Expresso

Amazónia como desculpa

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No final destas férias, tenho pensado bastante no documentário de Sanjay Gupta “A Nation Under Stress” (HBO), um dos grandes diagnósticos do mal-estar americano e ocidental. Isto porque este descanso físico e mental das férias é precisamente aquilo que grande parte da população ocidental não tem.

Abaixo de uma certa linha, a linha do lifestyle da classe média instagramada, o cenário é dramático e esse drama gerado pela pobreza explica os fenómenos “inexplicáveis” que continuam a chocar o instagram e o facebook da tal classe média e classe alta. Para mim, continua a ser estranha a forma como não se olha para a parte de baixo desta linha. Não se pensa e não se fala dos pobres que vivem ao nosso lado, pobres que estão a morrer numa epidemia de cirrose, ópio e suicídio. Não, não estou a falar dos indígenas longínquos da Amazónia, estou a falar dos pobres que nos rodeiam aqui nas nossas cidades, que servem cafés, que limpam as escadas, pessoas que não existem nos murais da indignação fácil (facebook) ou do lifestyle (instagram).

Não, não estou a falar dos indígenas longínquos da Amazónia, estou a falar dos pobres que nos rodeiam aqui nas nossas cidades, que servem cafés, que limpam escadas, as pessoas que não existem nos murais da indignação fácil (facebook) ou do lifestyle (instagram)

Continua a ser estranho ver como os assuntos da “natureza” têm prioridade sobre o colapso humano que vive ao nosso lado; pobres que vivem num estado permanente de stress, 24 horas por dia, 365 dias por ano, pobres que vivem sem uma ideia de emprego ou família e, como salienta Gupta, sem qualquer vislumbre de esperança. Acho bem que se fale do ambiente. O que estou a dizer é que a pobreza humana que nos rodeia - aqui e agora - não pode ter 10% da atenção que tem a Amazónia, que, neste quadro narrativo, funciona como um escape conveniente que evita a perceção e compreensão da pobreza que nos rodeia.