Economia

5 razões para estar preocupado com as previsões do Banco de Portugal... e outras 3 para se animar

O Banco de Portugal, liderado por Carlos Costa, apresentou previsões para o crescimento da economia portuguesa mais pessimistas do que as do Governo <span class="creditofoto">Foto Luís Barra</span>

O Banco de Portugal, liderado por Carlos Costa, apresentou previsões para o crescimento da economia portuguesa mais pessimistas do que as do Governo Foto Luís Barra

As projeções do Banco de Portugal traçam um quadro de crescimento anémico, penalizado pela frente externa, e que pode ser ainda pior do que o esperado, numa economia com baixo potencial de expansão e com a evolução do rendimento disponível a abrandar. Contudo, um perfil de crescimento mais sustentável, com contributo positivo da produtividade, o emprego a subir e o desemprego a recuar para níveis de 2002 são pontos positivos

Texto Sónia M. Lourenço

Crescer acima dos 2% terá sido “sol de pouca dura” para a economia portuguesa. Pelo menos, é nesse sentido que apontam as previsões do Banco de Portugal (BdP), divulgadas esta terça-feira no Boletim Económico. Depois de superar esta barreira em 2017 e, tudo o indica, em 2018, o crescimento do Produto Interno Bruto em 2019 não deve ir além dos 1,8%, penalizado pela frente externa, com a economia abrandar ainda mais nos anos seguintes.

A forte desaceleração da atividade económica portuguesa, com o BdP a ser mais pessimistas do que o Governo e até do que as principais organizações nacionais e internacionais, é um dos fatores negativos para o futuro. E há mais. O Expresso elenca-lhe cinco razões para estar preocupado com as previsões da instituição.

Mas, nem tudo é negativo. Há também, pelo menos, três boas notícias. Com destaque para o mercado de trabalho: o emprego vai continuar a crescer e a taxa de desemprego a recuar, devendo chegar a 2021 nos 5,3%, um número que não é visto em Portugal desde 2002.

Primeiro as cinco razões para estar preocupado:

1 - A economia está a abrandar

A economia portuguesa está a abrandar, vai abrandar ainda mais e ficar aquém das expetativas do Governo, antecipa o banco central. A desaceleração vai ser marcada. Depois de crescer 2,8% em 2017, o PIB deve aumentar apenas 2,1% este ano, em termos reais, avança a instituição. E os números não vão além dos 1,8% em 2019, 1,7% em 2020 e 1,6% em 2021. Por comparação, as previsões do Governo inscritas no Orçamento do Estado apontam para uma expansão de 2,3% este ano e de 2,2% no próximo.

“O período 2018-2021 deverá ser uma fase de maturação do ciclo económico: manutenção de trajetória de crescimento mas a um nível progressivamente menor, convergindo para a do PIB potencial”, salienta o BdP. E a explicação para este abrandamento está, sobretudo, na frente externa. De facto, “parte da desaceleração da atividade projetada para Portugal resulta da evolução esperada das exportações, num contexto de maturação do ciclo económico também na área do euro e nas economias avançadas em geral, acompanhada por uma progressiva redução dos estímulos de política monetária”, lê-se no relatório.

2 - O cenário pode ser ainda pior do que o esperado

Portugal vai crescer pouco nos próximos anos e a evolução pode ser ainda mais anémica do que projetado pelo BdP. A instituição atribui uma probabilidade de 55% de a expansão do PIB ser mais modesta do que antecipado em 2019, número que se mantém em 2020 e que fica muito próximo, nos 53%, em 2021.

Explicação? “Os principais fatores de risco identificados para a atividade decorrem da possibilidade de um enquadramento internacional menos favorável do que o considerado nas projeções”, salienta o BdP. Uma deteerioração que pode resultar de diversas situações, como a “intensificação das políticas protecionistas e de condições financeiras mais restritivas, bem como da possibilidade de agravamento das tensões geopolíticas e da incerteza política a nível global”, considera a instituição.

Acresce que, ao nível europeu, “um ajustamento abrupto nos mercados da dívida soberana na área do euro pode criar tensões nos mercados financeiros, com impacto negativo nas condições de financiamento”. A instituição considerou ainda a possibilidade de um impacto mais adverso do Brexit, ou seja, do processo de saída do Reino Unido da União Europeia. Tudo somado, “a materialização destes riscos origina consequências adversas para as componentes da procura global”.

