A tempo e a desmodo

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Henrique Raposo

Trissomia 21: o aborto não é sugerido, é imposto

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A eugenia não pode ser uma escolha humana

A eugenia não pode ser uma escolha humana

Foto Tiago Miranda

Nem sequer estou a falar desses paraísos muito progressistas e muito eugenistas e muito perfeitinhos e muito loiro-e-azul, como Islândia e Dinamarca, que impuseram a erradicação total das pessoas com trissomia 21, essas criaturas que colocam em causa a fibra do sangue da nação. Estou mesmo a falar de Portugal, país onde uma larga percentagem dos médicos e enfermeiros trata como loucos os pais que não querem fazer a análise que despista a trissomia 21.

A meu ver, é isto que falta na grande peça de Carolina Reis no Expresso de sábado. É que o aborto não é meramente sugerido pelas autoridades médicas, não surge como uma opção neutral dentro de um pacote de informação neutral; é imposto de facto, é imposto pela própria atitude do médico e do enfermeiro que encaram como “óbvio” o aborto daquele bebé; quando alguns pais (cerca de 18%, segunda a peça) desafiam este “óbvio”, que é um “óbvio” que aparece com os galões da ciência médica, são olhados de lado.

É a suprema hipocrisia: uma sociedade viciada na “diferença“ mata à nascença os bebés que são mesmo diferentes

Tal como na Islândia ou Dinamarca, não existe em Portugal uma lei a impor a eugenia, mas a eugenia é uma prática diária dos hospitais e, mais importante, na sociedade alargada que aceita esta inclemência genética. É a suprema hipocrisia: uma sociedade viciada na “diferença” mata à nascença os bebés que são mesmo diferentes. Os médicos e enfermeiros que impõem de facto o aborto dos bebés com trissomia 21 fazem parte de uma sociedade que acha que pode matar à nascença algumas “diferenças”.