FUTEBOL
Desportivo de Fátima à espera das boas graças de Alá
DESPROMOÇÃO No Estádio Municipal de Fátima, o padre António Pereira revelou que com uma equipa nova espera ver o Fátima de volta às provas nacionais já na próxima época FOTO TIAGO MIRANDA
A equipa outrora treinada por Rui Vitória desceu às distritais, mas a fé no regresso às competições nacionais mantém-se inabalável. O padre António Pereira, primeiro sacerdote a jogar futebol federado em Portugal, acredita que com a ajuda do empresário saudita Abdulmouti Kaaki e um investimento de 250 mil euros melhores dias virão
TEXTO ISABEL PAULO FOTOS TIAGO MIRANDA
Num ano de descalabro desportivo e financeiro, com dívidas acumuladas a jogadores, a empresas de construção e ao Estado, o centro Desportivo de Fátima acaba de ser despromovido para as competições distritais, um passo em falso que já não acontecia há 31 anos. António Pereira, natural de Valongo e pároco em Amiais de Baixo, em Fátima, há vários anos, é agora o presidente recém-eleito do clube, que no final da década de 2000 militou quatro anos na II Liga, tendo ao leme o jovem promissor Rui Vitória, o novo general da Luz.
“Isto é um pesadelo, mas acredito que, com uma nova equipa e trabalho dedicado, voltemos a subir depressa ao campeonato nacional de seniores”, diz o pároco que, a par da vocação para o sacerdócio, jogou a avançado no Fátima e no seminário menor local, para onde foi estudar aos 10 anos.
A derrocada da equipa que, em 2007/2008, disputou as meias finais da Taça da Liga com o Sporting, após a coroa de glória de ter arredado do caminho o FC Porto, começou com a saída do intrépido Rui Vitória para o Paços de Ferreira e a contratação do também benfiquista Diamantino Miranda.
“Um equívoco que custou muito dinheiro ao Fátima, até porque trouxe com ele uma dezena de jogadores do Benfica, caros para os nossos cofres e que, por motivos vários, não vingaram em campo”, lembra o padre, que no passado passou pela equipa diretiva do clube que subiu à II B, antes da era Vitória, e que no último ano integrou a Comissão Administrativa que assistiu impotente à agonia da equipa de Ricardo Monsanto, treinador que se manterá na casa mas com outras funções.
Esquecer o passado...
A pesada indemnização ao técnico Diamantino, a reabilitação e ampliação do Estádio João Paulo II, instalações onde jogam os 400 atletas dos escalões jovens e do pavilhão da bem sucedida equipa de futsal, a militar na I Divisão, e salários em atraso a jogadores levaram a então direção do clube a estabelecer uma parceria “desastrosa” com o empresário brasileiro Marcelo Martins.
“No início até penso que agiu de boa fé quando se comprometeu a investir 250 mil euros na criação da SAD, mas a verdade é que acabou por só injetar 30 mil e fugiu para o Brasil com as ações”, refere António Pereira. O diferendo não tem fim à vista, com trocas de acusações de burla e desvio de dinheiro e ameaças de morte entre o brasileiro que é agente não credenciado de jogadores e Sérgio Frias, ex-presidente do Fátima.
O padre António Pereira, formado em Teologia pela Universidade de Roma, afirma, contudo, que águas passadas não movem moinhos. Para enfrentar o futuro, o clube está a negociar um Plano Especial de Revitalização (PER) com os credores, que passa pelo pagamento das dívidas acumuladas em prestações mensais. O desbloqueamento da SAD passa agora pelas negociações, ainda em curso, “com o sheik árabe Abdulmouti Kaaki”.
...e fé no futuro
Segundo o sacerdote, trata-se de um empresário que detém uma Academia de Futebol, além de negócios de panificação e restauração, na Arábia Saudita, e que adora Portugal e futebol. A ligação ao futebol nacional começou com uma parceria, há dois anos, com o Louletano e que Kaaki quer alargar a outros clubes.
“É um homem muito sério que já conhecemos aqui em Fátima, que já nos ajudou na última época e está interessado em deter a maioria do capital da SAD”, diz o líder do Desportivo de Fátima. Além de investimento em dinheiro, o acordo para a próxima época passa pela colocação de mais jogadores de origem saudita e africana no clube, os quais se juntarão aos que já jogaram em Fátima esta época, Faisal e Assad.
Homem de muita fé, António Pereira acredita que irá ser capaz de limpar a imagem abalada do clube e, tendo por aliado o xeque árabe, virão as vitórias e os sócios que debandaram das bancadas do Estádio Municipal de Fátima. A renovada equipa sénior, em fase de construção, ainda está à espera do timoneiro que a orientará na época de todas as expectativas. O perfil ideal será o de alguém à imagem e semelhança de Rui Vitória, “um treinador exigente mas com sensibilidade e que queira apostar maioritariamente em jovens jogadores locais”, sublinha o sacerdote, que batizou as duas filhas do treinador do Benfica, no decurso dos quatro anos que residiu em Fátima.
Apesar do Estádio João Paulo II integrar centro de alojamento, onde na época passada residiam 20 jogadores, a direção da casa quer reduzir o número de internos para baixar as despesas de tesouraria do clube em época de crise.
A diferença de credos não aflige a direção do clube símbolo da cidade de culto de Nossa Senhora de Fátima: “Cada um tem direito a praticar a sua devoção. O senhor Kaaki respeita-nos e nós respeitamos as suas crenças. Tenho muita esperança que esta é uma aliança de futuro”. Que todos os santos ajudem.