MÚSICA
A história desoladora de Sinéad O’Connor
MENSAGENS PREOCUPANTES Nos últimos meses, a cantora tem chegado às capas dos jornais pelos piores motivos. As mensagens que publica no Facebook espelham um estado de angústia e possivelmente de doença mental grave FOTO GETTY IMAGES
A cantora do êxito mundial “Nothing Compares 2 U” está a preocupar: este domingo voltou a desaparecer, como já acontecera em novembro passado, e a deixar mensagens de teor suicida nas redes sociais. Tudo terá que ver com uma batalha legal que Sinéad está a travar pela custódia dos filhos mais novos, mas também com a ainda mais séria luta contra as doenças mentais que a consomem há anos
TEXTO MARIANA LIMA CUNHA
Na página de Facebook oficial de Sinéad O’Connor ninguém sabe o que pensar. Os comentários mais populares espelham a confusão: enquanto uma fã demonstra apoio e garante à cantora irlandesa que “não está sozinha” e que “ter uma doença mental é horrível”, outra considera que “a razão pela qual a Sinéad está a publicar todas estas cartas abertas é para ter provas de que lutou” e que “não está à procura de atenção, sendo na verdade uma mulher muito inteligente”.
Afinal, o que é que se passa com Sinéad? O mundo preocupou-se este domingo quando a cantora irlandesa, que atualmente vive em Chicago, desapareceu pelas 06h para dar uma volta de bicicleta e não voltou. Duas horas depois, a lista de motivos para alarme crescia e Sinéad fazia uma publicação no seu Facebook em que acusava o seu filho mais velho, Jake, que vive na Irlanda, de ter feito mal ao irmão mais novo e à mãe e de ser “literalmente criminoso”.
Sinéad acabou por aparecer esta segunda-feira, depois de a polícia ter sido avisada e de ter considerado que a cantora se encontrava em perigo por apresentar “tendências suicidas”. Mas o retrato do desaparecimento de Sinéad não fica por aqui: para percebermos o que a levou a desaparecer e a fazer graves acusações ao próprio filho temos de olhar para o historial da cantora - um historial de desentendimentos familiares, discussões tornadas públicas, doenças mentais assumidas e muitas ameaças de suicídio.
Corria o ano de 1990 quando Sinéad, que até então não era uma cantora reconhecida, gravou a sua versão de “Nothing Compares 2 U”, uma música inicialmente composta por Prince para a banda “The Family”. Foi esta gravação, incluída no seu álbum “I Do Not Want What I Haven't Got”, que disparou Sinéad para o estrelato, sendo ainda hoje considerado o maior sucesso da cantora de 49 anos. Desde então foram muitos os fãs que a acompanharam, e para estes não será uma novidade se escrevermos que Sinéad tem batalhado contra doenças mentais e admitido esta luta de forma pública.
https://t.co/PXMq5bbMBz nothing compares to u # Sinead
— Lexia Caper (@catbirdsuite) 16 de maio de 2016
Conforme recorda a NBC Chicago, a primeira referência a estes problemas mentais foi feita numa confissão a Oprah Winfrey. Nessa entrevista de 2007, Sinéad admitiu uma tentativa de suicídio ocorrida no seu 33º aniversário, em 1999. Depois, em 2011, os problemas de saúde mental da cantora voltaram às capas de jornal quando Sinéad publicou uma série de mensagens de teor suicida no Twitter e os fãs chamaram a polícia para a ajudar.
Desde o ano passado que as mensagens de Sinéad se têm tornado mais recorrentes, referindo com frequência os seus familiares, que culpa pelo seu estado de fragilidade emocional. A cantora tem quatro filhos - Jake, de 28 anos, Roisin, de 18, Shane, de 12, e Yeshua, de apenas 10 anos - e frequentemente fala deles nas publicações que aparecem no seu Facebook oficial, referindo também os nomes do seu ex-marido John Reynolds (pai de Jake) e do seu próprio pai, que acusa de ter “iniciado” os maus-tratos de que diz sofrer desde muito nova e de “ter feito o mesmo” à mãe de Sinéad. “Mas eu sou mais forte do que ela e vou aguentar”, garante a cantora numa das mensagens mais recentes.
