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Antes pelo contrário

Daniel Oliveira

PS: o apetecível ovo de Colombo

Os economistas do PS apresentaram as suas propostas e previsões macroeconómicas. Os jornalistas apressaram-se a ligar o esquerdómetro e o direitómetro para saber para que lado caía o PS. Na realidade, o PS acerta, do meu ponto de vista (de esquerda), na necessidade de sair da austeridade por via do crescimento do mercado interno e do aumento do rendimento dos trabalhadores. Mas como não quer comprar guerras com ninguém, isso implicou uma enorme ginástica. Até com o rigor e com a verdade.

É claro que defendo o regresso do imposto sucessório para heranças maiores. É o imposto mais distributivo e só acabou porque, a dada altura, percebeu-se que, como só os pobres o pagavam, se tinha tornado regressivo. Mas quem julgue que vai ali buscar grandes receitas é melhor refazer as suas contas.

É claro que defendo a redução dos contratos a prazo. Não tenho é a certeza de que a sua substituição por contratos em que o despedimento é mais fácil e atrativo seja a melhor resposta.

É claro que, em teoria, um complemento fiscal para os salários muito baixos parece tentadora. Aumenta o rendimento das famílias mais pobres. O que, para além de ter efeitos imediatos no mercado interno - os mais pobres têm de usar tudo o que têm em consumo de produtos básicos, que ainda por cima têm uma componente importada tendencialmente menor - contribui para a igualdade. Mas, sem que se preveja um aumento do salário mínimo, o que se está a fazer é transferir, através de um subsídio a quem trabalha, os custos das empresas para o Estado. E isso até acaba por ter um efeito perverso na pressão sobre os salários praticados.

É claro que parece tentadora a redução dos descontos para a TSU dos trabalhadores. Mas ela é temporária e pode acarretar um corte futuro nas pensões de 2,7%. Já a das empresas é definitiva e será compensada pelas ilusórias receitas do imposto sucessório e pelo não cumprimento da promessa de cortar o IRC, feita por este Governo. As promessas já são contadas como receita.

Sejamos claros: o corte na TSU tem um efeito residual nas empresas e um efeito brutal no sistema de pensões. Promete-se a continuação do caminho da descapitalização da segurança social em nome de muito pouco.

O que os economistas do PS nos prometem é o ovo de Colombo: por via do complemento salarial e da redução da TSU para todos aumentam o rendimento dos trabalhadores ao mesmo tempo que reduzem os custos de trabalho das empresas. Enquanto transferem as despesas dos patrões para o Estado, já que nem tocam no salário mínimo, cumprem todas as metas orçamentais impostas pela Europa. Como conseguem tudo isto? Imaginando, tal como este Governo, taxas de crescimento muitíssimo superiores às previstas pelo FMI. Uma taxa de crescimento impossível com os níveis de endividamento público e privado que temos. E assim podem, como prometeram, acabar com a austeridade enquanto agradam a trabalhadores, patrões e credores, sem incomodar um pouco que seja as instituições europeias. Sendo tão fácil, custa perceber como ninguém se lembrou. O problema é que para agradar a todos teve de seguir atalhos.

O objetivo pretendido pelo PS está correto: apostar no crescimento do mercado interno por via de mais rendimento para os trabalhadores. Mas como quer não fazer escolhas nem ter qualquer oposição, chega lá de forma errada. E para lá chegar sonha com números impossíveis. Assim também eu.