Opinião

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Martim Silva

O Bloco está mortinho por ir para o governo (e isso é uma fraqueza, não uma força)

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A 10 de novembro de 2015, o Parlamento chumbava o programa de governo do segundo Governo de Passos Coelho e Paulo Portas e assistia à assinatura do acordo tripartido dos partidos da geringonça para viabilizar um inédito executivo socialista liderado por António Costa, com apoio parlamentar de PCP, Bloco de Esquerda e Verdes. Nascia a geringonça. Três anos depois, do palanque da Convenção do Bloco de Esquerda deste fim de semana, Mariana Mortágua formulava, de forma cristalina, o desejo e objetivo dos bloquistas: "queremos ser Governo? Sim, queremos. Se vamos ser Governo? Estamos prontos, camaradas".

Esta frase é todo um programa. Não se trata da repetida cassete comunista da disponibilidade para participação numa verdadeira solução governativa de esquerda. Não. O Bloco deu aqui, abertamente, um passo maior. Já não se afirma uma disponibilidade teórica de participação numa solução de governo. Diz-se, preto no branco, que o partido quer ir para o governo. Quer ter assento no Conselho de Ministros. Está mortinho por ter mais poder.

Nada contra, mas esta afirmação é reveladora de uma fraqueza não assumida.

Três anos depois da criação da geringonça, o Bloco é mesmo o partido que mais parece enamorado com esta nova realidade. Enquanto o PS vai afirmando que o que correu bem deve ser continuado. Enquanto o PCP e Jerónimo repetem a tal cassete eterna do verdadeiro governo de esquerda, os bloquistas atiram-se de cabeça.

A questão é perceber quanta água tem a piscina onde estes mergulham.

É o Bloco quem mais tem a perder nesta altura. O PS já sabe, com um ano de antecedência, que tem ali uma muleta

Vejamos o que dizem os números.

Nas legislativas de 2015 o PS teve 32,3% dos votos, o Bloco 10% e a CDU 8,2%. A última sondagem divulgada pelo Expresso e pela SIC, em setembro, dava 41,4% ao PS, 8% ao Bloco e 6,9% à CDU. Ou seja, só os socialistas aparecem hoje com uma claríssima subida face aos resultados eleitorais de há três anos. As restantes forças têm menos do que nessa altura. Pouco menos, mas ainda assim menos.

Claro que a proclamação pública de vontade e desejo de integrar um governo com o PS mostra que os bloquistas gostaram da experiência e que os pontos menos positivos são claramente menores do que as vantagens desta aliança. De outra forma, para quê prolongá-la e até aprofundá-la, indo para um governo?

Mas a revelação tão clara dos trunfos que o Bloco decidiu fazer nesta altura mostra uma outra coisa: chama-se fraqueza e receio de se tornar irrelevante.

É que o que os dados objetivos nos mostram nesta altura é que o PS pode estar à beirinha de uma maioria absoluta. E se a conseguir, mesmo que o Bloco seja chamado a participar na solução de poder, a sua real capacidade de influência seria muito mais reduzida. Mas mesmo que falhe a maioria absoluta, o PS já tem, a um ano de distância, um seguro que lhe garante a manutenção do poder.

Portanto, é o Bloco quem mais tem a perder nesta altura. O PS já sabe, com um ano de antecedência, que tem ali uma muleta. Basta precisar dela. Com esta confissão, quem perde poder negocial é o Bloco.

No fim de contas, o que parecia uma afirmação de força e de crescimento de um partido, não passa de um reconhecimento da sua fraqueza.