Henrique Monteiro

Chamem-me o que quiserem

Henrique Monteiro

Causas e tribos: o ridículo a matar a política

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Vivemos hoje, e penso que isto é minimamente consensual, entalados entre causas que cada grupo defende e tribos que são defendidas por cada grupo. A visão comunitária, solidária, e fraternal das sociedades ressente-se, ao mesmo tempo que um sem número de ocorrências ridículas nos passam ao lado, enquanto uns senhores (e umas senhoras) decidem gastar parte das suas vidas em tais causas ou em defesa dessas tribos.

Vejamos um dos acontecimentos recentes. E falemos dele sem medo de ferir os adeptos do politicamente correto: um casal de homossexuais que se beijava num local público foi agredido por um conjunto de ciganos que por ali passava. Dúvida tribalista: Defendemos os homossexuais? Condenamos os ciganos? A resposta mais comum dos adeptos, propagandistas e sicários destas causas foi um eloquente silêncio.

E perguntarão: não podemos fazer ambas as coisas? É difícil, porque o direito de uns à sua sexualidade choca com o direito de outros à sua herança cultural. É sabido que a homossexualidade é ferozmente combatida no mundo cigano e eu temo que dizer isto seja ciganofobia, que por acaso existe e muito em Portugal. Muito mais do que a homofobia. Porém, se cada cultura (à exceção da que pode considerar-se, sem segundas leituras, normal), tem direito às suas idiossincrasias, como proceder? Eles que se entendam. Não sendo homofóbico nem ciganofóbico, penso algo simples. Os ciganos deviam ser condenados pela agressão. E, já, agora (e embora não sei se aplicável, porque não vi nem tenho relatos fidedignos) aconselhar-se-ia mais recato em atos de paixão, amor ou semelhantes, tanto a homo como a hetero ou outro prefixo qualquer do adjetivo sexual.

A importância crescente que vem desde a década de 90, tem destruído os laços comunitários, fomentado o aparecimento de cada vez mais causas populistas e o distanciamento cada vez mais grave dos cidadãos em relação à política

Mas não é apenas nas tribos que ficamos paralisados. Passemos às causas. Parece evidente que os animais domésticos abandonados não devem ficar pelas ruas, sujeitos à fome e aos pontapés de quem passa. Por isso, a maioria das Câmaras Municipais decide recolhê-los em canis, gatis ou o que for. Porém, surge o PAN com a mais do que bem-intencionada lei de proibir o abate de animais domésticos pelas Câmaras. Muito bem, só que as autarquias interrogam-se o que farão com o excesso de cães e gatos… E eu dou-lhes razão. É difícil manter bom-senso. O abate de animais domésticos existe por diversas razões, algumas veterinárias. Mas, também aqui, passemos à frente sem recordar que algumas das mesmas pessoas são intransigentes na defesa da eutanásia, que nada tem a ver com isto.

Há ainda a momentosa questão de os animais de estimação poderem entrar em restaurantes. 50 estabelecimentos piedosos decidiram abrir as suas portas a tais criaturas. Infelizmente, a receção do público a tão importante medida não existiu… ou quase. É certo que a ASAE já anda a investigar esses estabelecimentos, mas a verdade é que os seus proprietários, em declarações aos jornais dizem que nada se alterou e que os donos de animais – veja-se o desrespeito! – prefere ficar com eles nas esplanadas…

Nada disto é importante, dirão. Na verdade, nada disto tem importância, concordo. Salvo num aparente pequeno pormenor: a importância crescente dada a casos como estes, que vêm desde a década de 90, tem destruído os laços comunitários, fomentado o aparecimento de cada vez mais causas populistas e o distanciamento cada vez mais grave dos cidadãos em relação à política. Na verdade, já não há paciência, diria até pachorra, para este tipo de política.