TROPA DE ELITE
Começou como uma investigação a casas de câmbio ilegais, transformou-se na maior ação antibranqueamento de capitais da Justiça brasileira, e agora a Operação Lava Jato ameaça chegar a Portugal através de ligações ao processo em que é suspeito José Sócrates. Os procuradores que investigam o caso são os novos heróis do Brasil
TEXTO IVANI FLORA no Rio de Janeiro
Intocáveis A “Folha de S. Paulo” recuperou o nome da equipa policial que perseguiu o mafioso Al Capone para batizar os procuradores da Operação Lava Jato, liderados por Deltan Dallagnol (ao centro)JÚnior Pinheiro/Folhapress
Há pouco mais de um ano, havia muito pouco a dizer sobre Curitiba além da qualidade de vida de quem lá mora e do clima, por vezes demasiado frio para os padrões brasileiros. Principalmente à noite. Mas tudo mudou em março do ano passado, e, por estes dias, a capital do estado do Paraná tornou-se o epicentro de uma megainvestigação que está a sacudir os pilares da política e da economia do país — que pode atravessar o Atlântico e chegar a Portugal. Foi a partir da cidade, a 1100 quilómetros de Brasília, que a Polícia Federal desencadeou a maior operação da história contra o branqueamento de capitais. Começou a norte, numa cidade mais pequena chamada Londrina, visando os “doleiros” — como são conhecidos os cambistas ilegais. A partir de um deles, Alberto Youssef, as autoridades começaram a puxar um novelo que não tem parado de crescer. É uma enorme bola de suspeitas e crime que rola a toda a velocidade em direção aos centros de poder, perante o olhar atónito dos brasileiros, que, nos últimos tempos, viram entrar nas suas conversas de todos os dias expressões como Lava Jato, Petrolão e delação premiada.
A detenção de Youssef conduziu rapidamente a denúncias de desvio de dinheiro na Petrobras e ao envolvimento de políticos e grandes empresas de construção civil no maior esquema de desvio de verbas públicas até hoje descoberto no Brasil. Um dos sócios do cambista de Londrina era Carlos Habib Charter — ele próprio “doleiro” em Brasília e proprietário de um posto de combustíveis onde funcionava também um lava jato para carros e uma lavandaria. No Brasil, tal como em Portugal, o branqueamento de capitais é conhecido por lavagem de dinheiro. E a Polícia Federal, sempre muito criativa a batizar as suas operações, não perdeu tempo e chamou ao caso Operação Lava Jato. O nome pegou, e os brasileiros acompanham cada novo desenvolvimento como se fosse mais um episódio de uma telenovela. A trama arrancou com a tal investigação ao mercado ilegal de câmbio, passou para as denúncias de desvio de dinheiro entre o mais alto escalão de funcionários da Petrobras, a gigante petrolífera brasileira, e está agora a apertar o cerco a uma enorme lista de políticos.
Com a memória ainda recente do escândalo de corrupção no Congresso Nacional Brasileiro, que envolvia a compra de votos de parlamentares pelo Partido dos Trabalhadores em 2005, durante o governo de Luís Inácio Lula da Silva — e que fiou conhecido como Mensalão —, não tardou para que os brasileiros dessem a alcunha de Petrolão ao escândalo da Petrobras. Quando a investigação chegou à maior empresa estatal brasileira, ganhou contornos superlativos, não só pelo volume de pessoas envolvidas mas principalmente pelas enormes quantias de dinheiro desviadas, até agora o equivalente a cerca de 2 mil milhões de euros, através de um esquema de cartel de empresas de construção, que subornava executivos da Petrobras, que, por sua vez, passavam o dinheiro a partidos políticos: o PT, Partido dos Trabalhadores, da Presidente Dilma Rousseff, o PMDB, Partido do Movimento Democrático Brasileiro, do vice-presidente Michel Temer, e o PP, Partido Progressista, da base aliada do governo no Congresso.
