Paul de Grauwe

Torre de Marfim

Paul de Grauwe

O drama grego: quem é irrazoável?

Ser ‘razoável’ é igual a aceitar as condições dos credores oficiais mesmo que estas não tenham conseguido produzir resultados positivos

O drama grego entrou no último ato. O Governo grego tem de pagar empréstimos ao Fundo Monetário Internacional e a outras instituições num futuro próximo mas não tem fundos para tanto. Os credores recusam-se a fornecer liquidez enquanto o Governo grego não aceitar as condições que impõem.

Os ministros das Finanças da zona euro dizem agora que o Governo grego não é razoável porque não quer aceitar estas condições: que o programa de austeridade seja completamente aplicado e que as reformas estruturais que foram acordadas com o anterior Governo da Grécia sejam levadas a cabo na sua totalidade.

Mas será que estas condições são razoáveis?

As medidas de austeridade que foram impostas desde 2011 conduziram a efeitos devastadores na economia grega. Levaram milhões de pessoas à pobreza e ao desemprego e produziram uma instabilidade política que foi responsável pela vitória do Syriza. Insistir em mais austeridade não parece razoável quando o falhanço desta estratégia se tornou tão óbvio. O que surpreende é que os ministros das Finanças continuem a esgrimir argumentos no campo moral e a dizer aos gregos que devem ser mais razoáveis. Ser razoável é igual a aceitar as condições dos credores mesmo que estas condições não tenham conseguido produzir resultados positivos. E é ainda mais espantoso que a maioria dos media tenha aceitado esta narrativa.

Algumas das reformas estruturais em que os credores fazem finca-pé são dramaticamente necessárias. A reforma fiscal que levaria os ricos a pagarem mais impostos é uma delas. Mas esta é uma reforma que com certeza o Governo de Tsipras, ao contrário do anterior, terá toda a vontade de realizar. Entretanto, outras reformas estruturais são claramente irrazoáveis. O programa de privatizações que foi negociado com o anterior Governo e que as entidades credoras querem que seja cumprido não faz sentido. Um país não deve ser obrigado a abrir mão dos seus bens numa venda forçada, que o coloca numa má posição como vendedor. Isto traria baixos rendimentos para o Governo grego e beneficiaria sobretudo os compradores, alguns dos quais são empresas dos países credores.

A Grécia pode dizer-se solvente mas sem liquidez. A especulação autoalimenta-se e está a empurrar o país para o default

Dizem-nos agora que toda a responsabilidade pelo falhanço está do lado do Governo grego que se mantém irrazoável e não dá confiança aos credores. Ora, é exatamente o contrário. A intransigência dos credores e as exigências irrazoáveis que impõem à Grécia é que são responsáveis pelo drama que se avizinha.

Esta intransigência encerra, por outro lado, uma grande contradição. Como é por demais sabido, a Grécia beneficiou do reescalonamento da sua dívida no passado recente. As maturidades da dívida foram prolongadas e as taxas de juro desceram. O resultado é que a dívida pública grega se tornou sustentável. Segundo o think tank de Bruxelas, Breugel, a dívida pública efetiva da Grécia representa apenas cerca de 60 por cento do PIB grego. Isto parece ser sustentável, desde que a economia do país possa funcionar normalmente. Por outras palavras, a Grécia pode dizer-se solvente mas sem liquidez.

Os credores, no entanto, mantêm fechada a torneira do dinheiro. Em resultado, os mercados financeiros especulam que o Governo grego não possa vir a respeitar o prazo do próximo pagamento e terá de entrar em incumprimento. As taxas de juro da dívida soberana grega dispararam para níveis que tornam insustentável o serviço da dívida e que impossibilitam que o Governo grego se financie nos mercados. A especulação autoalimenta-se e está a empurrar o Governo grego para o default. Mas é preciso sublinhar que isto é o resultado da decisão dos credores de não darem liquidez ao Governo grego.

O Banco Central Europeu (BCE) tem uma grande responsabilidade. Ao fornecer liquidez pode desatar o nó em que o Governo grego está metido. Recusar essa liquidez faria do BCE o mais importante ator responsável pelo incumprimento grego e uma possível saída da Grécia do euro.

Professor da Universidade Católica de Lovaina, Bélgica

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