TAP
David Neeleman diz que dinheiro chega entre hoje e quarta-feira
QUEM MANDA? O “trio da TAP”: Humberto Pedrosa, Fernando Pinto e David Neeleman FOTO TIAGO PETINGA/LUSA
Acionista privado da TAP desvaloriza parecer da ANAC, o regulador da aviação, que colocou a empresa em gestão corrente, e mantém a intenção de avançar com um empréstimo obrigacionista esta semana, "entre hoje e quarta-feira". "A empresa precisa de dinheiro", sublinhou
TEXTO Margarida Fiuza e João Palma-Ferreira
David Neeleman, que integra o consórcio Atlantic Gateway (com o empresário português Humberto Pedrosa), não deixou claro se a decisão da Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) - de colocar a TAP em gestão corrente - é impeditiva do empréstimo obrigacionista de 120 milhões de euros que estava previsto avançar agora. "O empréstimo chega amanhã, a empresa precisa de dinheiro", disse num encontro com jornalistas em Nova Iorque, reiterando que o prejuízo da TAP no ano passado foi "o maior dos últimos 15 anos". Ao Expresso, o empresário adiantou que o dinheiro deverá entrar entre "hoje e quarta-feira", no imediato, portanto.
Assim, ainda esta semana, os acionistas privados pretendem entrar com 90 milhões de euros de um empréstimo de 120 milhões. Só após o acordo final estar fechado com o Estado é que os restantes 30 milhões de euros serão, ou não, assumidos pelo Estado. Conforme o Expresso noticiou, esta é uma das cláusulas inscritas no memorando de entendimento assinado entre as partes. Ao Expresso, Neeleman adianta que o fecho do acordo com o Estado - que fará com que este fique com 50% do capital e os privados com 45% - deverá acontecer nos próximos 30 a 60 dias.
"Decidimos tudo em conjunto"
Questionado esta segunda-feira, em Nova Iorque, sobre o parecer que a ANAC comunicou na passada sexta-feira, David Neeleman mostrou-se confiante, acreditando que "tudo ficará resolvido" e que "não há dúvida nenhuma sobre quem esta controlar esta empresa". "Temos nove de 11 administradores que são europeus e David Pedrosa está lá (na TAP) todos os dias", sublinha o empresário norte-americano. "Decidimos tudo em conjunto", reforçou.
"A ANAC queria informações sobre quem estava tomando decisões na empresa, queria saber se eram os europeus", adiantou o empresário. E explicou: "Os chineses (HNA) investiram na Azul (23,7%) e a Azul vai investir na TAP".
Recorde-se que, de acordo com o memorando de entendimento assinado entre o consórcio e o Governo português, que o Expresso divulgou há duas semanas, “o Estado português autoriza desde já a entrada da HNA no capital social da Atlantic Gateway, em percentagem a acordar entre os acionistas da Atlantic Gateway e a HNA.” E mais: estando previsto o financiamento de 120 milhões de euros à empresa, dos quais 30 milhões pelo Estado e 90 milhões pelo consórcio privado, “o Estado português autoriza igualmente que a HNA possa vir a subscrever diretamente parte das obrigações”, sendo que “os direitos, que neste memorando de entendimento se referem à Azul, se referirão à HNA”.
Ou seja, o novo dinheiro que vai ser emprestado à TAP será chinês. E como essas obrigações serão transformadas em ações, a HNA poderá ficar indiretamente com 10% a 13% da TAP, embora a proporção tenha de ser definida de forma a não pôr em causa a regra de controlo europeu.
Sobre o encontro que decorreu esta segunda-feira na ANAC com Fernando Pinto, Neeleman desvalorizou: "A ANAC pediu a reunião. Queriam mais esclarecimentos. Vamos entregar as informações que estão pedindo. Mas não tenho dúvidas de que vamos trabalhar juntos para a melhoria da TAP", adiantou Neeleman aos jornalistas, em Nova Iorque, à margem do lançamento de duas novas rotas para os Estados Unidos (Nova Iorque - JFK e Boston). "Por respeito à ANAC, falámos com eles e informámos que íamos abrir estas rotas", referiu ainda Neeleman.