As construtoras são as principais financiadoras das campanhas políticas no Brasil, e todos suspeitam de que há políticos envolvidos no esquema de corrupção
O Ministério Público Federal, que já investigava irregularidades na Petrobras no processo de compra da refinaria norte-americana de Pasadena, no Texas, em 2006, montou uma equipa especial na capital do Paraná, formada por 40 pessoas, entre elas nove procuradores, que se dedicam em exclusividade à Operação Lava Jato. O juiz paranaense Sérgio Moro, responsável pelo caso e uma espécie de “mocinho” na telenovela em curso, também tem sido peça fundamental por imprimir uma grande agilidade ao processo, o que não é comum na justiça brasileira. A grande integração entre a Polícia Federal, o Ministério Público e o juiz tem sido criticada pelos advogados de defesa dos acusados e chamado a atenção não só pela eficiência mas pelos métodos de trabalho.
“Mãos Limpas “ à brasileira
A Operação Lava Jato está a ser considerada uma revolução no combate à corrupção no Brasil e, inevitavelmente, a equipa coordenada pelos procuradores Deltan Dallagnol e Carlos Fernando dos Santos Lima ganha mais destaque a cada novo episódio. Os procuradores da República, integrantes do grupo descrito como uma “força-tarefa”, têm entre 28 e 50 anos de idade e, em comum, a especialidade no combate a crimes financeiros. As investigações são lideradas pelo procurador-geral da República Rodrigo Janot, colocado em Brasília, mas a base de trabalho continua a ser a capital do Paraná, a partir de onde trabalha o juiz Sérgio Moro, 43 anos, chefe da 13ª Vara Criminal de Curitiba. Moro, o responsável por mandar para a prisão altos executivos das maiores construtoras do pais, chegou a juiz aos 24 anos de idade e é considerado um dos maiores especialistas no combate aos chamados crimes de ‘colarinho branco’ no Brasil, sendo conhecido por conciliar o conhecimento académico com a experiência prática. Do seu currículo constam o curso de instrução para advogados na prestigiada Escola de Direito de Harvard, nos EUA, e a participação num programa de estudo nas agências e instituições encarregadas da prevenção e combate a crimes financeiros do Departamento de Estado norte-americano. Já atuou em casos como o de desvio de dinheiro para o exterior do Banestado, antigo banco estatal do Paraná, que resultou numa operação chamada Farol da Colina e que teve como consequência a prisão de 60 cambistas ilegais. Entre eles estava Alberto Youssef, o pavio da Operação Lava Jato, que na época não foi condenado porque participou no programa de delação premiada que desmantelou um grande esquema de evasão de divisas através do banco paranaense. O cambista voltou às atividades ilegais e teve o azar de, mais uma vez, cruzar o caminho do juiz Sérgio Moro, que o condenou a cumprir a pena de quatro anos e quatro meses de prisão pelo crime anterior (pena que tinha sido suspensa em virtude do acordo de delação).
A delação premiada, em que um suspeito colabora a troco de uma redução de pena, tem sido uma arma para os investigadores
A delação premiada é uma estratégia bastante usada pelo juiz Sérgio Moro. E é também uma das semelhanças entre a Operação Lava Jato e a Operação Mãos Limpas, que na década de 90 desarticulou um enorme esquema de corrupção na Itália. Na altura, tal como hoje no Brasil, polícia, Ministério Púbico e magistratura investigaram e prenderam vários parlamentares e empresários ligados a companhia estatal petrolífera italiana. Há 11 anos, o juiz Sérgio Moro chegou a publicar um artigo académico sobre a Operação Mãos Limpas, no qual já revelava a intenção de que o mesmo pudesse ser feito no país. “No Brasil, encontram-se presentes várias das condições necessárias para a realização de ação judicial semelhante”, notava o magistrado no artigo.
Não é assim de estranhar que as técnicas do juiz brasileiro sejam parecidas com as que foram utilizadas na Itália. Agilizar as investigações através do recurso à delação premiada, onde o acusado fornece informações para colaborar com a investigação em troca de uma redução da pena. A medida também é uma forma de pressionar os acusados, pois cria a expectativa de que a justiça tem mais informações do que realmente possui, estratégia que leva a novos acordos de delação. Até o momento, no âmbito da Operação Lava Jato, já foram feitos 18 acordos, e o número parece crescer todos os dias. A delação é uma estratégia jurídica controversa, que, embora prevista pela legislação brasileira, é considerada antiética por alguns juristas. A Ordem dos Advogados do Brasil, através de um ofício ao Ministério Público Federal, já se manifestou contra o uso indiscriminado da prisão preventiva com o objetivo de obter delação premiada.
