Henrique Raposo

A tempo e a desmodo

Henrique Raposo

Homo sapiens vs. homo facebookiensis

Contactos do autor

Os cinquenta anos do “2001 – Odisseia no Espaço” permitem comparar dois tempos. Há cinquenta anos o Homem chegou à Lua num feito equiparável ao domínio do fogo, à invenção da roda ou, para citar Jean Jacques Arnaud, à descoberta da posição do missionário. Esta aventura científica fazia (e faz) lembrar os descobrimentos, animou a cultura, a cultura popular (George Lucas) e a cultura erudita (Kubrick). A Lua e a aventura espacial estavam no centro da imaginação coletiva – porque é que isso se perdeu?

O homo sapiens conseguiu aterrar um robô num asteróide e enviou uma sonda ao Sol, mas estes feitos não captam a imaginação coletiva do homo facebookiensis. De onde vem esta dormência?

O programa espacial de Marte não capta o entusiasmo das nossas sociedades. Passamos por cima de notícias notáveis: os japoneses conseguiram colocar um drone num asteroide. Não, não é a enésima balela do Michael Bay, é a realidade: há um robô humano na superfície de um asteroide. Isto não é acertar numa bala em movimento com outra bala: é fazer com que a segunda bala ponha a mesa e tome o chá das cinco na primeira bala. Há dias, a NASA enviou para o espaço uma sonda, a Parker, que se aproximará do Sol para assim conhecer melhor os segredos da nossa estrela, sobretudo os ventos solares. Mas repare-se no abismo entre feito e reconhecimento: o homo sapiens conseguiu aterrar um robô num asteroide e enviou uma sonda ao Sol, mas estes feitos não captam a imaginação coletiva do homo facebookiensis. De onde vem esta dormência?

Olhem pra cima! Foto D.R.

Olhem pra cima! Foto D.R.

Se passa o dia a olhar para baixo na direção de um ecrã, a sociedade não tem disponibilidade para olhar para cima. Se passa o dia inteiro soterrado em polémicas e indignações localizadas num mundo virtual que controla por completo, o indivíduo não liberta a imaginação para esta odisseia feita no mundo físico, um mundo que é exterior à vontade, opinião e likes de cada um. É uma odisseia, não uma ego trip.