E se a Moderna gerir a Universidade do Porto?
“Isto não é a União Soviética”, terá sido o grito de guerra da equipa de missão criada por Carlos César para reeducar a ministra da Saúde, que num momento de fraqueza admitira que os hospitais públicos não devem ser geridos pelas empresas privadas que são seus concorrentes. Lembrada do que o Governo prometera a António Arnaut antes da sua morte, a ministra quis ser coerente com a noção de serviço público que um dia foi o orgulho da nossa democracia. Triste ilusão a dela. Reposta em pouco tempo a normalidade das coisas, a lei apresentada pelo PS voltou a ser aquele monumento à sensatez que se esperava, garantindo abençoados dois mil milhões de euros por legislatura para pagar o serviço dessas abnegadas empresas, além de muitas outras bengaladas no sovietismo, desde a recusa da provisão de financiamento adequado até ao enterro da ideia peregrina da qualificação dos profissionais de saúde. Uma multidão de circunspectos analistas saudou este saneamento, lembrando como seria chocante que a lei não previsse a gestão privada dos hospitais públicos, coisa por demais óbvia.
Permitam-me no entanto sugerir que este programa de salvação da pátria está incompleto e que o sovietismo ainda anda por aí disfarçado em diversas obscenidades. Até confesso, contristado, que um desses terrenos em que medra o sovietismo é a universidade. E já houve oportunidades para acabar com tal vergonha, o problema é que mesmo no melhor pano cai nódoa: quando os mais austeritaristas dos meus colegas economistas da Universidade Nova de Lisboa foram consultados pelos programadores da troika na sua primeira vinda a Portugal, esqueceram-se de lhes propor um sistema de parcerias público-privadas para gerir as universidades públicas, a começar pela sua própria. Seria uma ótima solução de mercado, já se sabe que o privado é que é eficiente, e era um alívio para estudantes e suas famílias. Querem lá ver que os malandrins só não são neoliberais em casa própria, lembro-me de ter cogitado à época. Pois agora, neste tempo claro em que César se levanta para espadeirar contra o sovietismo, é preciso voltar ao assunto.
O povo rejubila com a descoberta do caminho para a liberdade e exige: queremos privados a gerir as instituições públicas da saúde, da educação, da segurança social. Isto não pode continuar a ser a União Soviética!
Quero por isso deixar à consideração de César e dos seus legisladores uma ideia que certamente lhes agradará e que seria a homenagem merecida à exitosa experiência da gestão privada dos hospitais públicos: avancemos denodadamente para a gestão privada das universidades públicas. Era um sossego, uma paz de alma. Seriam umas centenas, que digo eu, uns milhares de milhões de euros bem empregados, tudo gente fina, estudante fardadinho, propinas adequadas, ensino temente, tudo como deve ser. Creio mesmo que era altura de entregar a Universidade do Porto à gestão da Moderna, a Universidade de Lisboa à gestão da Independente e a Universidade de Coimbra à Internacional. Uma lei do ensino que não reconheça e não estabeleça essa liberdade fundamental, que é o direito das universidades privadas gerirem as públicas, é a prova de que os tentáculos dos moscovitas ainda vergam a nossa pátria amada. César, acorde e ponha cobro a esta vergonha! E encha-se de coragem, vá mais longe, não deixe pedra sobre pedra no sovietismo.
Ora, pergunte-se também, e a segurança social, porque é que não há-de ser governada pelos fundos financeiros, que como se sabe são o auge da competência? Oliveira e Costa ou Dias Loureiro ou Duarte Lima, não estarão disponíveis para dar a mão à defenestração dessas bafiências moscovitas? O povo rejubila com a descoberta do caminho para a liberdade e exige: queremos privados a gerir as instituições públicas da saúde, da educação, da segurança social. Isto não pode continuar a ser a União Soviética!