Bernardo Ferrão

Andamos nisto

Bernardo Ferrão

A crise no Sporting e os políticos que temos

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Parece que agora é que é. Chegou o momento de acabar com a pouca-vergonha que rodeia o mundo do futebol. Não é mais tolerável este nível de violência. Na reação ao “choque” sportinguista, o discurso do “doa a quem doer” instalou-se na classe política. Mas o que vimos não foi bonito. Ferro Rodrigues parecia estar num mano a mano com Bruno Carvalho. António Costa em vez de areia, atirou-nos com mais uma entidade pública. Alguém acredita?

A política sempre se misturou com o futebol e raramente correu o risco de o hostilizar. Ninguém quer o papel do mau da fita. À luz deste quadro, o futebol ganhou um poder imenso, pouco ou nada escrutinado. O que vimos na Academia do Sporting choca-nos porque nos põe frente a frente com o que tem sido desvalorizado. Tirando Rui Rio que fechou as portas da câmara ao clube da cidade - é verdade que o fez também para capitalizar politicamente -, quantos tiveram a coragem de enfrentar o submundo da bola? Só me lembro da justiça.

Os acontecimentos de Alcochete puseram todos os políticos a falar. A declaração de Ferro Rodrigues foi a que mais me impressionou. No mau sentido. Ferro pôs-se ao nível de Bruno. Deixou que a raiva do adepto se sobrepusesse ao discurso institucional do Presidente da Assembleia da República. A segunda figura do Estado não soube separar as águas, deveria ter usado o seu peso institucional para se insurgir contra as continuadas omissões dos governos. Os políticos que tanto gostam de ser vistos na tribuna dos estádios têm de agarrar o problema como se fez noutros países. Em vez disso, atiram mais do mesmo para a praça pública: prometem-nos consequências e mais uma entidade. Afinal para que serve a Alta Autoridade para a Violência no Desporto? Ninguém sabe. Desconfio que nem mesmo o governo.

No Euro 2004 mostramos ao mundo como é possível organizar um campeonato ao mais alto nível e com gente de todas as paragens. Mas tirando essa medalha que trazemos ao peito, Portugal tropeça na violência que tomou conta do desporto. Podem dizer-me que lá fora é igual, mas não deixarei de me impressionar com a loucura em dia de jogo. Claques enfurecidas em “caixas” policiais. Estações de serviço que se não estiverem carregadas de polícia são vandalizadas. Agressões a árbitros, ameaças a jogadores, um adepto italiano morto em guerras de claques. E agora Alcochete. O mais incrível é que perante este cenário de guerra só 18 adeptos estão proibidos de entrar nos estádios portugueses. Dezoito!

A Associação Sindical dos Profissionais da Polícia perguntava como é possível que em alguns jogos estejam escalados mais de 600 agentes. De facto, só falta mesmo começar a convocar os snipers. O problema é que a pontaria não pode ser feita apenas às claques, os líderes dos clubes também têm de estar no alvo. Bruno Carvalho veio das claques e são elas que lhe alimentam o poder. Só assim se percebe a benevolência do (ainda) presidente sportinguista. Se processou tudo e todos, porque não o fez com os adeptos que lhe entraram em casa?