Gigantes Marcelo Odebrecht e Otávio Azevedo, donos das construtoras Odebrecht e Andrade Gutierrez, ambas acusadas de fazerem parte do “Cartel do Petrolão”, foram detidos pelas autoridades Rodolfo Burher/REUTERS
No ofício, em que é questionada a legalidade da medida, os representantes dos advogados alegam que “a prisão provisória deve ser utilizada quando preenchidos todos os requisitos legais, não podendo servir como antecipação de pena nem como pressão psicológica para obtenção de delação”. A nota ao Ministério Público é uma crítica à atuação do juiz Sérgio Moro, definido pelos colegas juristas como uma pessoa pró-ativa. De acordo com a procuradora paranaense Mônica Azevedo, Moro tem o perfil de uma nova geração de magistrados, mais participativa. “Não fica isolado no seu gabinete, mas participa ativamente do andamento do processo”, refere a magistrada.
Atitudes como esta colocam o juiz cada vez mais em evidência. A agilidade do processo e as sucessivas ordens de prisão, que levaram à cadeia importantes executivos, dão aos brasileiros a sensação do fim da impunidade. Por isso, Sérgio Moro foi elevado ao posto de novo “herói” da pátria, natural sucessor do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, que em novembro de 2013 determinou a prisão dos réus do Mensalão. Ambos passaram a receber prémios e aplausos em lugares públicos, como restaurantes. Recentemente, quando o juiz Sérgio Moro fazia compras num supermercado de Curitiba, foi reconhecido e, depois de a sua presença ter sido anunciada pelo altifalante usado para avisar os clientes sobre as ofertas do dia, foi ovacionado por todos os que andavam às compras.
Rodízio de obras
A 14ª etapa (ou episódio) da Operação Lava Jato, desencadeada no último dia 19 de junho, foi batizada de Erga Omnes, termo jurídico em latim que significa “valerá para todos”. O nome foi escolhido pela importância dos presos nesta fase da operação. Nada mais nada menos do que dois dos mais poderosos empresários do país: Marcelo Odebrecht e Otávio Azevedo, donos das construtoras Odebrecht e Andrade Gutierrez, ambas acusadas de fazerem parte do “Cartel do Petrolão”, como é chamado o esquema de concursos públicos fraudulentos. Na prática, de acordo com as autoridades, era estabelecido uma espécie de “rodízio” de distribuição de obras entre as empresas de prestação de serviço para a Petrobras. Eram até agora as únicas do grupo que não tinham sido atingidas pela Operação Lava Jato, numa altura em que já estão na prisão vários executivos de outras empresas de construção, ex-diretores da Petrobras e o ex-tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, João Vaccari Neto. Ao ser conhecida a detenção do filho, o pai de Marcelo Odebrecht terá dito aos jornalistas: “Ao lado da cela do meu filho terão de construir mais três. Uma para mim, uma para Lula e outra para Dilma.”
As construtoras são as grandes financiadoras das campanhas políticas no Brasil e, desde o começo das investigações da Lava Jato, sabia-se que o esquema de desvio de dinheiro da empresa estatal poderia levar ao envolvimento de políticos. Seria apenas uma questão de tempo. Porém, como a classe política tem direito a estatuto privilegiado e só pode ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal, em Brasília, o juiz Sérgio Moro terá estabelecido uma estratégia de dar prioridade e tornar públicas somente as investigações aos executivos. O magistrado dividiu o processo para julgar apenas os réus que não têm foro privilegiado, procurando evitar dessa forma que os advogados de defesa aleguem sobreposição de competência e peçam a anulação do processo. O juiz paranaense nega que seja uma manobra, mas a verdade é que, desta forma, além de manter o processo nas suas mãos ainda garante que ele avance longe das pressões da capital política do país. Os nomes de políticos citados nas delações premiadas são encaminhados para o Supremo Tribunal Federal através da Procuradoria-Geral da República.
