="creditofoto">FOTO Rui Duarte Silva</span>

Paulo Ramos, presidente executivo da Saúde Viável, e Carlos Portinha, o coordenador clínico, criaram com Ronaldo uma empresa global de transplante capilar FOTO Rui Duarte Silva

Saúde Viável dá o salto para Espanha com CR7. É só o princípio: os líderes portugueses querem ser líderes mundiais. Vão abrir em mais países e investir €25 milhões em investigação

Maria João Bourbon

Ao entrar na sala de transplantes, a cabeça salta logo à vista. O homem está deitado na maca, o corpo virado para baixo, a cara escondida. Desenhadas na cabeça, linhas azuis delimitam a área dadora (a zona mais densa do couro cabeludo, na qual se extrai o cabelo que vai abastecer a zona calva), que agora pouco mais é do que um conjunto de pontos avermelhados de sangue que, dentro de alguns dias, acabarão por sarar. Duas técnicas de saúde concentram-se nessa cabeça: com um instrumento de extração, tiram uma a uma as unidades foliculares (conjunto de um ou mais folículos com a glândula sebácea e o músculo eretor do pelo), analisadas e selecionadas ao microscópio, na mesa ao lado, por outras especialistas.

O que aquele doente está a viver não é estranho para Paulo Ramos. Não por ser presidente executivo da clínica onde aquele procedimento tem lugar, mas porque ele próprio passou pelo mesmo. “Sofri muito com a alopécia”, reconhece ao Expresso. “Quando estava na faculdade, aos 19 ou 20 anos, começou a cair-me muito cabelo, o que afetou a minha autoestima.” Chegado ao mundo do trabalho, os seus primeiros ordenados eram canalizados para tratamentos que não funcionavam. Tanto pesquisou e investigou que esbarrou nos transplantes capilares. Resolveu dedicar-se a essa nova área que pouco tinha a ver com a sua formação em economia e gestão. Da necessidade nasceu a investigação — e cresceu um negócio.

Em 2009, Paulo Ramos criou a Saúde Viável, rede médica especializada no diagnóstico, tratamento e investigação em saúde e transplante de cabelo, sobrancelhas e barba, que abriu em Lisboa e posteriormente no Porto, onde está agora a sede.

Ronaldo em campo

Atualmente, a empresa portuguesa realiza três mil transplantes por ano, o que aponta para uma faturação já nas dezenas de milhões por ano, tem duas clínicas no Porto (onde vai abrir uma terceira), uma em Lisboa e outra em Vilamoura. Mas o crescimento passa pela internacionalização: a 18 de março abrirá uma clínica no centro de Madrid com 2500m2, capacidade para 18 transplantes por dia e 150 profissionais, quase tantos como os 160 que existem em Portugal. Espanha é o segundo país do mundo com maior incidência de calvície.

Para gerir os seus projetos internacionais, a Saúde Viável aliou-se a Cristiano Ronaldo e criou a Insparya, empresa em que o futebolista português tem 50%. De onde vem o interesse do melhor do mundo? “Não só a mãe dele fez um transplante de sobrancelhas connosco, como muitos dos seus colegas de profissão fizeram transplantes capilares. Ele viu os resultados e ficou impressionado”, explica o presidente executivo. Para a empresa portuguesa, ter o jogador em campo (simultaneamente acionista e embaixador da empresa) é uma oportunidade. “Temos o conhecimento, mas para lançar clínicas lá fora é preciso notoriedade. Ele vai dar-nos esse empurrão.”

Custos dos transplantes capilares podem variar entre €3000 e €6000, dependendo da densidade capilar pretendida. Pós-operatório exige três dias de repouso, podendo depois disso retomar-se a vida normal <span class="creditofoto">FOTO Rui Duarte Silva</span>

Custos dos transplantes capilares podem variar entre €3000 e €6000, dependendo da densidade capilar pretendida. Pós-operatório exige três dias de repouso, podendo depois disso retomar-se a vida normal FOTO Rui Duarte Silva

O objetivo é lançar clínicas nas principais capitais europeias. “Queremos abrir o próximo espaço já em 2019 ou 2020”, adianta. “Há várias clínicas no mundo, mas a maioria são muito pequenas. Acreditamos que, em dois anos, seremos líderes mundiais na área.”

O que a Saúde Viável leva para Madrid não são apenas serviços clínicos. É também o resultado da investigação e desenvolvimento (I&D) aqui realizada. “Em 2019, queremos investir €1 milhão em I&D em Portugal e nos próximos três a quatro anos €25 milhões a nível internacional”, diz Paulo Ramos. Não se trata, pois, apenas de crescimento, mas de investimento em investigação portuguesa. É aí que entra Carlos Portinha, coordenador clínico da Saúde Viável. “A nossa I&D centra-se em várias áreas”, explica: “Na área da biologia, realizamos investigação em conjunto com o [consórcio da Universidade do Porto] I3S para tentar multiplicar unidades foliculares através de células estaminais. Isto é importante para as pessoas que não têm área dadora.” A investigação permite melhor garantia de resultados e tratamento mais rápido, para ser melhor que a concorrência — nacional e agora internacional.

As clínicas contam com engenheiros que desenvolvem tecnologia para melhorar a extração, anestesia e tratamentos complementares de saúde capilar. “No campo da robótica, estamos a desenvolver tecnologia de extração dupla de folículos automatizada, bem como de análise em alta definição das unidades foliculares e reimplantação dos folículos”, especifica Carlos Portinha.

A Saúde Viável está ainda a criar com a Universidade do Porto um sistema de certificação e validação das unidades foliculares através de um scan — para “contabilizar e provar ao doente o número de unidades transplantadas” — e ferramentas de diagnóstico mais precisas, através de uma única foto 3D do couro cabeludo. “Queremos acoplar todas estas funcionalidades com robótica.” Investigação feita em Portugal. E agora, hecha en Portugal.

INVESTIGAÇÃO PORTUGUESA ALÉM-FRONTEIRAS

Além de levar os serviços clínicos da Saúde Viável para outros países, a Insparya vai exportar investigação e tecnologia portuguesa. No campo da biologia, a empresa está a estudar — em conjunto com o Instituto de Investigação e Inovação da Universidade do Porto — a hipótese de multiplicar as unidades foliculares através de células estaminais, importante para quem não tem área dadora. Na robótica, está a desenvolver tecnologia com o Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência da Universidade do Porto para automatizar o diagnóstico, análise, extração, anestesia e tratamentos complementares da saúde capilar, entre outras. Algumas destas tecnologias já serão incorporadas na clínica situada no centro de Madrid.