LEGISLATIVAS
CONFRONTO Cartaz da coligação exibe os números do emprego que o PS considera uma mentira
Governo quer o desemprego na campanha
Passos na entrevista à SIC: “No Governo do PS, o desemprego passou de 7,5% para 12,1%” FOTO ALBERTO FRIAS
Ângela Silva e Rosa Pedroso Lima
Se não é autoconfiança, parece. Em total articulação com Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, PSD e CDS decidiram puxar o explosivo tema do desemprego para a primeira linha da campanha eleitoral. Depois de o primeiro-ministro ter aproveitado a entrevista que esta semana deu à SIC para exibir a criação de 175 mil novos postos de trabalho, a direção de campanha da coligação decidiu fazer o primeiro cartaz precisamente com esse número.
“Portugal está a melhorar”, é a frase em rodapé no cartaz que hoje vai para as ruas. E onde, em gordas, a coligação arrisca insistir na mensagem que levou António Costa a chamar mentiroso ao primeiro-ministro: “Em quatro anos, Portugal conseguiu recuperar mais de 175 mil empregos.”
Não restam dúvidas. Passos e Portas escolheram antecipar-se à polémica que sabiam estar no topo das prioridades da oposição: atacar o Governo de direita de ter destruído milhares de postos de trabalho e de lançar milhares de trabalhadores no desemprego. E com os números do INE no bolso, a coligação decide comprar a guerra. “É ir ao site do INE e fazer a conta”, afirmou ao Expresso fonte oficial, “é assim em todo o mundo, não há outra maneira de calcular os números do emprego”.
O PS diz que “não é sério querer suavizar o balanço com uma realidade fictícia”
Como pano de fundo está a estratégia da direita para a campanha que aí vem: mostrar que herdou um país falido, que teve que lhe dar um tratamento de choque, que viu a recuperação começar há cerca de dois anos, e que a confirmação dos resultados está a chegar à vida das pessoas, nomeadamente com a criação de emprego.
Mentira, diz o PS
António Costa acusou esta semana o primeiro-ministro de ter feito “do engano uma espécie de vício”. E João Galamba considera que “não é sério um Governo que destruiu 320 mil postos de trabalho em toda a legislatura estar a suavizar o balanço com uma realidade fictícia”. Para o deputado socialista, “foram apenas 120 mil” os postos de trabalho criados a partir de 2013, “dos quais cerca de 80 mil são contratos de emprego e inserção em que os desempregados são colocados no Estado ou em IPSS, numa situação altamente precária”.
À reação do PS, juntou-se a da CGTP: nesta legislatura, foram destruídos “298 mil postos de trabalho, temos mais 38 mil desempregados ‘oficiais’ e uma subida da taxa de desemprego e do desemprego de longa duração”, diz a central. A batalha das estatísticas não demove a maioria de insistir na comparação que Passos levou à SIC: “Enquanto o PS foi Governo, a taxa de desemprego passou de 7,5% para 12,1% (menos 236 mil empregos)”. Ao passo que o Governo conseguiu repor emprego, apesar dos anos de chumbo da troika.
“Já se percebeu que o PS tem uma tática: chamar mentiroso ao primeiro-ministro de cada vez que o Governo apresentar resultados”, afirma fonte oficial, “mas aqui não há dúvida. Vamos acabar o mandato com uma taxa de desemprego igual à de 2011”. Na coligação há quem defenda que “é aqui que se deve colocar a discussão”. “Comparar os números desta legislatura — a mais difícil da história da democracia — com as anteriores, é admitir que o Governo trabalhou bem.”
Menos 259 mil empregos desde 2011
Destruição de emprego durante atual legislatura pior do que na era Sócrates. Passos só se referiu à evolução desde a inversão em 2013
O debate político nem sempre contribui para clarificar os factos. A recente troca de argumentos sobre os números do emprego é apenas mais um exemplo. Na entrevista à SIC, Passos Coelho acusou o PS de ter destruído 236 mil postos de trabalho entre 2005 e 2011 e referiu que o seu Governo, entre janeiro de 2013 e abril de 2015, criou 175 mil empregos.
Esta análise cria, desde logo, dificuldades: Passos Coelho não referiu qual a base de dados que estava a usar nem precisou, no caso do Governo Sócrates, qual o período exato a que se estava a referir. O Expresso consultou as séries mensais do INE para avaliar estas questões e concluiu que os anos do Partido Socialista não foram tão negros como Passos os pintou nem o saldo desta legislatura é positivo.
A destruição de emprego de Sócrates foi, de facto, significativa, mas não chegou aos números avançados pelo primeiro-ministro. Passos não especificou os meses, mas se se comparar fevereiro de 2005 (a tomada de posse foi em março) com maio de 2011 (último mês antes da entrada da coligação PSD/CDS), verifica-se uma destruição de 196 mil empregos.
Já no caso da criação de emprego durante a atual legislatura, o resultado foi o anunciado por Passos — 175,8 mil — entre janeiro de 2013 e abril de 2015. Só que este número tem dois problemas. Em primeiro lugar, porque o Instituto Nacional de Estatística já disponibilizou os dados de maio, quando o emprego caiu, e o saldo diminui para 153 mil empregos. Depois, porque esta avaliação apenas olha para o balanço desde o mínimo do emprego em janeiro de 2013 e quando se olha para o conjunto da legislatura o saldo é bastante negativo: 259 mil empregos perdidos entre junho de 2011 e maio deste ano.
Houve, no entanto, uma viragem a partir do primeiro trimestre de 2013 ,que permitiu a diminuição da taxa de desemprego de quase cinco pontos percentuais de 17,9% para os atuais 13%. No entanto, em maio houve um retrocesso e a taxa voltou a subir duas décimas. Continua, apesar de tudo, bastante longe do pico que teve no auge da crise. O que se deve, apenas parcialmente, à recuperação da economia que voltou a crescer em 2014 depois de três anos de recessão.
Um dos problemas com a ‘leitura’ do mercado de trabalho apenas pelo emprego é que pode não permitir compreender todas as dinâmicas. Enquanto no período Sócrates a destruição de emprego correspondeu quase integralmente a agravamento do número de desempregados, agora a situação é completamente diferente. Menos de metade da redução dos desempregados desde o início de 2013 — 256 mil pessoas — foi explicada pela criação de emprego. O restante deve-se à redução da população ativa que resulta, por um lado, da emigração (que tende a ser mais procurada por desempregados) e também de pessoas que saem do mercado (porque desistem de procurar emprego).
Ao mesmo tempo, uma parte da criação de postos de trabalho foi alimentada pelos estágios do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), já que, na realidade, o crescimento do PIB é ainda insuficiente para gerar grandes criações de emprego. João Silvestre