Regulador quer clarificar anterior modelo de privatização
A reunião entre Fernando Pinto e o presidente da ANAC, Luís Ribeiro, começou às 15h30 desta segunda-feira, em Lisboa. O objetivo foi debater a situação atual da TAP, após ter sido notificada sobre as medidas cautelares que lhe foram impostas na sexta-feira.
Durante um período de três meses, a ANAC aplicou um conjunto de medidas que impossibilitarão a administração da TAP de tomar "decisões de gestão extraordinária" que possam ter efeitos sobre a situação patrimonial das empresas que integram o grupo da transportadora aérea portuguesa - além da TAP, também incidem sobre a PGA.
Isto, na sequência da análise feita pelo regulador ao anterior processo de privatização, que lhe tinha sido comunicado pelo governo de Pedro Passos Coelho, em que os privados ficavam com 61% do capital. O novo modelo, em que o Estado fica com 50% do capital e os privados reduzem para 45%, ainda terá de ser comunicado à ANAC para que o regulador da aviação se pronuncie.
O objetivo destas medidas cautelares é salvaguardar qualquer alteração imprevista no universo empresarial da TAP até que a ANAC tenha concluído o parecer final sobre o processo de privatização da companhia.
Luís Ribeiro explicou ao Expresso que, "se durante o período de três meses a administração da TAP precisar de efetuar alguma operação que não se confine aos atos de gestão corrente, e que sejam imprescindíveis para a atividade diária e o desempenho normal da empresa, terá de pedir autorização explícita à ANAC, que ponderará as razões invocadas e tomará uma decisão sobre esses atos". Este foi um dos motivos, entre outros, que levou a equipa da ANAC a reunir-se com Fernando Pinto.
Indícios de desconformidade
Desde a passada sexta-feira que a ANAC informou a TAP e os seus acionistas que há “fundados indícios de desconformidade da estrutura de controlo societário e do financiamento” utilizados para controlar o Grupo TAP (e a PGA). Mais uma vez o regulador da aviação civil portuguesa explicou que o regulamento europeu aplicado ao transporte aéreo exige que o controlo das companhias aéreas europeias seja detido por cidadãos comunitários.
Embora o empresário português Humberto Pedrosa detenha a maioria do capital social da sociedade Atlantic Gateway, a ANAC quis ter a certeza que o sócio David Neeleman, que detém 49% do capital da Gateway, não controlava efetivamente esta sociedade.
No final de 2015, o regulador tinha manifestado esta dúvida num parecer prévio, e agora volta a invocar a mesma incerteza, que quer ver esclarecida a curto prazo. Como essa dúvida não foi resolvida, a ANAC decidiu aplicar medidas cautelares que limitam a atividade dos acionistas da Atlantic Gateway na TAP até a equipa de Luís Ribeiro redigir a decisão formal e final sobre a privatização da TAP.
No mesmo sentido, a Autoridade da Concorrência - que se pronunciou sobre a privatização da TAP, considerando que a compra da Gateway não tinha impacto na concorrência do sector -, admitiu que o empresário Humberto Pedrosa tinha as decisões condicionadas pelo sócio David Neeleman, apesar deste deter a minoria do capital social da Gateway.
No entanto, a 6 de fevereiro, os acionistas da Gateway assinaram um memorando com o Estado que deu resposta ao objetivo fixado pelo Governo de António Costa de recuperar o capital da TAP para o Estado. Por força deste memorando, a participação da Gateway será reduzida de 61% do capital da TAP para 50%, atribuindo 5% aos trabalhadores. O Expresso contactou o presidente da TAP, Fernando Pinto, sobre este assunto, mas o gestor recusou fazer comentários.