Suspeita A Presidente Dilma já negou o envolvimento no esquema de corrupção, mas não consegue afastar suspeitas Joedson Alves/REUTERS
A primeira lista, de 28 políticos suspeitos de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras, entregue em março deste ano, continha o nome de ex-ministros, ex-governadores e parlamentares. Todos os políticos acusados até agora negaram a participação no esquema. Porém, há cada vez mais nomes citados nos depoimentos como destinatários do dinheiro desviado pelas empreiteiras. O diretor da empresa de construção UTC, Ricardo Pessoa, preso em Curitiba desde novembro passado e apontado como o chefe do cartel das empreiteiras, apresentou uma nova lista, divulgada na semana passada, que aumentou a pressão sobre o governo do PT. Entre os nomes cujas campanhas receberam dinheiro desviado da petrolífera estatal estão o do ex-Presidente Lula e o da Presidente Dilma.
O delator afirmou ter passado cerca de 2,5 milhões de euros para financiar a campanha política que elegeu a Presidente, no ano passado. Dilma Rousseff rebateu as acusações de doações ilegais e desqualificou o delator. “Eu não respeito delator, até porque eu estive presa na ditadura e sei o que é. Tentaram me transformar em uma delatora. A ditadura fazia isso com as pessoas presas, e garanto para vocês que resisti bravamente”, disse a Presidente. Desde a prisão do ex-tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, em abril deste ano, aumentaram as suspeitas sobre o envolvimento do governo com o desvio de dinheiro da Petrobras. O escândalo foi bastante explorado pela oposição nas eleições passadas, porém, na altura, os nomes dos políticos ainda não tinham sido divulgados.
No Brasil, a relação das empreiteiras com o poder sempre foi muito estreita, pois são as principais empresas financiadoras de campanhas políticas. Na esteira do escândalo da Lava Jato, o Congresso discute atualmente uma reforma política que tem como uma das propostas principais proibir a contribuição para campanhas por empresas que têm contratos com a administração pública. O escândalo atingiu diretamente a imagem do Congresso brasileiro depois de os nomes do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), e do presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha (PMDB), terem aparecido na lista de políticos suspeitos de envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras. Em entrevista ao Expresso, o presidente da Câmara negou o envolvimento, mas diz estar consciente de que o escândalo ainda pode trazer consequências para a classe política. “A real repercussão só o tempo vai dizer. Cabe a nós corrigir a distorção existente para evitar que novos casos Lava Jato surjam no país”, afirmou Eduardo Cunha.
A atual legislação permite que os partidos arrecadem dinheiro através de pessoas físicas e jurídicas, mas nas últimas eleições a quase totalidade das doações foram feitas por empresas, que podem contribuir com até 2 por cento da sua faturação bruta. Dois por cento de uma empresa como a Odebrecht, que faturou o equivalente a cerca de 33 mil milhões de euros no ano passado, mesmo com a crise provocada pela Lava Jato, não é uma quantia irrelevante. A Odebrecht sempre esteve próxima do poder, desde o período da ditadura militar. A empresa foi a construtura do prédio da sede da Petrobras no Rio de Janeiro, em 1969, e já era considerada a maior empreiteira do país, quando o ex-Presidente Lula assumiu o poder pela primeira vez, em 2003.
A verdade é que cresceu ainda mais durante os últimos 12 anos de governo do PT. A construtora foi uma das principais beneficiadas pelas obras para o Mundial de Futebol de 2014 e para as Olimpíadas de 2016 e ganhou também as obras de infraestrutura do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo “petista”. A construtora é também responsável por vários projetos da Petrobras, inclusive do Pré-Sal, a enorme reserva de petróleo descoberta no Brasil em 2007.
Há duas semanas, o juiz Sérgio Moro negou o pedido de liberdade feito pelos advogados de Marcelo Odebrecht e Otávio Azevedo. Por isso, os dois e mais alguns diretores de grandes empresas de construção dividem com presos comuns as apertadas instalações da Polícia Federal, onde alguns colchões têm de ser colocados no chão. E se não deve estar a ser nada fácil dormir na cela gelada nesta época do ano, em que as temperaturas em Curitiba facilmente descem abaixo de zero durante a madrugada, do lado de fora muita gente pode também estar a perder o sono.
O jato que pode salpicar Portugal
A Odebrecht, gigante brasileiro da construção com uma atuação global, estabeleceu-se em Portugal a partir de 1988, quando comprou a Bento Pedroso Construções (BPC), uma média construtora que rapidamente floresceu nas empreitadas do universo estatal português, em especial na teia rodoviária. A sua primeira grande obra foi a construção de um troço da autoestrada do Norte (A1), em Leiria. Só em 2013 a construtora adotou a designação Odebrecht Portugal. Hoje, enquanto a justiça brasileira começa a investigar contratos da Odebrecht pelo mundo, as autoridades portuguesas também estão interessadas nos detalhes sobre os negócios da empreiteira em Portugal e na sua relação com o ex-primeiro-ministro José Sócrates, preso desde novembro de 2014.
