João Vieira Pereira

Opinião

João Vieira Pereira

Merkel, este é o país das maravilhas (onde a ilusão reina)

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Angela Merkel aterrou com a devida pompa reservada a chefes de Estado, num espetáculo que tem tanto de interessante como de bafiento. Recebida com natural desconforto por um crítico tornado amigo por via das circunstâncias, vem com uma missão claramente empresarial. A Alemanha é um dos nossos maiores investidores, principalmente na indústria, e, apesar de todas as dificuldades em investir neste pequeno pedaço de terra burocrática e tradicionalmente inimiga do empresário, os alemães são um oásis quando pensamos nas mais diversas empresas que nos últimos tempos têm escolhido o nosso mercado para colocar o seu dinheiro.

Merkel chega para falar com um Governo cheio de medalhas na lapela. Exibe-se como a esquerda maravilha que colocou as finanças públicas em ordem, como a esquerda responsável que teve o menor défice de sempre, como a esquerda fantástica que colocou como desígnio aumentar o nível salarial de todos os trabalhadores, como a esquerda desafiante que admite deixar a China controlar o mercado elétrico português. Tudo pronto para esfregar orgulhosamente nas pretensões alemãs, as mesmas que vão afirmar o quanto são amigas de Portugal e o quanto estamos de parabéns pelo incrível caso de sucesso.

Estar certo antes do tempo não é o mesmo que estar errado, mas é ingrato remar contra uma maré de gabarolas e demagogos com uma capacidade de visão inferior à de Mr. Magoo. Esta miopia contagiante terá um fim, esperemos que não drástico ou dramático, mas terá um fim quando a realidade nos expuser não como o país das maravilhas mas como a terra da ilusão.

Qualquer jogador pode pensar que é o melhor do mundo se jogar sozinho, mas é quando se compara com os outros que percebe em que campeonato pode jogar. E no do crescimento estamos perto da despromoção para a terceira divisão distrital

A confirmação pelo INE da diminuição do ritmo de crescimento não é relevante. Vamos voltar a crescer a um bom ritmo este ano. Mas o que importa é saber como estamos a evoluir em termos relativos. Qualquer jogador pode pensar que é o melhor do mundo se jogar sozinho, mas é quando se compara com os outros que percebe em que campeonato pode jogar. E no do crescimento estamos perto da despromoção para a terceira divisão distrital.

Temos o menor défice da democracia, mas é o sexto pior da zona euro. A dívida pública está em queda, mas é a medalha de bronze no pódio dos que mais devem. Vamos crescer 2,3% (ou qualquer valor próximo), mas é o sétimo pior registo entre os 28 países da União Europeia. Temos a taxa de desemprego mais baixa dos últimos 14 anos, mas temos o segundo menor crescimento de produtividade de toda a Europa.

Não devíamos estar contentes com o que conseguimos, mas tristes por sermos incapazes de fazer melhor do que os nossos pares. Os sorrisos no congresso socialista nada tinham a ver com o futuro do país. Eram apenas sorrisos de contentamento pela confirmação de que estão a conseguir vender tremoços ao preço do camarão de Espinho. Patranha com que esperam ganhar as próximas eleições. E, se pensarmos que no passado recente o Partido Socialista conseguiu duas maiorias absolutas com a mesma política, não espanta que agora também o consigam. O desfecho deste cenário já sabemos qual é. Prender com arames (conjuntura) as finanças públicas e esperar que o estouro caia no colo de outro partido qualquer.