A tempo e a desmodo

A tempo e a desmodo

Henrique Raposo

Já percebem Guantánamo?

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Uma coisa é afirmar que Guantánamo é inaceitável do ponto de vista moral. Obama tinha este discurso. Outra coisa, bem diferente, é perceber porque é que Guantánamo existe nas coordenadas sujas da realidade. Obama percebeu e não desmantelou a prisão, que serve precisamente para resolver o dilema que os europeus só agora sentem na pele: o que fazer com os nossos jiadistas que entram na categoria legal ou moral do apátrida? O que fazer com homens de um exército sem bandeira? O que fazer com pessoas perigosas que não são nem criminosos de delito comum nem soldados inimigos?

As repúblicas europeias não se podem reger pelos princípios de ditaduras ou semiditaduras como Paquistão ou Arábia. Se estes países não querem reaver os seus jiadistas, atirando-os para o buraco negro das Guantánamos, as repúblicas europeias têm o dever moral de repatriar os seus jiadistas: repatriar, prender, julgar, integrar

Repatriá-los é por inerência um ato perigoso. Ninguém os quer de volta por óbvias razões de segurança. Mas será aceitável deixar estes homens, mulheres e crianças num buraco negro? Não. Isto não é tanto sobre o querer, mas sim sobre o dever. Até porque há aqui uma diferença civilizacional que importa preservar. As repúblicas europeias não se podem reger pelos princípios de ditaduras ou semiditaduras como Paquistão ou Arábia. Se estes países não querem reaver os seus jiadistas, atirando-os para o buraco negro das Guantánamos, as repúblicas europeias têm o dever moral de repatriar os seus jiadistas: repatriar, prender, julgar, integrar. E, acima de tudo, têm o dever de acolher os seus filhos. Deixá-los lá é indecente na moral e imprudente na segurança.

Estas crianças são portuguesas ou belgas ou francesas. Estas crianças não pediram para entrar nesta triste saga. Repatriá-las é um dever moral e legal. Poderão ser uma ameaça de segurança, sem dúvida, mas recorde-se que os terroristas que atacam a Europa são sempre jovens que nasceram no dia a dia banal dos subúrbios das cidades europeias. Já cá estão. É daí que vem o perigo. Ademais, se abandonarmos estas crianças, o seu ressentimento será imenso e, mais cedo ou mais tarde, rebentará sobre nós.