MADEIRA
O que é que o JPP tem?
NOVIDADE Élvio Sousa, 41 anos, doutorado em História e a grande surpresa das regionais deste domingo FOTO TIAGO PETINGA/LUSA
Nascido de um movimento de cidadãos, o segredo do Juntos Pelo Povo, que elegeu cinco deputados na primeira vez que se apresentou a votos, está nas pessoas, na diversidade que junta e no carisma dos dois irmãos de Gaula, onde tudo começou
TEXTO MARTA CAIRES
O JPP, legalizado em Janeiro, estreia-se no Parlamento regional da Madeira com um grupo parlamentar de cinco deputados, tantos como os socialistas que, há 40 anos, tentam ganhar ao PSD. Com menos tempo, sem máquina partidária e menos dinheiro, o partido obteve um resultado surpreendente que obriga a que se olhe com atenção para o Juntos Pelo Povo nascido em Gaula de um movimento de cidadãos e em torno dos irmãos Élvio e Filipe Sousa.
Filipe Sousa, de 50 anos, é o presidente da Câmara de Santa Cruz, e foi por ele que tudo começou. Até a entrada do irmão mais novo na política se deve ao empenho deste funcionário da Empresa de Electricidade da Madeira, antigo deputado do PS e parte da alma e do espírito do JPP. A cara de bom rapaz, simpático e preocupado com as desigualdades sociais ajudou à eleição de Élvio Sousa, 41 anos, doutoramento feito em História, variante Arqueologia, e agora líder do quarto partido mais votado na Madeira. O segredo deste resultado? Élvio Sousa brinca, não revela a fórmula da “poção mágica dos druidas de Gaula”.
O movimento de cidadãos começou em Gaula, uma freguesia ainda rural de Santa Cruz, o segundo concelho mais populoso da Região, e foi apresentado a 4 de Abril de 2009, dia da Revolta da Madeira. O PSD dominava as juntas, as câmaras e o Governo e parecia impossível ganhar o que quer que fosse a Alberto João Jardim. O PS, então o maior partido da oposição, continuava entretido em lutas internas e Filipe Sousa, que tinha sido deputado socialista, bateu com a porta. “Sempre que se tentava traçar uma estratégia a discussão acabava em tachos e em lugares na lista de candidatos”.
FOTO TIAGO PETINGA/LUSA
Independentes, socialistas e até nomes vindos do CDS
Foi desta dissidência que surgiu o movimento Juntos Pelo Povo onde se uniram independentes, gente próxima dos socialistas e do CDS . Nas autárquicas de 2009, o PSD sentiu o primeiro abanão e perdeu a maioria na Câmara de Santa Cruz. Em Gaula, o JPP ganhou e a vitória, que parecia insignificante na altura, acabaria por determinar a política do concelho e da Madeira. Élvio Sousa era o homem na linha da frente quando os incêndios do Verão de 2012 lançaram o caos na freguesia.
O presidente da Câmara estava de férias no Porto Santo, enquanto os dois irmãos acudiam às pessoas, protegiam casas, apelavam à solidariedade e lançavam depois um plano de recuperação das habitações atingidas pelo fogo. O apoio aos desalojados dos incêndios era a parte mais visível do trabalho diário. A junta media a tensão arterial aos idosos, lia as cartas das Finanças, ajudava a resolver os pequenos contratempos diários e, se fosse o caso, ia para o campo cavar a terra com agricultores. O reconhecimento chegou quatro anos depois: o JPP ganhou a câmara e todas as juntas do concelho em 2013.
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Passar de movimento a partido
Filipe Sousa era agora um dos rostos da mudança na Madeira e o novo presidente da Câmara de Santa Cruz, mas a ideia de transformar o movimento num partido veio de Élvio Sousa. Por um lado, existia uma razão prática já que a lei extingue os movimentos de cidadãos no dia das eleições; por outro, havia a consciência de que era redutor limitar a Santa Cruz a participação política de todos os que se uniram em torno do JPP. Em seis meses, numa corrida contra o tempo, o partido estava legalizado, mesmo em cima do prazo para concorrer às eleições regionais antecipadas.
O JPP fez um empréstimo ao banco, fechou a lista sem caras conhecidas e foi para a campanha com o que tinha: os candidatos. As pessoas normais que sentiram que, ali, podiam ter uma participação política, sem os rótulos da esquerda e da direita. O partido uniu doutorados, gente com curso tirado no estrangeiro, técnicos médios, pequenos empresários, desempregados, professores, velhos e novos, quase todos ainda tímidos e pouco habituados a debates na televisão e ao contacto na rua. Todos, até Emília Patrícia, a candidata grávida de nove meses, vestiram a camisola verde e cantaram “este é o momento”, o hino que fica no ouvido.
O que não é de estranhar já que os dois irmãos têm gosto pela música. Filipe Sousa toca saxofone e fez parte de uma banda filarmónica; Élvio Sousa é o vocalista e guitarrista da banda SOS. A banda até esteve em Bruxelas a tocar para a comunidade portuguesa. Daí também se explica a alegria que acompanhou sempre a campanha eleitoral, onde, não faltou a animação de uma banda e o hino com aquele refrão “Juntos Pelo Povo chegou, este é o momento”. O resto fez com a simpatia, a correr becos e vielas, a entregar esferográficas e com Élvio Sousa a dizer que não podia fazer promessas.
Quanto Emília Patrícia, a candidata grávida, festejou no hospital a eleição de deputada e o nascimento da filha. O que é que tem o JPP? Ser feito por pessoas normais.
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Cinco votos para tirar a maioria absoluta ao PSD
A CDU vai tentar recuperar os cinco votos que lhe faltam para eleger o terceiro deputado. Se conseguir, o PSD perde a maioria absoluta no Parlamento regional.
A reunião da assembleia de apuramento das eleições regionais da Madeira, marcada para esta terça-feira, promete ser polémica já que a CDU está decidida recuperar cinco votos na verificação dos votos nulos e votos protestados. Estes cinco votos são os que precisa para eleger o terceiro deputado e, se conseguir, o PSD perde a maioria absoluta no Parlamento regional.
O último deputado a ser eleito nas regionais foi para o PSD, mas por escassos cinco votos. O número de votos que faltou à CDU para eleger o terceiro. Agora, Edgar Silva, o coordenador da coligação PCP e Verdes na Madeira, quer recuperar o que falta na assembleia de apuramento onde, por lei, se faz a verificação dos votos nulos e dos votos protestados.
Estas eleições regionais registaram um número anormal de votos nulos - mais de três mil - e a CDU acredita que muitos são votos válidos. A verificação dará mais votos às outras candidaturas, admite o coordenador, mas o caso da CDU é diferente: só precisa mesmo de cinco votos. O que torna também esta assembleia de apuramento um momento importante neste pós-eleições regionais.
Este domingo o PSD conquistou a 11.ª maioria absoluta nas eleições regionais da Madeira, mas apenas por um deputado.