3 - Exportações perderam gás e podem correr ainda pior

Depois de crescerem 7,8% em termos reais em 2017, a expansão das exportações deve ficar pelos 3,6% este ano, situando-se nos 3,7% em 2019, 4% em 2020 e 3,6% em 2021. O banco central destaca a “revisão em baixa do crescimento das exportações, que reflete a revisão das hipóteses relativas à evolução da procura externa e a incoporação da informação mais recente”.

Mais ainda, o número para 2018 pode vir a ser inferior. Tudo porque os dados considerados pelo BdP não refletem ainda os efeitos da recente greve dos estivadores no Porto de Setúbal. E, para os próximos anos, a intituição atribui uma probabilidade de a evolução das exportações ficar abaixo do projetado de 52% em 2019, 56% em 2020 e 53% em 2021.

4 - Crescimento do PIB potencial permanece muito limitado

O conceito é teórico, mas muito usado pelos economistas. “O produto potencial de uma economia pode ser definido como o nível de produto correspondente à utilização sustentável dos recursos existentes nessa economia”, explica o BdP. “Não sendo observável, o produto potencial pode ser estimado com base em variáveis observáveis, permitindo avaliar o potencial de crescimento económico”, frisa o BdP. A instituição apresenta quatro estimativas para a evolução deste indicador ao longo dos últimos anos e para os próximos. E todas vão no mesmo sentido: o potencial de crescimento da economia portuguesa continua muito limitado, oscilando entre 1,4% e 2,1% no período entre 2018 e 2021.

5 - Evolução do rendimento disponível vai abrandar

O rendimento disponível está a crescer em termos reais acima dos 2% desde 2015, um cenário que o BdP antecipa que se mantenha em 2018 e 2019. Mas, deve abrandar a partir daqui, crescendo apenas 1,8% em 2020 e 1,5% em 2021.

Uma evolução que, segundo o BdP, “será em larga medida determinada pela aceleração dos salários, para o que também contribuiu o aumento do salário mínimo em 2018, e pelo crescimento dinâmico do emprego”. A instituição antecipa um progressivo abrandamento do emprego, sobretudo a partir de 2019, mas que “deverá ser em larga medida compensado por uma aceleração das remunerações por trabalhador, resultando numa desaceleração muito ligeira da massa salarial”.

A evolução do rendimento disponível em 2018 e 2019 está ainda a ser sustentada por medidas de finanças públicas. “Para além de medidas aprovadas em anos anteriores (como o descongelamento gradual das progressões salariais na administração pública ou a alteração de escalões em sede de IRS), foram incorporadas medidas anunciadas no Orçamento do Estado para 2019”, indica o BdP, destacando o aumento da despesa pública de caráter social, em particular o alargamento da Prestação Social para a Inclusão. Contudo, “o desvanecer do impacto destas medidas, bem como algum aumento da inflação no final do horizonte de projeção, reforçam a trajetória de abrandamento do rendimento disponível real em 2020-21”, alerta o banco central. Neste quadro, “após um ligeiro aumento em 2018-19, a taxa de poupança deverá manter-se relativamente estável ao longo do restante horizonte de projeção, em níveis historicamente reduzidos”, frisa a instituição.

Depois as boas notícias:

1 - Perfil de crescimento mais sustentável

O Banco de Portugal não tem dúvidas: para o período entre 2018 e 2021 o perfil de crescimento económico em Portugal deverá “manter os traços de maior sustentabilidade observados nesta recuperação”. E destaca o reforço do peso das exportações e da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) empresarial no PIB.

“O período de recuperação que se seguiu a 2013 caracterizou-se pela continuação do aumento do peso das exportações no PIB, uma tendência extensível a todas as componentes, com destaque para o turismo, que apresentou o maior crescimento acumulado”. escrve a instituição no relatório. Ao memso tempo, “a FBCF empresarial acelerou significativamente neste período, devendo atingir no final do horizonte de projeção um nível 8% superior ao observado em 2008”. Em contraste, “o investimento público e o investimento em habitação permanecem abaixo da média observada antes da crise financeira internacional”. Já o peso do consumo privado no PIB “manteve-se relativamente inalterado neste período”. Ora, as atuais projeções “têm subjacente a continuação destas tendências, consistentes com um perfil de crescimento sustentável da economia portuguesa”, frisa o BdP.

