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Multinacional dinamarquesa de reboque portuário acusada de matar concorrência em Portugal com preços abaixo de custo

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O maior operador do mundo do sector do reboque portuário, que pertence ao mesmo grupo da Maersk, o mais poderoso transportador marítimo, está a fazer adornar as empresas nacionais

Texto José Manuel Mestre

A Rebonave, uma das empresas portuguesas em dificuldade, garante que há monopólio, abuso de posição dominante, preços predatórios, abaixo de custo, e violação das regras da concorrência, perante o silêncio das autoridades reguladoras.

As suspeitas de dumping, objeto de uma investigação SIC, foram proferidas na conferência Portos & Concorrência, organizada em Lisboa pela “Transportes em Revista”, onde o representante da multinacional dinamarquesa Svitzer admitiu que o preço é o aspeto fundamental para a sua empresa responder à procura dos clientes. “Quanto mais baixo melhor”, afirmou.

“Estamos a lutar contra um gigante, rico, e que tem uma política delineada, que é matar a concorrência”, acusa António Almeida, gerente da empresa nacional Atlantic Tugs, licenciada em Setúbal. Desde que a Svitzer chegou a Portugal, António Almeida já perdeu outra empresa, a Resistência, que não aguentou em Lisboa face ao poderio da multinacional. Garante que o concorrente dinamarquês “praticava e pratica” preços abaixo do custo. Apresentou uma queixa na Autoridade da Concorrência (AdC).

Neste momento já há quatro queixas que foram consideradas como denúncias pela AdC e já começaram a ser investigadas. A queixa de António Almeida ficou no entanto oito meses numa gaveta e só agora a Autoridade acusou a receção do dossiê, um dia depois da conferência em que foram feitas as denúncias e de a SIC ter perguntado pelo andamento do processo.

Empresa saída do estaleiros da Lisnave em grandes dificuldades

Em Setúbal a Rebonave já teve de despedir metade dos noventa trabalhadores. Nascida há três décadas, depois da privatização da Lisnave (que decidiu concessionar o serviço a um grupo de trabalhadores), a Rebonave viu anulado o contrato de operações navais no estaleiro da Mitrena. Depois de uma queixa da Svitzer, a Autoridade da Mobilidade e Transportes (AMT), que regula o sector portuário, considerou que o acordo entre os duas empresas privadas representava um monopólio e punha em causa o interesse público.

“Neste momento, fruto da decisão da AMT, estamos a ver a empresa extenuar-se, a acabar”, diz uma das fundadoras e presidente do Conselho de Administração da empresa. O diretor-geral, José Águeda Costa, garante que foi a abertura dos estaleiros da metalúrgica que conduziu a uma situação de monopólio da Svitzer: “vieram contratos globais, um negócio feito noutro país que tem efeitos no nosso”.

As leis da concorrência não permitem contratos globais, mas o operador português assegura que eles existem e retiram qualquer hipótese de trabalho às empresas nacionais: “quando o navio chega nós já não precisamos de oferecer serviços, porque eles já vêm contratados. E quando isso falha os preços não são comportáveis. Portanto, a concorrência já era!”

João Carvalho, presidente da AMT, mostrou-se surpreendido com uma notícia que no sector todos parecem conhecer. “Não temos conhecimento disso, estou a ouvir agora pela primeira vez”, disse o responsável pela entidade reguladora, enquanto garantia que o organismo só atua quando há queixas formais.

A Rebonave garante que já se queixou a todas as entidades e aguarda o desfecho de dois processos que decorrem em tribunal, um deles relativo a um concurso para reboque portuário na Base Naval de Lisboa em que a Svitzer é acusada de ter ganho com propostas abaixo do custo (dumping, à luz da legislação).

O diretor-geral da multinacional em Portugal, Rui Cruz, não se mostrou disponível para qualquer entrevista. Esre responsável respondeu por e-mail que desconhece qualquer investigação sobre as práticas da Svitzer em Portugal e diz que esta tem “um compromisso firme e incondicional com as melhores práticas e com o respeito pela lei”.

(A Investigação SIC sobre este tema será emitida esta segunda-feira no Jornal da Noite)