IMPASSE EM ESPANHA

Iglesias força entrada no Governo, Sánchez segue inamovível. Novas eleições à vista?

Após o fracasso de mais um encontro entre Sanchez e Iglesias, o cenário de repetição de eleições a 10 de novembro ganha cada vez mais força <span class="creditofoto">Foto Juan Carlos Hidalgo / EPA</span>

Após o fracasso de mais um encontro entre Sanchez e Iglesias, o cenário de repetição de eleições a 10 de novembro ganha cada vez mais força Foto Juan Carlos Hidalgo / EPA

Após cinco reuniões entre os líderes do PSOE e do Unidas Podemos e quase dois meses e meio depois das eleições, não há acordo para a formação de um Governo. Esta terça-feira foi dia de extremar posições: os socialistas acusam Pablo Iglesias de se preocupar mais com nomes do que com políticas, o Podemos aposta tudo no chumbo da primeira investidura de Pedro Sánchez. Mas o PSOE avisa: “Não há segundas oportunidades”

Texto HÉLDER GOMES

“Espanha precisa de um Governo de coligação de esquerdas e esperamos convencer o PSOE a flexibilizar a sua posição. O entendimento de que o Governo tem de ser de partido único vai numa direção contrária à que os cidadãos votaram.” O líder do Unidas Podemos, Pablo Iglesias, saiu esta terça-feira da quinta reunião com o secretário-geral socialista e primeiro-ministro de Espanha, Pedro Sánchez, com uma réstia de esperança de conseguir chegar a acordo para a formação de um Governo saído das eleições de 28 de abril.

Mas a líder da bancada parlamentar e vice-secretária-geral do PSOE, Adriana Lastra, tratou de desfazer as malhas de um acordo nos termos que o Podemos reclama: “A reunião de hoje foi infrutífera. Parece que Iglesias se preocupa mais com os nomes do Conselho de Ministros do que com as políticas a adotar.” Após o fracasso de mais um encontro e a duas semanas da votação de investidura de Sánchez, numa sessão parlamentar que se realiza a partir de 22 de julho, o cenário de repetição de eleições a 10 de novembro ganha cada vez mais força.

IGLESIAS TERÁ EXIGIDO CARGO DE VICE-PRIMEIRO-MINISTRO

A pedra na engrenagem das negociações é a presença do Podemos no elenco governativo: Iglesias exige que ele ou outros membros do seu partido ocupem cargos ministeriais mas Sánchez tem rejeitado essa hipótese. Segundo fontes da direção socialista, Iglesias reivindicou mesmo o lugar de vice-primeiro-ministro neste quinto encontro. Na semana passada, Sánchez assumiu, em entrevista ao canal de televisão Telecinco, estar aberto à possibilidade de o Podemos designar ministros independentes “de reconhecido prestígio”, mesmo que próximos do partido.

A porta entreaberta por Sánchez, que lembrou que quatro ministros do seu Governo atual não têm filiação partidária, desenhava-se como uma solução de compromisso a poucos dias de mais uma reunião – em vão, como se viu. O Podemos continua a forçar a entrada num futuro Executivo. Por seu turno, Sánchez – que até ao momento, além da bancada socialista, só conta com o apoio do único deputado do Partido Regionalista da Cantábria – permanece inamovível na linha vermelha que traçou: o Podemos só poderá ocupar cargos intermédios ou designar ministros independentes. “Sánchez não quer que o Podemos, agora eleitoralmente mais fraco, reemerja mais forte num Ministério, ao estilo de Salvini em Itália com os proveitos que alcançou”, comenta ao Expresso o consultor espanhol de Comunicação Política Xavier Peytibi.

“NÃO TEMOS FEITO SENÃO FLEXIBILIZAR A NOSSA POSIÇÃO”

Os socialistas ainda parecem acreditar que o Podemos ceda à pressão e se sente a negociar um acordo programático. Mas, no final da reunião desta terça-feira, Iglesias atirou: “Nós não temos feito senão flexibilizar a nossa posição.” Anteriormente, já tinha vaticinado que “o acordo está mais próximo do que parece, ainda que seja preciso esperar dois meses e meio”. Sánchez reagiu então, afirmando que “Espanha precisa de um Governo em julho, não em agosto ou setembro”.

“Há dirigentes do Podemos que dizem não confiar no presidente [do Governo]. Essa é a melhor maneira de começar uma negociação?”, questionou-se a número dois do PSOE. E citou a ministra das Finanças, María Jesús Montero, para sublinhar que “não há segundas oportunidades”. “Não quero acreditar que Iglesias esteja a tentar impedir pela segunda vez que Espanha tenha um Governo de esquerdas”, lamentou ainda Adriana Lastra, referindo-se ao voto contra do Podemos na investidura falhada de Sánchez em 2016.

IGLESIAS “DEDICA-SE A DESQUALIFICAR” SÁNCHEZ

Fontes do Podemos, citadas pela imprensa espanhola, afirmam que o primeiro-ministro terá dito que conduzirá o país a novas eleições se não conseguir os apoios para a sua investidura. A líder da bancada parlamentar socialista nega com veemência a versão que foi posta a circular. “Há limites que, como vice-secretária do PSOE, não posso permitir. Para umas negociações vem-se com vontade de chegar a acordo. Se o teu interlocutor se dedica a desqualificar-te, isso significa que não tem vontade de o fazer”, disse.

Do outro lado, idêntico finca-pé. “Constatamos que Pedro Sánchez não quer negociar e tenta impor unilateralmente um Governo de partido único. Não é sensato que o PSOE aja como se tivesse maioria absoluta quando não a tem”, contrapuseram fontes do Podemos citadas pelo jornal “El País”. “Iglesias precisa do poder para mostrar ao seu eleitorado potencial o que pode alcançar e como um sinal de força. Claro que em eleições teria provavelmente piores resultados mas está a jogar a sua cartada, tal como Sánchez. Falta ver se haverá uma sexta reunião”, remata o consultor Xavier Peytibi.

Os votos do Podemos são imprescindíveis à recondução de Sánchez como chefe do Governo, depois de todos os partidos da direita terem confirmado que votarão contra. A soma dos deputados do PSOE (123) e do Podemos (42) fica 11 votos aquém da maioria absoluta (dez se se considerar o voto favorável do deputado da Cantábria). Essa maioria absoluta é necessária para que Sánchez seja investido à primeira volta no Parlamento. Mas, mesmo apoiado pelo Podemos, Sánchez terá de negociar o apoio de outros partidos ou, no limite, a abstenção destes numa segunda volta, quando apenas precisar da maioria dos votos expressos.