Chamem-me o que quiserem
Henrique Monteirohmonteiro@impresa.pt
30 Mil euros por mês… É justo? É muito? É pouco?
O Presidente da República, insuspeito de igualitarismo radical, afirma que não é desejável que um gestor de um banco público ou de um banco que tenha dinheiros públicos ganhe o mesmo do que os gestores de bancos privados. Aceito a ideia e compreendo-a. Não me parece normal, à primeira vista, que o presidente da CGD ganhe quatro vezes o salário do Presidente da República.
O primeiro-ministro, por seu lado, diz que até pode ser impopular um gestor da CGD ganhar tanto, mas não arrisca uma má gestão da CGD. Aceito a ideia e compreendo-a. Não me parece normal, à primeira vista, ir-se buscar um gestor competente e pedir-lhe que vá gerir um banco ganhando um terço ou um quarto do que ganhava, apenas porque o banco é público.
Em que ficamos? Pois não sei. Gostava de perceber, em primeiro lugar, para que serve termos um banco do Estado. Serve para regular o resto do mercado bancário? Mas isso também é função do BCE (para bancos grandes) e do BdP (para bancos pequenos). É para apoiar iniciativas dos empresários portugueses (desde que tenham pés e cabeça)? É para apoiar mesmo as que não têm pés e cabeça (como se fez com Berardo e outros)? É para as PME? É para empresas de cariz social?
Gostaria de assistir a um debate a sério sobre o assunto. Sem preconceitos, sem berros, sem acusações de estatista ou de neoliberal. Porque só depois de entender bem para que serve a CGD, por que motivo deve ser totalmente pública (e nem em parte privada), só depois de entender qual a sua missão principal é que se deveria definir o perfil do seu gestor e, em função desse perfil, o seu salário.
Vejamos: o salário do Presidente da República não é um grande salário. Qualquer quadro médio ou superior de uma empresa não estatal ganha o mesmo ou mais. O mesmo se diga do salário do primeiro-ministro (que mesmo assim é maior do que o do primeiro-ministro de Espanha). Digamos que Rajoy (78 mil euros/ano) tem um salário quase ridículo para o que se paga no seu país a qualquer quadro. Qual a razão, nesse caso, de nunca faltarem candidatos a primeiro-ministro (lá como cá) ou a Presidente da República? Eles não estão lá pelo que lhes pagam, mas pelo poder que têm. Esse é o verdadeiro incentivo, ainda que, pessoalmente, sustente que eles deveriam ganhar bastante mais, assim como os deputados e autarcas, de forma a não estarem tão dependentes de alguns favores (sendo certo que muitos, felizmente, aceitam ganhar pouco e não aceitam favores, nem influências de ninguém… mas o seguro morreu de velho).
O presidente da CGD parece lá estar apenas com o incentivo do salário. Afinal ele tem um patrão, que é o Estado - ou melhor: quem o representa, o Governo -, e pedem-lhe resultados que podem ser (e por vezes foram) de milhões de euros. Ou seja, o acionista Estado pede ao presidente da CGD praticamente o mesmo que os acionistas privados pedem aos presidentes do Santander, do BPI ou do BCP. Se é assim, não há razão para que ele tenha um salário menor.
Por exemplo, comparando uma coisa simples, o crédito a estudantes, ou seja empréstimos concedidos a quem quer tirar uma licenciatura, um mestrado ou um doutoramento, em Portugal ou no estrangeiro. A CGD concede esses empréstimos até 16 anos de prazo, com uma taxa entre 5,1 e 5,4%. O Santander (que é espanhol) concede-os até sete anos, mas com uma taxa mais baixa (de 4,2 a 4,7%). Pode preferir-se um banco ou outro, mas no fundo prestam serviços idênticos. E fui buscar um banco espanhol que empresta a estudantes portugueses e é, por acaso, o banco mais presente nas nossas universidades públicas e privadas.
Porém, se o cargo de presidente da CGD tiver outros contornos, que não meramente os de gestão de um banco, algo que fosse essencialmente social, ou corrigisse imperfeições do mercado, poderia fazer sentido o perfil do presidente não ser o de um banqueiro tradicional e, nesse caso, o salário não ser comparável ao dos bancos, mas aos dos ministros. Mais do que isso, poderia participar em decisões políticas com os seus conhecimentos técnicos e profissionais.
O problema, como quase sempre em Portugal, é que tendemos a ficar a meio da ponte. Temos um banco que quase todos acham dever ser público. E que faz ele? Essencialmente, o mesmo que os privados!
Faz lembrar a RTP, à qual pagamos uma taxa enorme (e onde as estrelas ganham bom dinheiro) para que faça, mais ou menos, o mesmo que já fazem os privados, para quem não se dá um tostão.
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Amanhã
ÓPERA
DILEMAS ALIMENTARES DE UMA MATRIOSKA
O Teatro das Figuras, em Faro, acolhe esta sexta-feira a ópera “Dilemas Dietéticos de uma Matrioska do Meio”, de Nuno Côrte-Real e António Durães. A narrativa começa com uma mulher russa que consegue emprego em casa da feminista Anna Filosofova (1837 -1912). O evento está agendado para as 21h30 e os ingressos custam €10.
CONCERTO
GRUPO SOLEO NO CCB
Esta sexta-feira sobe ao palco do Centro Cultural de Belém, em Lisboa, o grupo de músicos franceses Soleo. O evento realiza-se no âmbito do Big Bang – Festival de Música e Aventura para um Público Jovem, um projeto financiado pela União Europeia. O concerto mistura música contemporânea com percussão corporal e começa às 15h15. As entradas custam €4.
CONCERTO I
MARIA GADÚ APRESENTA NOVO DISCO
A música brasileira Maria Gadú sobe esta sexta-feira ao palco do Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães. No concerto irá interpretar músicas do seu mais recente álbum, intitulado “Guelã”. O espetáculo é às 22h e os bilhetes podem ser adquiridos a partir de €12,50.
LITERATURA
LEITURAS À LA CARTE
A Umbigo Companhia de Teatro promove esta sexta-feira, no espaço Com Calma, em Lisboa, mais um recital. Nesta sessão irão ser interpretados textos de vários géneros e o público também está convidado a participar. O evento está marcado para as 22h e a entrada é livre.