TRABALHO

Sindicalização em queda livre

SINDICATOS Para os autores, as estruturas que representam os trabalhadores têm de se aproximar dos movimentos sociais espontâneos FOTO TIAGO MIRANDA

SINDICATOS Para os autores, as estruturas que representam os trabalhadores têm de se aproximar dos movimentos sociais espontâneos FOTO TIAGO MIRANDA

Em 34 anos, a taxa de sindicalização em Portugal desceu 41,8 pontos percentuais. E, numa semana em que os transportes voltam a marcar a agenda nacional com paralisações, um artigo inédito, coassinado pelo ex-secretário-geral da CGTP Manuel Carvalho da Silva revela as grandes dúvidas dos especialistas quanto ao futuro das estruturas sindicais.

TEXTO CHRISTIANA MARTINS

O Governo já está preocupado com a anunciada greve de dez dias da TAP — a começar no simbólico Dia do Trabalhador, em pleno período de privatização da companhia aérea —, ainda não resolveu as paralisações nos caminhos de ferro e tem conseguido adiar a greve do metropolitano de Lisboa com a fixação de serviços mínimos. Visto à distância, o sindicalismo parece gozar de boa saúde. Observado mais de perto, contudo, não é possível esconder os evidentes sinais de falta de vitalidade.

Intitulado “O futuro do sindicalismo na representação sociopolítica” o texto assinado pelos sociólogos Elísio Estanque, Hermes Augusto Costa e Manuel Carvalho da Silva, também ex-secretário-geral da CGTP e apontado como um possível candidato à Presidência da República, apresenta como preocupante a evolução da taxa de sindicalização em Portugal e na Europa.

A primeira frase do artigo, ainda inédito mas que faz parte de um livro sobre “o futuro da representação política democrática”, organizado pelo sociólogo André Freire e a ser publicado em breve, não deixa margens para dúvidas: “O desafio que este texto se coloca é o de abordar perspetivas do futuro do sindicalismo nas sociedades contemporâneas”. Os autores alertam à partida que “estamos perante expressões que configuram um novo ciclo de barbárie mercantilista, em vários aspetos, semelhante ao dos tempos analisados por Marx”.

Os bons e os maus

O exemplo positivo e a exceção vêm da Alemanha, onde “o sindicalismo 'aguentou-se'”. A solução encontrada foi a da participação das estruturas sindicais na cogestão das empresas, o que, explica o artigo, “permitiu a defesa das remunerações elevadas e a associação às mesmas de um esforço por parte dos assalariados em matéria de produtividade, organização do trabalho e de acolhimento das novas tecnologias”. Outro sinal de vitalidade chega de lugares insuspeitos quanto às condições de trabalho, como a China, onde “o sindicalismo, com graus diferenciados de autonomia e liberdade, começa a organizar-se como movimento social autónomo”.

Portugal não foge às tendências, pelo contrário. Enquanto nos países nórdicos, os níveis de sindicalização rondem 70% (Suécia 68,8%, Dinamarca 67,6%), a tendência de retração atravessa o continente europeu. Com os autores a afirmarem que o recuo é “particularmente evidente na Europa do Sul e na Europa do Leste”. no caso português, os decréscimo do número de trabalhadores sindicalizados tem-se acentuados nos últimos trinta anos.

As explicações para esta quebra passam, por exemplo, pela diminuição do setor industrial ou do próprio número de portugueses empregados, sem que os autores deixem de apontar o dedo à presença da Troika em Portugal. A surpresa vai para a inversão na tendência verificada em 2011 e 2012, quando se registaram mais sindicalizados do que nos anos anteriores.

Elísio Estanque, Hermes Augusto Costa e Manuel Carvalho da Silva apontam saídas, mas sublinham, sobretudo, o “quadro de urgência e de necessidade das classes trabalhadoras e seus setores mais precários que o sindicalismo ao serviço de um ideal transformador deve direcionar as suas principais tarefas”. E da leitura do artigo, fica claro que 665 mil trabalhadores sindicalizados em Portugal são poucos para reivindicar as soluções de que precisam os 770 mil desempregados e os 4,5 milhões de trabalhadores do país.