Henrique Monteiro

Henrique Monteiro

A pedra de toque da nossa vida

Há alturas, momentos, instantes que nos definem. A cada um de nós como seres humanos e à nossa sociedade, que transporta os valores que balizam o consenso mínimo entre todos nós. São tempos historicamente curtos, mas tão importantes que se sobrepõem à maioria das considerações que possamos fazer sobre todos os outros assuntos que, nessas circunstâncias, se tornam secundários. A forma como reagimos a esses momentos são como a pedra de toque que afere a pureza dos metais.

A crise dos migrantes é um desses momentos. Não podemos dizer que é inesperada, pois há mais de 25 ou 30 anos que diversos estudiosos a previam. A pressão migratória exercida por um círculo de miséria e conflitos sobre um centro de riqueza e paz é algo evidente, pelo menos desde a queda do Império Romano. Quando a globalização deixa todo o mundo perto da Europa, ou dos EUA, mais evidente se torna a pressão. Nesse sentido a guerra na Síria, os assassínios do ISIS, o colapso da Líbia e a maldade do Boko Haram são apenas fatores que aceleraram algo inevitável. De certo modo, como a partir do século II os hunos pressionaram os godos e os germânicos a deslocar-se para o Ocidente (os visigodos vieram parar à Península, os ostrogodos a Roma), estes conflitos pressionam sírios, magrebinos e africanos na nossa direção.

A questão que divide a Europa é como os receber. Já muitos tiveram a hombridade de dizer que, afinal, Merkel, a quem comparavam com Hitler, é quem melhor lida com esta situação.

Não preciso de tomar partido entre os que acham que podem vir todos e os que defendem que não pode vir ninguém. Tendo claramente para a primeira posição, mas não me perguntem o que se faz depois. Não sei! Há mais de sete anos escrevi que “hoje, quase ninguém aceita sacrifícios ou qualquer diminuição do bem-estar”, e que “as gerações atuais não sabem o que é uma verdadeira crise”.

Hoje reafirmo-o, convicto de que este movimento é imparável. Fechar ou abrir fronteiras, repito-o, é igual. Entrarão de qualquer forma. Para fugir da morte, qualquer um corre, sem receio, o risco de morrer.

A única questão é se ainda temos aquele pingo de humanidade, a luz interior que nos distancia da selvajaria e nos leva a entender este mundo como a casa de todos, na qual todos têm o direito de viver. É essa a pedra de toque da nossa geração.

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