Ricardo Costa

Opinião

Ricardo Costa

Boletim meteorológico do OE

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Tenho grandes dúvidas em perceber o esforço que jornalistas, comentadores e políticos colocam sobre as dificuldades da aprovação do Orçamento do Estado. Não porque o tema não seja importante, mas pela óbvia razão de a história recente nos mostrar que há sempre acordo sobre o documento.

Quando li a manchete do Expresso da última semana – onde Jerónimo afirmava que o ambiente da negociação estava toldado – tive a reação clássica nestes casos. Sim, está toldado – e o termo escolhido por Jerónimo é bom –, mas no fim haverá acordo. Tenho algum dado atual para sustentar a minha opinião? Não. Mas há dois fatores que tornam a aprovação inevitável, e por arrasto sustentam a minha posição. O primeiro é o ciclo político que os partidos à esquerda assumiram e que dificilmente poderia redundar numa quebra da legislatura; o segundo é as consequências eleitorais que uma antecipação da ida a votos teria.

Esta progressiva separação [do PCP e do BE] dificilmente será consumada com uma não aprovação do Orçamento. Seria um mais que provável suicídio político para quem provocasse o chumbo. Centralizava o PS, sem dúvida, mas trazia de volta o voto útil e em força

É óbvio que o entusiasmo do processo da reposição de rendimentos e de algumas reversões já não existe. O que foi acordado entre PS, PCP e Bloco está genericamente cumprido há algum tempo. Sem esse programa, as negociações ficam mais difíceis, têm objetivos muito mais difusos e um espectro alargado de temas. Ou seja, serão progressivamente mais difíceis mas continuam, até 2019, balizadas por um ciclo político e eleitoral que não as fará descarrilar.

O debate em torno dos professores e de outros sectores da função pública vai agudizar-se. Os problemas com os serviços do Estado, com a saúde à cabeça, vão ser cada vez mais visíveis. PCP e Bloco vão, com legitimidade, sublinhar esses pontos e tentar criar uma linha política que os separe progressivamente do governo minoritário do PS. Desde que Mário Centeno assumiu a presidência do Eurogrupo que os parceiros parlamentares ficaram publicamente desagradados com uma política orçamental que defende as regras principais do euro.

Esta progressiva separação dificilmente será consumada com uma não aprovação do Orçamento. Seria um mais que provável suicídio político para quem provocasse o chumbo. Centralizava o PS, sem dúvida, mas trazia de volta o voto útil e em força. E aí o céu não ficaria toldado, ficava escuro.