Turismo

Hotéis de Lisboa querem dar noite extra aos turistas para compensar falta de novo aeroporto

Raul Martins, presidente da Associação da Hotelaria de Portugal, sobre o aeroporto: “Não podemos agir como nos incêndios, ficar à espera para depois apagar os fogos” <span class="creditofoto">Foto Tiago Miranda</span>

Raul Martins, presidente da Associação da Hotelaria de Portugal, sobre o aeroporto: “Não podemos agir como nos incêndios, ficar à espera para depois apagar os fogos” Foto Tiago Miranda

Saturação da Portela ameaça fazer descer de 75% para 45% a ocupação dos hotéis

Texto Conceição Antunes

“A situação é grave.” A saturação do aeroporto de Lisboa, os atrasos e as incógnitas que ainda pesam sobre o novo projeto no Montijo levam a esta constatação extrema de Raul Martins, presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP) e dono do grupo Altis. “É urgente adotar medidas preventivas em relação ao aeroporto, o que não está no ADN do português. Não podemos agir como nos incêndios, ficar à espera para depois apagar os fogos.”

A AHP tem um conjunto de propostas que visam minimizar os impactos deste obstáculo ao crescimento turístico até o novo aeroporto estar operacional. Uma delas é alargar a permanência dos turistas em Lisboa através da oferta de uma noite extra nos hotéis. Segundo o presidente da associação, a ideia é que quem fique no mínimo três noites em hotéis a partir de três estrelas, tenha uma quarta noite paga pelo hotel. “Propusemos esta campanha, que está a ser estudada pela Associação do Turismo de Lisboa, com o objetivo de conseguir, com o mesmo número de passageiros, aumentar a estadia total”, explica Raul Martins.

Aumentar a permanência dos turistas em Lisboa é o objetivo da AHP <span class="creditofoto">Foto António Pedro Ferreira</span>

Aumentar a permanência dos turistas em Lisboa é o objetivo da AHP Foto António Pedro Ferreira

É uma espécie de milagre da multiplicação dos pães - e seguindo o mesmo princípio de conseguir crescimento turístico sem contar com a possibilidade de mais rotas do lado do aeroporto, a AHP também propõe que as companhias aéreas equacionem “aumentar a capacidade dos aviões, para que no mesmo 'slot' possa haver aviões maiores”. Raul Martins defende ainda que “a TAP precisa do fecho da pista 1735 para ter mais estacionamento de aviões, essa pista tem uma ocupação anual de 1%, é uma coisa que se pode fazer e depende do Governo”.

Lembrando que o aeroporto de Lisboa funciona como um 'hub' de distribuição de voos para todo o país, a associação hoteleira avança outra proposta, no sentido de reforçar a operação turística diretamente para as regiões e sem passar pela capital. “Se Lisboa vai ter dificuldades próprias, o Governo tem de criar mais incentivos para as companhias voarem diretamente para outros aeroportos do país, como no Algarve, Porto, Madeira e Açores. Há muitas companhias interessadas, 'low cost' e não só, em voar para esses aeroportos”, frisa Raul Martins. “A situação do aeroporto também pode vir a ser atenuada com o novo sistema de controlo de tráfego aéreo que fica operacional no final de 2020”.

Receitas dos hotéis sobem 12% apesar da ocupação estagnar

Os hoteleiros sentem cada vez mais na pele o travão de ter um aeroporto saturado, numa altura em que o turismo está a crescer a nível mundial. Raul Martins enfatiza que a ocupação em Lisboa este ano estagnou, e até setembro caíu 1,6%, enquanto o número de passageiros desembarcados aumentou 10%.

“Isto significa que a oferta hoteleira aumentou, e se continuar a crescer como até aqui, em quatro anos sobe 40%”, nota o presidente da AHP, frisando que se nada for feito a nível de expansão de capacidade do aeroporto, “a ocupação hoteleira média nacional, que atualmente é de 75%, pode baixar para 45%”.

Ter um aeroporto saturado numa altura em que o turismo está a crescer é cada vez mais crítico em Lisboa <span class="creditofoto">Foto Luís Barra</span>

Ter um aeroporto saturado numa altura em que o turismo está a crescer é cada vez mais crítico em Lisboa Foto Luís Barra

A nota positiva é que as receitas dos hotéis têm vindo a crescer. “Este ano a faturação aumentou 12% até setembro, apesar de termos tido a mesma taxa de ocupação, até com um ligeiro decréscimo”, refere o responsável da associação hoteleira, concluindo que “o preço médio em Portugal tem subido, uma conquista que resulta da melhor qualidade dos empreendimentos turísticos”.

Depois da Web Summit, vem aí o evento do Guia Michelin e os World Travel Awards

A AHP concorda com a duplicação da taxa turística em Lisboa, de €1 para €2 por noite, para que estas receitas possam reverter para a construção de um grande centro de congressos, há muito reclamado pelos agentes do sector.

“Essa foi uma condição para fechar o acordo com a Web Summit. Vamos poder ter grandes congressos, acima de 10 mil pessoas, que não cabem hoje na FIL”, refere Raul Martins, sustentando que um centro de congressos para acolher grandes eventos é uma necessidade sentida pela hotelaria, que já teve ocupações próximas dos 100% nos dias da Web Summit.

Até ao final do ano, Lisboa vai ser palco de outros eventos mediáticos, designadamente a apresentação do Guia Michelin de Portugal e Espanha, a 21 de novembro (que envolve um jantar para 500 pessoas), ou a final mundial dos World Travel Awards, conhecidos como os 'óscares do turismo', que decorre no Pátio da Galé, a 1 de dezembro.

“São eventos que vão trazer líderes de opinião do turismo e dão uma visibilidade grande ao destino. Para os hotéis são muito importantes, até porque decorrem fora da época alta”, sublinha Raul Martins, enfatizando aqui a importância de Lisboa ter um grande centro de congressos para poder atrair eventos de maior dimensão numa base regular.

“Esta negociação do presidente da câmara para a criação desta infraestrutura em Lisboa merece o nosso grande aplauso”, salienta o presidente da AHP, lembrando que o compromisso que ficou expresso com a Web Summit foi o de ter o novo centro de congressos pronto a funcionar em quatro anos. “Vai haver um salto em 2023, é o ano em que tudo se torna operacional, coincidindo com a duplicação da capacidade do aeroporto”, sublinha Raul Martins. “Até lá vamos sofrer, em especial a hotelaria de Lisboa”.

A AHP vai promover a 15 e 16 de novembro o seu congresso anual, que nesta 30ª edição decorre em Lisboa, no Pavilhão Carlos Lopes, em Lisboa. “Turismo: que futuro queremos?” é o tema do congresso, que vai integrar sete painéis que irão debater questões como o posicionamento de Portugal enquanto destino turístico, oportunidades e tensões que atravessam as várias regiões do interior ao Algarve, além das novas tendências. Na abertura do congresso vai estar presente o primeiro-ministro, António Costa.