Não é de agora que os investigadores portugueses da Operação Marquês, que conduziu à detenção, entre outros, do ex-primeiro-ministro, procuram ligações com o Brasil. Por exemplo, a viagem de Lula da Silva a Lisboa, em 2013, para o lançamento do livro de Sócrates, foi paga pela Odebrecht. Lula viajou também a convite da empresa para participar na cerimónia dos 25 anos da presença da Odebrecht em Portugal. As viagens do ex-Presidente Lula ao exterior são investigadas pela Polícia Federal brasileira, como foi apurado pela revista “Época”. Viagens que teriam sido feitas na companhia do ex-diretor da Odebrecht Alexandrino Alencar, de quem Lula é amigo pessoal.
Alexandrino foi preso no dia 19 de junho, juntamente com o presidente da empresa, acusado de negociar e efetuar pagamentos de suborno aos executivos da Petrobras e aos operadores dos partidos políticos, através de contas no exterior. De acordo com a revista brasileira, que teve acesso a um relatório da Polícia Federal, Lula, depois de deixar o governo em 2009, teria viajado seis vezes para o exterior acompanhado do ex-diretor da Odebrecht — e um dos destinos foi Portugal, em 2011. Em nota à revista, o Instituto Lula informou que “o ex-Presidente já fez palestras para empresas nacionais e estrangeiras dos mais diversos sectores (...) e, como é de praxe, as entidades promotoras responsabilizam-se pelos custos de deslocações e hospedagem”.
No caso da Operação Marquês, os investigadores seguem a pista Odebrecht pela sua presença ao lado do grupo Lena numa série de consórcios vencedores de obras públicas durante os governos de José Sócrates, como a construção da barragem do Baixo Sabor (257 milhões de euros), as concessões rodoviárias da Grande Lisboa e do Baixo Tejo. Lena e Odebrecht integravam ainda o consórcio vencedor da construção do troço de TGV entre Poceirão e Caia. Mas os três conglomerados brasileiros que operam em Portugal (Camargo Corrêa, Odebrecht e Andrade Gutierrez) sempre estiveram na primeira linha de investigação entre as dez construtoras envolvidas na Operação Lava Jato e todos eles tiveram os seus presidentes detidos.
Primeiro, a 14 de novembro, foi o presidente da Camargo Corrêa, Dalton Avancini, libertado no fim de março, depois de uma “delação premiada”. A Camargo é dona da Cimpor e, em Portugal, não atua na construção. Na altura da ofensiva à Cimpor (2010), a empresa brasileira contou com o apoio ativo da CGD, acionista da cimenteira. Trocou ativos com a Votorantim e controla a nova Cimpor com 95% do capital. Em junho, além dos executivos da Odebrecht, também foram presos na 14ª fase do Lava Jato vários diretores da Andrade Gutierrez, entre eles o presidente Otávio Marques de Azevedo. Otávio foi o principal estratego da fusão da PT com a Oi e da posterior venda da PT Portugal à francesa Altice. Participou no conselho de administração da PT (Portugal Telecom) até julho de 2014, deixando a empresa alegando desconhecer o investimento milionário da PT na Rio Forte, do universo GES, que levou ao fim da fusão entre as duas operadoras. Chegou mesmo a dizer que Ricardo Salgado fez declarações falsas.
O conglomerado entrou em Portugal em 1988, optando pela aquisição de um operador de renome — a Zagope. A construtora manteve-se sempre no top 5 português. Já este ano, a Zagope transformou-se em Andrade Gutierrez Europa, África, Ásia, uniformizando a identidade corporativa. A base de Lisboa gere todas as operações fora do continente americano. A Andrade Gutierrez, segunda maior empreiteira do Brasil, que atua também nos sectores de distribuição de energia e telecomunicações, foi acusada de ter feito depósitos na conta de um dos operadores de pagamento de suborno para ex-diretores da Petrobras e políticos do PMDB. I.F. com Abílio Ferreira