Política

Almoço de Costa com autarcas do JPP provoca terramoto no PS-Madeira

António Costa com Paulo Cafôfo Foto Lucilia Monteiro

António Costa com Paulo Cafôfo Foto Lucilia Monteiro

O líder parlamentar demitiu-se e o presidente do partido está em silêncio, num momento em que decorrem as negociações para encontrar a coligação que deverá apoiar o independente Paulo Cafôfo para a Câmara do Funchal

Texto Marta Caires

O grupo parlamentar do PS no Parlamento regional está sem líder. Jaime Leandro apresentou a demissão depois do encontro de António Costa com autarcas do Juntos Pelo Povo (JPP), no qual se terá falado do apoio do partido à recandidatura de Paulo Cafôfo ao Funchal, o que foi entendido como uma intromissão de Lisboa nos assuntos dos socialistas madeirenses. Foi-o pelo menos por uma parte deles, na qual se inclui o líder da bancada parlamentar.

“O secretário-geral e primeiro-ministro devia saber que no PS-Madeira mandam os militantes da Madeira”. Jaime Leandro explica assim a sua demissão, por não aceitar encontros do seu líder com autarcas de um partido adversário ao qual se opõe todos os dias na Assembleia Regional. O socialista não diz, mas a verdade é que o JPP é uma das muitas dissidências socialistas dos últimos 40 anos. Em 2015, na primeira vez que se candidatou ao Parlamento, elegeu cinco deputados (tantos como o PS), com votos de um eleitorado que seria naturalmente dos socialistas.

Gerir o partido pelo Facebook

O líder da bancada parlamentar é próximo do presidente do partido na Madeira, Carlos Pereira, mas este ainda não comentou o assunto. Na verdade, nem estava na Madeira, já que é há dois anos deputado na Assembleia da República e gere o PS-Madeira à distância, sobretudo com notas e comentários no Facebook. A reação ao mais recente abalo no partido está prometida para esta sexta-feira. Não se sabe o que decidirá, nem o que dirá, embora seja cada vez mais persistente a ideia de que é tempo de deixar o lugar em São Bento para assumir a tempo inteiro a direção do PS-Madeira.

Carlos Pereira está, depois da demissão de Jaime Leandro, numa posição delicada. Dos cinco deputados que tem na Assembleia Legislativa, pelo menos um não está com ele: Vítor Freitas, antigo líder socialista. As relações com o presidente da Câmara do Funchal, que foi eleito numa coligação alargada que incluía o PS, não serão as melhores, e por várias razões.

Simpatias e antipatias

António Costa não esconde a simpatia que tem por Paulo Cafôfo, a quem anunciou há meses o apoio. Enquanto primeiro-ministro não tem faltado às inaugurações da Câmara Municipal do Funchal, mesmo às de pequena dimensão, como a loja do munícipe, e ao lançamento da primeira pedra de um conjunto habitacional.

Um apoio e uma simpatia que António Costa não terá por Carlos Pereira, o presidente dos socialistas madeirenses. A começar por um desentendimento que tiveram a propósito do cabeça de lista às legislativas nacionais de 2015. Lisboa quis impor Bernardo Trindade, mas o PS-Madeira bateu o pé e ganhou, depois de um desentendimento feio entre a Madeira e o secretário-geral do partido. O cabeça de lista foi o próprio Carlos Pereira. O resultado eleitoral não foi brilhante, embora tenho sido mesmo assim melhor do que o de Bernardo Trindade. O PS passou de um para dois deputados.

A verdade é que esse apoio de Lisboa dá força a Paulo Cafôfo que, mesmo mantendo-se como independente, tem liderado as negociações para a formação da candidatura da coligação à Câmara do Funchal, o que os críticos entendem ser uma competência do presidente do partido. Se é ou não, a verdade é que Cafôfo tem andado em negociações, até com o JPP. Élvio Sousa, o líder, confirma, mas adianta que a decisão de integrar uma eventual coligação ainda não está tomada. Os militantes decidem este sábado se vão em coligação ou isolados no Funchal e nos outros concelhos onde deverão candidatar-se nas autárquicas de 1 de outubro.

“Nada está ainda decidido”, insiste Élvio Sousa, para quem o almoço que provocou o abalo no PS-Madeira não passou de um gesto de cordialidade entre pessoas que se conhecem e se dão bem. O almoço entre António Costa e os autarcas do JPP – o presidente e os vereadores de Santa Cruz – não teve qualquer caráter político. “Foi mais de agradecimento pelo que o Governo da República fez a propósito do contencioso que existia por causa do PAEL”. Além disso, Filipe Sousa, o presidente da Câmara de Santa Cruz, e a António Costa conhecem-se desde os tempos em que o primeiro-ministro era presidente da Câmara de Lisboa.

Élvio Sousa admite, no entanto, que a questão da coligação para o Funchal foi falada mas não se negociou nada. “Foi um comentário dos muitos que se fazem à mesa entre pessoas que se conhecem e se dão bem”. Os socialistas como Jaime Leandro não entenderam assim, nem consideram que se trate de um almoço com motivos tão simples. Por isso demitiu-se e abriu o caminho a mais umas das muitas crises do PS-Madeira. O demissionário garante que “não virá mal ao mundo” com a sua saída e que a coligação no Funchal “está consolidada”. Roberto Almada, líder do BE na Madeira, diz o mesmo: que “tudo se vai aquietar” e as negociações vão chegar a bom porto.

A questão é que a realidade é diferente de 2013, tanto dentro do PS como entre a oposição e no PSD, não se sabendo por isso qual a extensão dos danos na recandidatura de Paulo Cafôfo. O homem que protagonizou a mudança no Funchal já não tem o apoio do PND, de Gil Canha, que chegou a ser vereador, nem do PTP, de José Manuel Coelho.