ANGOLA

O Presidente que se sucede sempre a si próprio

FOTO GETTY

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Pela sexta vez consecutiva, José Eduardo dos Santos é o candidato único à liderança do MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola. Há 37 anos no poder, depois de suceder ao histórico fundador e primeiro Presidente de Angola, Agostinho Neto, Dos Santos enfrenta atualmente uma dificílima situação económica, a contestação social de jovens ativistas e vozes críticas dentro do seu partido, dando sinais de incapacidade para conseguir uma renovação geracional no comité central do MPLA

TEXTO NICOLAU SANTOS

O Presidente angolano não pode ser seguramente responsabilizado pela quebra dos preços do petróleo que estão a afetar severamente a economia desde há um ano. Mas pode e deve ser responsabilizado pela total incapacidade dos sucessivos governos que liderou para apostar seriamente na diversificação da estrutura produtiva o que, se tivesse acontecido, diminuiria os impactos negativos da quebra das receitas do ouro negro.

Depois, o MPLA tem-se mostrado incapaz de satisfazer os anseios das gerações mais jovens, que não se reveem na longuíssima liderança de Dos Santos e no enriquecimento obsceno dos que lhe são mais próximos, enquanto a esmagadora maioria da população continua a viver com extremas dificuldades.

Essa geração já não acredita nas reiteradas promessas de José Eduardo dos Santos de que se vai retirar da vida política, agora em 2018. E não acredita porque, se era para se retirar, então deveria aproveitar este congresso do MPLA para o fazer. Sendo reeleito, será o candidato do partido às eleições presidenciais de 2017 para um mandato de cinco anos. Ora que sentido faz ser eleito para mais um mandato presidencial e abandoná-lo ao fim de um ano? O que pretende é passar o testemunho ao vice-presidente que vai escolher?

PARTIDO Delegados à entrada do VII Congresso do MPLA, a decorrer até este sábado em Luanda FOTO FRANCISCO BERNARDO/JAI

PARTIDO Delegados à entrada do VII Congresso do MPLA, a decorrer até este sábado em Luanda FOTO FRANCISCO BERNARDO/JAI

Bom, o problema é que José Eduardo dos Santos já teve vários delfins, apontados como seus futuros sucessores – e todos eles foram caindo em desgraça e afastados desse objetivo. O último foi Manuel Vicente, ex-presidente da poderosa Sonangol, que Dos Santos retirou do cargo para o colocar como seu vice. Contudo, um relatório dando conta que a Sonangol estava em falência técnica – e que só pode ter sido divulgado com a luz verde de Dos Santos – serviu para o afastar também da corrida à sucessão presidencial.

Nos últimos tempos, José Eduardo dá sinais de não confiar sequer na sua própria sombra e chamou para o comité central dois dos seus filhos – Filomeno dos Santos, presidente do fundo soberano de Angola, e Welwitchia dos Santos – deixando de fora Isabel dos Santos que, tudo o indicava, seria a preferida para o cargo que o presidente ocupa. Não por acaso, escolheu-a para presidir à comissão de reestruturação da Sonangol e ao plano de recuperação da cidade de Luanda – mas a contestação interna pode tê-lo obrigado a deixar Isabel fora do comité central do partido.

Em qualquer caso, é evidente que José Eduardo reforça, por via familiar, o seu poder político e económico em Angola, rodeado ainda por um “inner circle” de antigos camaradas de armas, hoje transformados em homens de negócios que beneficiam das benesses que só um Estado ultracentralizado pode proporcionar.

O que o presidente dá sinais de querer é uma sucessão completamente controlada, que o coloque a salvo de qualquer devaneio de quem queira investigar como o passado o poderá ter beneficiado e aos seus familiares do ponto de vista económico, locupletando-se com recursos do Estado. Mas como Dos Santos sabe que essa garantia não existe adia a sucessão enquanto coloca familiares em posições chave, que possam evitar incómodos futuros para si e para os do seu sangue.

É neste quadro que a demissão do ex-ministro da Educação, Ambrósio Lukoki, do comité central, com graves acusações ao “partido de obediência” em que se transformou o MPLA, pode representar um mau-estar alargado mas que não chega para colocar em causa o poder absoluto de que José Eduardo continua a dispor no partido e no país.

O certo é que, por tudo o que se tem passado nos últimos 37 anos, José Eduardo dos Santos só sairá do poder se e quando quiser. E será ele a escolher o seu sucessor, por muita coreografia que pretenda demonstrar o contrário.