2 - Produtividade com contributo positivo para o crescimento

Tal como nos últimos anos, entre 2018 e 2021 o emprego vai dar o principal contributo para o crescimento em Portugal. Mas, de menor dimensão. O BdP projeta a continuação de um contributo positivo do fator trabalho, embora inferior ao observado no período 2014-17, “sendo este o principal fator subjacente à desaceleração do PIB”. Tudo por causa da significativa diminuição do grau de subtilização no mercado de trabalho observado nos últimos anos, bem como pelas perspetivas de crescimento muito moderado da população ativa, num contexto de redução e envelhecimento da população total. Ainda assim, “as projeções de continuação da redução da taxa de desemprego – embora com um perfil menos acentuado – e de um aumento da taxa de participação nos próximos 3 anos implicam que o fator trabalho continuará a contribuir positivamente para o crescimento do PIB per capita”, frisa a instituição.

O capital humano deverá também manter um contributo positivo para o crescimento económico,como vem sendo observado desde o início da área do euro, “associado à trajetória crescente das qualificações médias da mão-de-obra (indiretamente medidas pelo gradual aumento dos níveis médios de escolaridade).

No que se refere ao fator capital, “antecipa-se um contributo positivo nos próximos anos, mas de magnitude reduzida, após valores aproximadamente nulos no período 2014-17”, diz o BdP, destacando que esta evolução resulta “da dinâmica recente e projetada para o investimento, em particular para o investimento empresarial, importante fator potenciador do crescimento económico”.

Por fim, a produtividade total dos fatores implícita (obtida por resíduo neste exercício face aos contributos estimados dos fatores trabalho e capital) deverá apresentar um contributo positivo, embora relativamente baixo, para o crescimento do PIB no horizonte de projeção, após um contributo aproximadamente nulo no período 2014-17 e negativo nos anos anteriores. O BdP explica esta inversão com a “melhoria da afetação dos recursos na economia, associada, nomeadamente à reorientação da produção para atividades mais produtivas e expostas à concorrência internacional, ao processo de desalavancagem financeira em curso e às reformas adotadas ao longo da presente década nos mercados de trabalho e do produto, bem como no sistema judicial”.

3 - Taxa de desemprego cai para mínimos de 2002

A recuperação do mercado de trabalho também deve começar a sentir-se de forma mais marcada na evolução dos salários e, em última análise, dos preços, considera o BdP.

A instituição projeta uma aceleração gradual dos salários nominais por trabalhador ao longo do período de projeção, “extensível ao setor privado e ao setor público”. E lembra que “no caso do sector privado, têm sido observados sinais de maior dinamismo nos salários no período mais recente”.

O BdP recorda ainda que a evolução dos salários em 2018 e 2019 “está também influenciada pelo aumento do salário mínimo, de 4,1% em 2018, cujos efeitos se dissipam em 2019”. Quanto a 2019, de acordo com as regras do Eurosistema, no cenário central das projeções não foi incluido o aumento pré-anunciado do salário mínimo para 600 euros mensais, “por não se tratar de uma medida especificada com suficiente detalhe”. Isto significa que a aceleração dos salários pode ser mais forte do que previsto pela instituição.

Para 2020-21 “projeta-se a continuação da trajetória recente de aceleração nos salários”, antecipa o BdP. E aponta que “no caso do setor público, o descongelamento gradual das progressões salariais na administração pública que teve início em 2018 refletir-se-á em aumentos dos salários até 2020. “Adicionalmente, em 2020 e 2021 assume-se uma hipótese de atualização salarial na administração pública em linha com as expetativas de evolução de preços”, indica a instituição. Ou seja, o BdP espera que, ao fim de largos anos sem atualização das tabelas remuneratórias, os funcionários públicos sejam aumentados em linha com a inflação.

Contudo, o impacto do aumento dos salários no crescimento dos custos unitários de trabalho “será relativamente moderado” no período de projeção, considera o BdP. Tudo porque “se projeta alguma recuperação da produtividade”.