Gostei de um vídeo @YouTube https://t.co/XRc0H74AXtéad O'Connor - Fire On Babylon [Official Music Video]
— Róbe (@Robsonrpr) 17 de maio de 2016
Para alguém que não conheça a árvore genealógica de Sinéad e não tenha acompanhado os acontecimentos mais recentes na vida da cantora, será difícil acompanhar a sucessão de publicações que culminaram no seu breve desaparecimento este domingo. Neles, Sinéad revela que desde o ano passado se encontra em Chicago a recuperar de uma operação cirúrgica complicada em que lhe foi removido “todo o aparelho reprodutor” e que para facilitar a recuperação os seus filhos mais novos, Shane e Yeshua, terão ficado na Irlanda, ao cuidado do irmão mais velho, Jake, e do pai deste, John.
E de acordo com a cantora irlandesa, foi aqui que começaram os problemas. Sinéad acusa Jake e John de terem abandonado os membros mais jovens da família ao cuidado dos serviços de proteção de menores irlandeses enquanto ela está noutro continente e não consegue agir legalmente. Em novembro passado, a cantora também chegou a desaparecer e a anunciar no Facebook que a “crueldade da família” a levara a instalar-se num hotel desconhecido sob um nome falso e a tomar uma overdose de comprimidos, esperando morrer em breve. Na altura, os fãs uniram esforços e a polícia conseguiu localizar e hospitalizar Sinéad.
ÊXITO MUNDIAL Sinéad O’Connor chegou ao topo das tabelas mundiais com “Nothing Compares 2 U”, uma música composta por Prince, em 1990 FOTO NICHOLAS KAMM/AFP/Getty Images
Desta vez, duas horas depois de desaparecer, Sinéad escreveu no Facebook, numa carta aberta dedicada ao filho mais velho: “Vai a tribunal e tira a custódia do teu irmão à Tusla [serviço de proteção de menores da Irlanda] (...). É melhor trazeres o teu próprio advogado. E não voltes a abandonar o teu irmão ou qualquer outro dos meus bebés de novo. O que fizeste ao teu irmão e à tua mãe é literalmente criminoso”. Depois, a cantora partilhou uma citação da abolicionista americana Harriet Tubman que dizia: “Tenho direito a uma destas coisas: morte ou liberdade; e se não posso ter uma, então terei a outra”.
Felizmente, Sinéad acabou por ser encontrada no dia seguinte, durante a tarde de segunda-feira, tendo a polícia de Chicago anunciado que a cantora já não se encontrava na lista de “pessoas em perigo ou desaparecidas”, conforme relata a NBC Chicago. Segundo uma amiga próxima citada pela televisão, Sinéad terá sido encontrada “a salvo” no hotel Best Western, próximo da área em que desapareceu, que rapidamente ficou rodeado por veículos da polícia e ambulâncias.
Sinéad está bem. Que bom. https://t.co/mVMmckxLBM
— Eduardo Aguiar (@aguiaredu) 17 de maio de 2016
Mas a novela de Sinéad, que ninguém sabe se tem fundamentos reais ou se faz parte de problemas mais profundos de saúde que a cantora precise de tratar, continua. Escassas horas depois de ter sido encontrada, Sinéad voltou a fazer uma publicação no seu Facebook, desta vez dirigida ao pai do seu filho mais velho, a quem dedica duras palavras. “Diz a esse teu filho cruel que uma pessoa com dois problemas de saúde, sendo que as tendências suicidas são sintoma de um deles, não está a ser manipuladora se ameaça matar-se enquanto ele a maltrata e age como um chauvinista”, escreve Sinéad. E as acusações vão mais longe: “Vocês abandonaram-me por eu ser suicida. Deixaram-me a morrer. Rezem que eu morra, porque eu vou processar-vos a todos se sobreviver a isto”.
Na mesma publicação, a cantora adianta que nunca recebeu “um cêntimo de nenhum dos pais dos filhos” e recorda histórias antigas e de uma violência percetível: “Tu e o meu pai deixaram-me no hospital para me livrar do meu filho [Jake]. Quantas mulheres já forçaste a abortar contra a sua vontade? Continuas a contá-las?”.
“Explica ao Shane e ao Yeshua porque é que a mãe desapareceu, seu criminoso ingrato e mentiroso. Tu mataste a tua mãe, fizeste-a fugir para outro continente. Tu é que precisas de um psiquiatra.” Nos comentários, os fãs mostram-se preocupados com Sinéad e se alguns se juntam no coro de insultos aos seus familiares para mostrar apoio, a maior parte só deseja que a cantora recupere e volte a sentir-se bem: “Sinéad, és uma pessoa linda, por favor combate esses fantasmas e dá a volta por cima”.