Ricardo Costa

Opinião

Ricardo Costa

O que o Brexit devia ensinar à Catalunha

Contactos do autor

Há poucas coisas mais poderosas numa sociedade que os sentimentos nacionalistas. Não precisam sequer de ser sentimentos extremados para literalmente moverem multidões e, por vezes, mudarem a História. Sempre assim foi e provavelmente sempre assim será. Mas seria natural que uma boa dose do nacionalismo fosse aclamada ou mitigada pela democracia e, no caso da Europa, pela União Europeia.

O que me intriga nos últimos anos no movimento nacionalista e separatista da Catalunha - além de uma razoável mistificação da história da região, que é compreensível - é exatamente o facto de muita gente transportar para os dias de hoje um argumentário que deixou de fazer sentido com a morte de Franco e o de ignorarem as alterações que a UE trouxe ao continente no pós-guerra, a começar pela paz e a acabar na institucionalização das chamadas democracias liberais. Isto, num continente onde a democracia e a paz não têm uma história particularmente longa ou feliz.

Na Catalunha são muitas as vozes que se inspiram no caso escocês, que teve direito a um referendo constitucional e legítimo. Mas são muito poucas as que olham para o desastre do Brexit e as incríveis consequências que já traz ao dia a dia dos britânicos, desde a falta de mão de obra na agricultura, há saída de instituições, à imigração qualificada que está a cair a pique.

Aqueles dias de saída massiva de empresas da Catalunha para Madrid foi um pequeno exemplo - que sempre tinha sido negado pelos separatistas - do que pode ser uma separação de Espanha. Mas quem vá vendo o dia a dia do Reino Unido tem uma imagem muito clara do que poderia ser uma Catalunha fora da UE, com a vantagem extrema de sempre ter tido moeda própria.

O Brexit está a ser uma desgraça para o governo inglês, para a administração pública britânica e para grande parte das empresas. Cada diz que se avança, surge um novo detalhe, um novo problema, um contratempo para aumentar uma conta de “divórcio” bilionária e uma conclusão que tenta fazer uma quadratura do círculo: os britânicos querem ter acesso ao mercado único, querem livre circulação de serviços e de capitais, mas não de pessoas. As quatro coisas andam juntas e não fazem sentido uma sem a outra.

Da mesma forma, a UE é uma união de países onde só entram convidados por unanimidade. A separação de Espanha seria um Catalexit sem moeda (que teria de ser criada) e sem acesso direto ao mercado europeu, nem a nada do que isso implica. Tudo teria que ser desenhado de novo e a Catalunha não é o Reino Unido nem sequer pode sonhar com um regresso aos tempos do Império. Os britânicos - alguns - ainda se podem agarrar a esse saudosismo. Os catalães nem isso.

É claro que a vontade popular é imparável e que a atual arquitetura política espanhola não consegue olhar com seriedade para estes problemas. Se não evoluir para uma federação, tarde ou cedo o país pode implodir para os nacionalismos terem as suas vitórias. Mas é bom que vão seguindo a par e passo o Brexit porque é o melhor mapa (numa versão muito soft) do que terão pela frente.